quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Erros processuais podem condicionar caso de ex-ministra timorense Emília Pires - parecer


Díli, 29 set (Lusa) - Um parecer jurídico pedido pelo Governo timorense considera que "vicissitudes processuais" na fase de instrução do processo contra a ex-ministra das Finanças que começa a ser julgada na próxima semana podem ter um "reflexo negativo" na sua defesa.

O parecer, a que a agência Lusa teve hoje acesso, foi solicitado pelo Executivo timorense depois de Emília Pires ter exercido, em março, o seu direito de petição, denunciando o Governo de Timor-Leste e outras entidades pelo que considera "diversos erros e ilegalidades relativos ao processo-crime" em que é arguida.

Referindo várias irregularidades, o parecer concorda com a posição de Emília Pires, levantando dúvidas sobre alguns aspetos processuais e até sobre a forma como as medidas de coação foram aplicadas.

"Relativamente à arguida Emília Pires afigura-se difícil o preenchimento de qualquer um dos tipos legais de crime que lhe são imputados, sobretudo porque (...) não existem evidências (nos autos) de que tenha praticado atos relevantes no âmbito dos procedimentos em questão", lê-se no texto.

Emília Pires começa a ser julgada na próxima segunda-feira, em Díli, acusada da prática de crimes de participação económica em negócio e administração danosa quando ainda era ministra.

Pires e a ex-vice-ministra da Saúde Madalena Hanjam são arguidas por alegadas irregularidades na compra de centenas de camas hospitalares em contratos adjudicados à empresa do marido da ex-ministra das Finanças, com um suposto conluio entre os três para o negócio, no valor de 800 mil dólares.

O julgamento foi adiado a 23 de março depois da apresentação pela defesa de Emília Pires de vários recursos por alegadas irregularidades, entretanto indeferidos.

No texto em que exerceu o direito de petição, Emília Pires considera a acusação de que é alvo "totalmente infundada", afirmando que desde o início do processo têm ocorrido "violações sistemáticas e graves" dos seus direitos enquanto arguida e "decisões arbitrárias e incompreensíveis" da justiça.

"Trata-se de um exemplo de tudo o que não pode nem deve acontecer num Estado de Direito", sublinha, detalhando o que diz serem os erros processuais e outros centrais à sua acusação pela procuradoria timorense.

O Governo solicitou, em resposta, um parecer independente a uma sociedade de advogados de Timor-Leste (a Da Silva, Teixeira & Associados), a quem pediu uma análise de todo o processo.

Nesse documento, de 121 páginas, os advogados consideram que, no que toca à compra das camas, Emília Pires se limitou "a receber a justificação de fonte única de fornecedor proveniente do PM e, por outro lado, a remetê-la, por ser o competente para o efeito, ao Ministério da Saúde, sem que (...) essa intervenção possa ser entendida como aprovação da referida justificação".

Nos dois contratos, sublinha o parecer, o recurso à Reserva de Contingência Orçamental "foi sempre aprovado pelo primeiro-ministro" pelo que "as decisões finais não foram tomadas pelas arguidas, mas sim por uma terceira pessoa: o PM".

"Dos elementos que constam dos autos, do nosso ponto de vista, e contrariamente à tese sustentada pelo Ministério Público, não parece existir, no caso, impedimento nem qualquer conflito de interesses. E não parece existir, desde logo, porque não vislumbramos na lei nenhum impedimento de participação em processos desta natureza", refere ainda.

Mas mesmo que esses impedimentos existissem, prossegue o texto, a acusação não teria qualquer validade porque a intervenção da arguida "resumiu-se (apenas) ao procedimento relativo ao recurso à Reserva de Contingência, não tendo qualquer intervenção a jusante, mormente, na escolha do procedimento pré-contratual ou até mesmo na escolha do fornecedor".

Motivo que leva os advogados a concluir que "perante a ausência de factos aptos a preencher o elemento volitivo do dolo relativamente ao crime de participação económica em negócio pela arguida Emília Pires" os tribunais deveriam ter declarado a "nulidade parcial" da acusação.

ASP

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