Díli, 04 mar (Lusa) - O tratado
de fronteiras marítimas que Timor-Leste e a Austrália assinam na terça-feira em
Nova Iorque resulta de um teste aos instrumentos da Lei do Mar e em concreto ao
Procedimento de Conciliação Obrigatória (PCO).
Onze intensas rondas negociais ao
longo de 19 meses para alcançar um acordo que os mais otimistas pensavam que
demoraria anos e que os mais pessimistas achavam impossível.
As negociações, com o apoio de um
painel de cinco especialistas internacionais e a assistência do Tribunal
Permanente de Arbitragem, decorreram no âmbito da Convenção das Nações Unidas
sobre a Lei do Mar (conhecida pela sigla UNCLOS).
O processo começou a 11 de abril
de 2016 quando Timor-Leste notificou a Austrália - o documento foi entregue
pelo embaixador timorense em Camberra Abel Guterres - ter desencadeado o PCO
para obrigar Camberra a sentar-se à mesa das negociações para definir as
fronteiras marítimas permanentes entre os dois países.
"Estabelecer fronteiras
marítimas permanentes é uma questão de prioridade nacional para Timor-Leste
sendo o último passo para o alcance da nossa soberania como Estado
independente", disse na altura o primeiro-ministro timorense, Rui Maria de
Araújo.
"Ao abrigo do direito
internacional a Austrália é obrigada a negociar fronteiras marítimas
permanentes com Timor-Leste mas recusou-se a fazê-lo apesar de todos os nossos
convites. Isto deixou-nos apenas uma opção", disse.
Um dia depois, o ministro dos
Recursos australiano, Josh Frydenberg, reiterava que a Austrália não tencionava
retomar negociações com Timor-Leste para definir as fronteiras marítimas entre
os dois países, por considerar "que o balanço atual" era "o
correto".
E Camberra esperou até ao último
dia do prazo, 02 de maio, para nomear os seus dois mediadores para se juntarem
a dois nomeados por Timor-Leste. Os quatro escolheram um quinto, o presidente
da comissão.
Só a 25 de junho de 2016 é
constituída a comissão, presidida pelo diplomata dinamarquês Peter
Taksoe-Jensen. Com ele trabalharam no processo os dois representantes
escolhidos por Timor-Leste, o alemão Rudiger Wolfrum, professor de direito
internacional da Universidade de Heildeberg e juiz desde 1996 do Tribunal
Internacional para a Lei do Mar (ao qual presidiu entre 2005 e 2008), e Abdul Koroma,
da Serra Leoa, juiz no Tribunal Penal Internacional entre 1994 e 2012.
A Austrália, por seu lado, nomeou
a australiana Rosalie P. Balkin, ex-secretária-geral adjunta na Organização
Marítima Internacional e professora universitária na Austrália, África do Sul e
Reino Unido, e Donald Malcolm McRae, jurista canadiano especialista em oceanos
e direito internacional.
A primeira reunião processual
decorre a 28 de julho no Palácio da Paz em Haia. Depois começaram as reuniões
com as partes, a três e, numa fase posterior, envolvendo as petrolíferas da
'joint venture' do Greater Sunrise.
No meio do processo, a 09 de
janeiro de 2017, Timor-Leste, a Austrália e a Comissão emitem uma declaração
conjunta em que confirmam a decisão de suspender o Tratado sobre Determinados
Ajustes Marítimos no Mar de Timor (CMATS) que vigorava até então.
O histórico "Acordo de
Pacote Abrangente sobre os elementos centrais de uma delimitação de fronteiras
marítimas entre os dois países no Mar de Timor" é alcançado em Copenhaga a
30 de agosto, dia em que se cumpriam exatamente 18 anos do referendo em que os
timorenses votaram pela independência.
Além das fronteiras, o acordo
estabelece o estatuto jurídico do campo de gás de Greater Sunrise, o
estabelecimento de um Regime Especial para o campo, um caminho para o
desenvolvimento do recurso e a partilha da receita resultante.
Na altura, o líder da delegação
timorense, Xanana Gusmão, e os restantes membros são recebidos em festa em
Timor-Leste - onde está ainda por ser formado o VII Governo saído das eleições
de 22 de julho - com cartazes a agradecer à Austrália e à sua chefe da
diplomacia, Julie Bishop.
O "texto integral de um
projeto de tratado" foi alcançado a 13 de outubro em Haia. A última
reunião decorreu em fevereiro em Kuala Lumpur. Falta agora a assinatura e a
ratificação pelos dois parlamentos.
ASP // VM
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