terça-feira, 8 de janeiro de 2019

ONG timorense defende "avaliação imediata" a projeto das escolas de referência

Díli, 07 jan (Lusa) - A organização não-governamental timorense La'o Hamutuk quer uma "avaliação imediata e independente" do projeto dos Centros de Aprendizagem e Formação Escolar (CAFE), que envolve cerca de 130 professores portugueses em 13 escolas de Timor-Leste.

"O plano de continuação do projeto CAFE necessita de ser definido com base numa análise dos atuais custos e benefícios do projeto, sob o ponto de vista económico, social e educativo. É necessário um estudo crítico e honesto da real efetividade do modelo de ensino das línguas", defende a organização num texto de análise enviado à Lusa.

A avaliação, considera a organização, é oportuna já que o acordo bilateral entre Portugal e Timor-Leste que estabeleceu os CAFE nos últimos quatro anos termina no final deste ano, tendo que ser acordado em que moldes continuará.

"Ao mesmo tempo que advogamos pelo aumento do Orçamento de Estado para o setor da Educação, também exigimos que os projetos de educação, financiados pelo dinheiro do Estado, assentem em evidências e que assegurem que todos os alunos timorenses tenham acesso a uma educação de qualidade", disse.

Recordando os antecedentes do projeto, o maior da cooperação bilateral entre Portugal e Timor-Leste, a organização considera que a avaliação deve responder a várias questões para determinar a viabilidade do projeto.

Perceber se o projeto está a atingir os objetivos básicos, se "este modelo de ensino das línguas corresponde às melhores práticas a serem implementadas em Timor-Leste", se os alunos estão a ter melhores resultados, se os CAFÉ são equitativos ou se os professores timorenses a ser fortalecidos e capacitados, são algumas das questões a analisar, defende.

No conjunto de recomendações sobre o projeto, a ONG considera essencial garantir "que todos os professores não-timorenses estão a passar as suas habilidades para garantir uma sustentabilidade do projeto a longo prazo".

Defende a implementação imediata de "um sistema de seleção justo e transparente para a matrícula em todas as Escolas CAFE", com informação clara aos pais, "incluindo sobre os períodos de inscrição, processo de seleção e sobre o facto de serem escolas gratuitas e abertas a todos os Timorenses", procurando "incluir famílias pobres e de áreas rurais".

"Dados os benefícios reais e aparentes do projeto, não é surpreendente que existam mais famílias a querer inscrever os seus filhos nas Escolas CAFE do que as vagas efetivamente existentes", nota a organização.

Entre os aspetos debatidos a ONG nota que os CAFE são vistos como "escolas de elite, com base na ideia colonialista de que tudo o que vem de Portugal é intrinsecamente melhor do que aquilo que seja timorense, quer sejam recursos, quer sejam os conhecimentos locais".

"A isto acrescenta-se o facto de que estas escolas recebem e usam muitos mais recursos do Estado Timorense, quando comparadas com as restantes escolas públicas", refere.

"Apesar de, oficialmente e por regra, os alunos serem admitidos por ordem, de acordo com a data da inscrição, existem muitas histórias sobre pais em posições de poder que conseguem que os seus filhos sejam admitidos nestas escolas", acrescentou.

A organização cita um relatório da coordenadora timorense do projeto, Antonieta de Sousa de Jesus, que nota "os constrangimentos e os desafios", tanto gerais ao sistema educativo nacional como específicos ao projeto.

Um calendário para o recrutamento dos professores portugueses que não é compatível com o calendário escolar Timorense - levando a grandes atrasos na chegada dos docentes - pagamento tardio dos suplementos e dos subsídios aos professores e funcionários, dificuldades de recrutamento de professores estagiários timorenses e em responder à elevada procura das famílias, são algumas das dificuldades apontadas.

A organização nota que o projeto gasta cerca de quatro a cinco milhões por ano do orçamento do Ministério da Educação, estimando que nas escolas CAFE o Estado gasta por aluno três vezes mais do que nas restantes escolas públicas.

Globalmente a La'o Hamutuk defende mais recursos para apoiar as escolas públicas, sendo necessário "um aumento substancial do orçamento para a educação" para "proporcionar um apoio a todas as escolas públicas igual" ao dado aos CAFE.

Recorde-se que, atualmente, funcionam em Timor-Leste 13 escolas CAFE, uma por cada uma das 12 capitais de município mais a capital da Região Administrativa Especial de Oecusse-Ambeno (RAEOA).

As escolas, que contam com cerca de 7.000 alunos, ou 3% dos alunos de todas as escolas públicas do país, seguem o currículo nacional e usam o português como língua de instrução em todos os níveis de escolaridade.

As restantes pré-escolas e escolas do ensino básico usam, atualmente, o tétum como primeira língua para ensinar a ler e escrever e também como principal língua de instrução nos primeiros anos, aumentando gradualmente, até ao 6.º ano, o tempo de instrução em língua portuguesa, sendo a principal língua de instrução neste nível.

O projeto nasceu para "proporcionar uma educação pública de qualidade, com uso da língua portuguesa para o ensino de todas as disciplinas", para dar "formação em língua portuguesa aos universitários recém-graduados e aos novos professores" e formar e reforçar as capacidades de professores e administrados das escolas públicas locais.

O projeto integra cerca de 130 professores portugueses e cerca de 110 professores e 62 professores estagiários timorenses.

Anualmente é adicionada uma nova turma ao nível de escolaridade seguinte e este ano os CAFE terão, pela primeira vez, turmas do ensino secundário.

ASP // FST

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