MSA - Raimanso* | opinião
Parece irrisório o preço que
Austrália tem pago para Timor-Leste sobre os dividendos do Mar de Timor. Não há
forças a medir perante o gigante australiano e as suas multinacionais?! Em
termos contabilísticos e financeiros, segundo os dados fornecidos pela
organização “Lao Hamutuk”, Timor-Leste foi subtraído das suas receitas
petrolíferas desde 1999 até 2014 um prejuízo avultado em mais de 5 mil milhões
de dólares americanos (5x10^9 US$) contabilizado todas as receitas do mar de
Timor desde então que as petrolíferas contraíram de uma forma alegadamente
ilícita, apesar de mais tarde ter restabelecido o acordo contrato 90/10 do Joint
Petrolleum Development Area - JPDA em 20 de maio de 2002, e a assinatura do
acordo de administração e partilha de recursos em Janeiro de 2006 – o
denominado Tratado sobre Certos Ajustes no Mar de Timor (Certain Maritime
Arrangement in the Timor Sea - CMATS).
Nota: não se ficou comprometido
nestes Acordos a delimitação permanente da fronteira marítima entre os dois
países. Contudo na sequência deste último Acordo - CMATS permitiu arrecadar em
forma de receitas para o tesouro de Timor-Leste os 30 mil milhões de dólares
americanos (30x10^9 US$). Não sabemos quanto do lado de lá o lucro das empresas
petrolíferas envolvidas como a Conoco Philips, a Osaka Gas, a Royal Dutch Shell
e a Woodside Petrolleum e, o Governo Australiano. Presume-se fortunas!
Talvez não seja dinheiro perdido
aquela soma de 5 mil milhões de dólares americanos (US$5x10^9). Imagina-se que
seja em troca pela generosidade de programas bilaterais da AusAid inflacionado
pelos seus “head cost” em expertise e burocratas que vem trabalhar em Díli e
que tem sido alegadamente apontados como os olhos e os ouvidos de Canberra, ou
talvez pelos custos associados a outras organizações Australianas e das NGO´s
que se instalaram no território para uma miríade de coisas, uns alegadamente ao
seu serviço para enviar recadinhos de democracia e direitos humanos como se
fossem grandes defensores do nosso povo no passado recente.
Nesta cooperação de assuntos
bilaterais, queremos parcerias em pé de igualdade, isento e transparente, sem
agendas encobertas. Que não nos explorem a fraqueza da ignorância, das
limitadas capacidades humanas, técnicas e logísticas e, sem humilhações como
não tem sido nos últimos tempos a linha editorial de certos politólogos
australianos, manifestando um nada simpático para não dizer hostil contra
Timor-Leste, ridicularizando-nos de “estado falhado”. Óbvio que a ocupação
ilegal do Mar de Timor pela Austrália para a exploração do petróleo, a demanda
de Timor-Leste pela linha mediana para a delimitação da sua fronteira marítima
segundo o Direito Internacional, e as sucessivas recusas da Austrália fizeram
replicar os sinos da indignação em Timor-Leste.
E não só, como deve calcular a
avultada soma de 5 mil milhões de dólares americanos ficou apenas registada
para a memória contabilística dos timorenses, do quanto nos faz falta como povo
e como nação. Parece estar perdido, dada a cláusula em que os negociadores
chegaram o acordo de ontem, dia 6 de março de 2018 para não sermos indemnizados
de quanto a Austrália e as empresas petrolíferas beneficiaram em seu proveito
para os seus recheados cofres.
Não foi feita justiça, não!
Porque é que não temos que ser ressarcidos dos avultados prejuízos financeiros
contabilizados que nos subtraíram das receitas dos poços petrolíferos que jazem
na soberania do mar de Timor-Leste desde então, quid júris?
Qual foi a cedência do “toma lá
dá cá” do poder de negociar com os parceiros Australianos? Ninguém sabe. Mas
calculo o lobby australiano por detrás disso seja forte para ignorar aquele
prejuízo de 5 mil milhões de dólares americanos (US$ 5 x 10^9), sumido na
cláusula “no more onerous” para as empresas petrolíferas naqueles acordos
preliminares JPDA em 2002 e CMATS em 2006. Ao lado disto acredito que nestes
grandes negócios não há vizinhos nem amigos, cada uma “brasa à sua sardinha”
nesta cobiçada indústria petrolífera multimilionária. Não querendo usar o
neologismo daquele palavrão saxónico “burgaining power” pois isto é prato do dia
dos lobbies das empresas petrolíferas australianas com o seu Governo e que são
sonantes do léxico preço e lucro, sabem melhor do que nós o que isto lhes pesa
na balança dos seus interesses quando se pretende faturar dividendos. Sabe-lhes
bem, pois não?!
Ainda não é de todo para muitos
festejos o acordo de 6 de março de 2018, assinado em Nova York realizado na
base da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar –United Nations
Convention on the Law of the Sea - UNCLOS, sob os auspícios da Comissão de
Mediação. Talvez seja para desanuviar um pouco o pesadelo da luta travada e
sorrir com o vizinho para ouvir os cucurabas a chilrear e ver o saltitar dos
cangurus.
