Redação, 30 dez (Lusa) - Uma
maior interação entre os povos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
(CPLP) e a livre circulação são pretensões que continuam por cumprir, 22 anos
após a constituição daquela organização.
Sobre a mobilidade, o novo secretário
executivo da CPLP, o embaixador português Francisco Ribeiro Telles, que assume
oficialmente funções na terça-feira, prevê avanços "efetivos e
visíveis" na mobilidade interna até 2020.
Estas promessas passam, contudo,
ao lado do cabo-verdiano Luís Graça, motorista de profissão, para quem a CPLP,
cuja presidência rotativa está precisamente nas mãos de Cabo Verde, é uma
"coisa de amigos".
"Enquanto cabo-verdiano
ainda não vi nada", atira, assumindo que pouco conhece da atividade da
organização, que junta atualmente nove países de língua portuguesa.
Ainda na cidade da Praia, Manuel
Honorato, técnico de joalharia, mostra-se mais otimista e acredita que a atual
presidência cabo-verdiana representa um momento de "prestígio".
"Agora, é preciso tirar
partido", disse, defendendo um maior intercâmbio cultural e científico
entre os povos e não apenas a livre circulação.
Já o gestor Manuel Lopes vê a
CPLP como uma comunidade que deveria ter também uma componente política e
económica.
"Acredito que [atual presidência]
poderão conseguir mais e, quem sabe, num futuro próximo, a livre circulação dos
países da CPLP. É sempre um ganho", declarou à Lusa.
Entre as cidades da Praia e de
Luanda os desejos populares sobre o futuro da CPLP -- que junta além de Cabo
Verde e Angola ainda Portugal, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau,
Guiné-Equatorial, Brasil e Timor-Leste - não divergem, apontando ao mesmo:
mobilidade e interação entre os povos.
"Acho que o trabalho que [a
CPLP] desenvolve tem tido, sim, reflexos na comunidade e penso que os países
devem trabalhar mais em prol do crescimento", explica Francisco
Nascimento, técnico de sistemas elétricos em Luanda, otimista com uma possível
mobilidade quase total entre os países da organização.
Já Narciso Mbuta diz que apenas
ouve falar da CPLP nas cimeiras que juntam chefes de Estado, e que quanto a
medidas concretas não se refletem no dia-a-dia. "Precisa mais de
divulgação e que as politicas sejam de facto sentidas na vida dos povos",
conta.
Ainda em Luanda, Miguel Luís,
professor, também se queixa da falta de reflexos da CPLP para a vida do cidadão
comum.
"Sendo uma comunidade a
melhoria deveria ser no nível cultural, académico, sei que ainda há um certo
nível de fronteiras entre culturas desta mesma comunidade que acho que deveria
estar já melhorado e isso, passa por trâmites diplomáticos", lamentou.
Elcidio Macuacua, professor do
secundário na capital moçambicana, entende que há ainda um desconhecimento
sobre a realidade dos países membros da organização, destacando a necessidade
de uma maior cooperação em áreas como a educação.
"Eu estive recentemente no
Brasil e percebi que há pessoas lá que ainda olham para os países [africanos de
língua oficial portuguesa] como uma selva. Não sabem o que realmente é
Moçambique, apesar de termos uma herança em comum", afirmou.
Para o docente, o intercâmbio
entre estes países poderá ser melhorado com a mudança de consciência sobre o
que realmente significa a CPLP para as pessoas.
"Mesmo o tratamento de
vistos deve ser revisto. Não pode ser um processo tão complicado como este.
Falo de algo que eu próprio senti. Só tive o visto para ir ao Brasil no mesmo
dia da viagem, tudo devido a burocracia que ainda existe", concluiu o
professor moçambicano.
Leonel Matusse, jornalista
moçambicano, afirmou à Lusa que do "ponto de vista de discurso político,
há um aparente interesse de melhora a cooperação entre os países membros".
Contudo, "na base", na relação entre as pessoas, "há ainda muito
por fazer".
"Por exemplo, o que os
alunos moçambicanos sabem sobre a história de Cabo Verde? Não temos nada nos
nossos manuais sobre a história destes países e acredito que o problema seja o
mesmo do outro lado", criticou.
Já Albertina Cossa importa
produtos de beleza no Brasil para vender em Maputo. Para esta
comerciante, a CPLP existe "apenas no papel".
"Para quem viaja sempre para
um país membro da comunidade percebe que não há vantagem nenhuma de pertencer à
CPLP. O tratamento que temos é o mesmo e, por vezes, até é pior quando quem te
atende é racista", criticou, assumindo: "Nós falamos da CPLP e, por
vez, exaltamos pontos comuns, mas na realidade somos estranhos uns aos
outros".
Também Mário Alberto, estudante
moçambicano no Brasil, se queixou da burocracia que existe para quem quer
viajar entre dois Estados da CPLP.
"Eu estudo no Brasil há dois
anos e ainda assim sinto pelo processo burocrático que temos de passar. O
principal problema está no tratamento de vistos. O processo é extremamente
lento e sempre muito burocrático", desabafou.
Também para os cidadãos da
Guiné-Bissau, obter visto para viajar para outros países da CPLP é tarefa
difícil e com muitas burocracias.
"Notam-se muitas
dificuldades, sobretudo para os jovens que querem estudar, fazer formação
superior (...) Há burocracias e falta esta parte entre os Estados",
afirmou à Lusa o guineense Edgar Carlos Pires.
Já Magnum Malam vai mais longe e
disse que os guineenses, como cidadãos da CPLP, devem ter o "mesmo
tratamento que em outros lados".
"Para alcançar o visto para
países de língua portuguesa é muito difícil mesmo", lamentou, por sua vez,
Adalgisa Cabral.
A maior parte dos guineenses
procuram vistos para entrar em Portugal e muitos consideram que pode ser
"uma história".
"Para Portugal é difícil,
para o Brasil é mais fácil. Para meter documentos na embaixada de Portugal há
um transtorno", afirmou Abubacar Bari.
PVJ/SMM/RYPE/DYAS/EYAC/MSE // VM || Lusa
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