E agora, a birra dos não
capitalistas talvez tenha alguma razão, quando veem os poderosos capitalistas
multinacionais assacar o capital dos que menos tem, dos pequenos, neste mundo
desigual. Veio à tona aquela metáfora de tirar um porco para dar um naco de
chouriço. E ironicamente apelidam-nos de país subdesenvolvido e pobretão. Estes
eram alguns dos sintomas de insatisfação de quem viu e ouviu ler o desabafo do
principal negociador timorense nas conferências e na missiva endereçada a
Comissão de Mediação das Nações Unidas. Merece simpatia e apoio. Também não
pretender ganhar cem por cento (100%) neste “toma lá dá cá”. Sem dúvida, há que
equacionar os ganhos estratégicos, assegurar a paz e a estabilidade do país, o
quão fundamental consenso do desígnio nacional, para assegurar a continuidade
das companhias petrolíferas, assegurar a continuação das receitas financeiras
de Bayu Undan, assegurar a viabilidade da “joint venture” como de viável seria
trazer o gasoduto para Timor-Leste, tendo em conta os seus desafios e o
positivo impacto multiplicador económico para o desenvolvimento do País.
O secretismo em torno da
substância destas negociações durante meses com advogados a preço de ouro e
prata, ao soldo do nosso ressequido cofre de duodécimos, e ainda o sigilo dos
termos do acordo resguardado às sete chaves, impediu-nos, o público, conhecer
antecipadamente os contornos deste tão esperado acordo, sobretudo os cidadãos
timorenses poderem reagir. Finalmente sabe-se que o Acordo redundou em novos
acordos de repartição de receitas pendente ao acordo principal, o que não nos
parece ainda final e de bom agoiro para festejar todo o sucesso desejado.
A boa fé da Austrália custou-nos
mais de 200 mil vidas em troco de “oil for blood” dos timorenses durante os 24
anos em que Austrália selou o seu aval a anexação de Timor-Leste pela Indonésia
em 1975. Boa fé?! Se não andassem a espiar-nos e a endossar a conivência do “regime
change” do John Howard em 2006 e a ridicularizar-nos nos seus editoriais. Boa
fé e generosidade como disse a Ministra dos Negócios Estrangeiros tenho
reservas para acreditar. Foi o discurso de momento, diplomático, para
assossegar os ânimos exaltados dos timorenses, os ânimos também solidários do
povo australiano nesta questão e os interesses internacionais contra esta
ocupação ilegal do mar que pertence a Timor-Leste. Para nós resta-nos
determinação e sangue-frio. Se fosse pela boa fé, os Liberais e Nacionalistas
Australianos aquando no poder em 2002 não teriam retirado da jurisdição do Tribunal
Internacional da Justiça (ICJ) de Haia, a Convenção Internacional sobre o
Direito do Mar, logo que Timor-Leste gloriosamente restaurou a sua
Independência. Valeu-lhes muita astúcia.
Acossados pela ameaça das suas
políticas internas, da ameaça dos Trabalhistas (Labour Party) na oposição, por
uma margem mínima de 1 assento no Parlamento, que na voz da Senadora Lisa Singh
da Tasmânia proclamava o reconhecimento da fronteira marítima na linha mediana
no futuro acordo com Timor-Leste quando vier governar, os vários movimentos do
Bom Povo Australiano e Timorenses residentes na Austrália contra a sua ocupação
ilegal no mar de Timor. Descredibilizados do seu papel de líder no Sudoeste
Asiático contra as investidas no mar de China, e a incoerência com ela própria em
relação o acordo do mesmo pendor Jurídico Internacional celebrado com a Nova
Zelândia, Canberra não tinha hipóteses para não se sentar à mesa de negociações
com Díli sob os auspícios da Comissão de Conciliação das Nações Unidas. Foi um
corredor que Timor-Leste sabiamente encontrou para chamar o poderoso vizinho,
aliás no seu melhor adjetivo the giant Australia, à razão para lhe reivindicar
a soberania e os seus direitos subjacentes no mar de Timor.
Estará selado o Acordo de 6 de
março de 2018 entre Timor-Leste e Austrália? Presumo que será devidamente
reapreciado pelos seus respetivos parlamentares antes da acessão para a
ratificação do Acordo e procedimentos protocolares.
O dia 6 de março de 2018,
conseguiu-se definitivamente a delimitação da fronteira marítima permanente
pela linha mediana, equidistante entre Timor-Leste e a Austrália. Uma merecida
conquista e felicitar calorosamente os protagonistas pelo sucesso e que mais
uma vez se reescreve com orgulho a Historia de Timor-Leste. Na mesa, falta a divisão
das receitas petrolíferas condicionadas com as partilhas 70/30 por cento para
Timor-Leste, ou 80/20 por cento para Darwin Austrália. Timor-Leste advoga o tão
desejado plano trazer o gasoduto que jaz na área Greater Sunrise com uma
produção estimada no valor de 50 mil milhões de dólares americanos (US$50x10^9)
para a Costa Sul do País. Duas razões são agora visivelmente plausíveis: a
razão da sua soberania, o poço de Greater Sunrise cem por cento (100%) pertence
a Timor-Leste e a sua proximidade geográfica com a Costa Sul do País.
Contudo em termos pragmáticos
coloca-se grandes desafios, com a falta de recursos humanos capazes para a
gestão industrial e de alta tecnologia, uma logística de envergadura para
megaprojetos no mar, o desafio do tempo necessário para assegurar a construção
das infraestruturas básicas em terra firme (Costa Sul) calculado em tempo record
10 anos, outras infraestruturas associadas, o que transporta para o custo do
capital de investimento na ordem dos 5,6 mil milhões de dólares americanos
(US$5,6x10^9) considerado pela Comissão de Conciliação da ONU com retornos
comerciais exequíveis. O que para Timor-Leste constituem desafios, do outro
lado foi trabalho de casa realizada e instalada em Darwin como pontos fortes do
lobby australiano. Imagina a batalha!
A estimativa dos 5,6 mil milhões
de dólares americanos segundo os peritos da Comissão de Conciliação das Nações
Unidas para aquele investimento de capital é mais ou menos equivalente os
prejuízos que segundo a base de dados da organização “Lao Hamutuk” tem
assinalado pelo desfalque das obrigações das empresas petrolíferas Australianas
tem para com o Estado Timorense. É obvio colocar a questão da indemnização como
foi referido no início para compensar o todo ou em parte o capital de investimento,
apesar dos percalços da cláusula “no more onerous” aludido no contrato JPDA
2002. Resta saber como decorreu a discussão entre os atuais negociadores.
Mas a questão crucial se coloca,
no decurso do período de 10 anos de preparação como hipótese, donde virão as
receitas para Timor-Leste e de quais poços? Será a continuação das receitas
provindas do Bayu Undan e as receitas domésticas? Entretanto o tesouro
arrecadado vai sendo gradualmente subtraído em gastos para o Orçamento Geral do
Estado Timorense (OGET) que ronda os 85% numa projeção total de 1,4 mil milhões
US$ (em 2017) e 2,2 mil milhões US$ (em 2010) anuais. Assim, neste ritmo de
despesas, o remanescente 30 mil milhões de dólares americanos (US$30x10^9) que
se encontra arrecadado no Banco Federal dos EUA não será suficientemente
confortável, capaz de manter naqueles moldes a sustentabilidade do
funcionamento da máquina do Estado findo os 10 anos. O Estado timorense poderá
abeirar-se para uma insolvência iminente. Parece que nem os juros salvaguardam
uma almofada confortável para os gastos anuais seguintes. Carece de
esclarecimento.
Sendo desígnio nacional trazer o
gasoduto para Timor-Leste, para já, urge parcimónia e contenção nas despesas
públicas, visto do lado conservador das coisas, o exercício pelo rigor nas
contas públicas, nos gastos e rendimentos dos bens e serviços para o equilíbrio
do saldo orçamental, exigindo-se muita prudência. Do lado mais arrojado, urge o
consenso nacional na escolha de políticas claras, sobretudo no que respeita o
capital de desenvolvimento injetado nas grandes infraestruturas, investimento
do grande capital e megaprojetos com retornos só a longo prazo, fase onde
poderá estar em causa as necessidades básicas da população sobretudo em bens e
serviços, não descurando dos riscos da inflação, da flutuação do preço do
petróleo no mercado mundial e o fluxo da economia do País. Precisa sangue-frio
nestas decisões cruciais. O que não tem faltado para Timor-Leste é a
determinação de querer vencer os desafios.
De todos os prejuízos
contabilizados, prejuízos financeiros, perdas de vida humanas durante a
ocupação Australiana e Japonesa na Segunda Guerra Mundial em 1942 em que mais
de 75 mil vidas pereceram pela causa dos aliados, o aval de Canberra para a
ocupação brutal Indonésia em 1975 que ceifou mais 200 mil vidas timorenses no
passado; urge hoje o imperativo da paz no país, de paz com os vizinhos, do
bem-estar social dos timorenses e o progresso material na senda dos países
desenvolvidos. O nosso presente e o futuro de novas gerações comprometem-nos e
pesam imenso no prato da balança à prova dos grandes desafios do progresso.
Resta-nos em último reduto
salvaguardar a nossa riqueza que faz parte da construção da nossa dignidade
humana como povo, como nação e como Estado. Mais uma batalha, trazer o gasoduto
para Timor-Leste. Preza-nos não só ter os louros conquistados, mas também a
ousadia para faturar o proveito e os lucros.
MSA – RAIMANSO | Correio eletrónico: raimanso@hotmail.com
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