...para resistir a desastres climáticos
População timorense ilustra como implementar sistemas mais eficazes associando novos dados e tecnologias ao conhecimento local; ONU News acompanhou o resultado de treinamentos que preparam moradores de áreas remotas a terem mais resiliência frente a um futuro de eventos extremos mais frequentes.
ONU News | # Traduzido em português do Brasil
Durante a 29ª Cúpula do Clima da ONU, COP29, algumas injustiças climáticas foram colocadas em evidência, como o fato de os países mais vulneráveis a desastres naturais serem aqueles com menos preparação para se proteger deles.
Em discurso na primeira semana do evento, o secretário-geral da ONU, António Guterres, enfatizou que países menos desenvolvidos e nações insulares dispõem de menos de 10% dos dados que necessitam para sistemas de alerta eficazes.
A experiência e dedicação de sobreviventes
Com o apoio do Programa da ONU para o Meio Ambiente, Pnuma, Timor-Leste está caminhando para superar essa lacuna, estabelecendo um sistema robusto e multirrisco capaz de beneficiar diretamente 80% da população.
Mas dados e tecnologias são apenas uma parte da solução. A outra depende do nível de conhecimento das pessoas sobre o que fazer quando os equipamentos soarem o alarme avisando a respeito de um evento climático extremo.
Por isso, o projeto aposta em um recurso essencial para salvar vidas durante emergências: a experiência e a dedicação de sobreviventes de tragédias passadas, como as inundações repentinas que assolaram Timor-Leste em 2021.
As piores chuvas em 50 anos mataram mais de 30 pessoas e destruíram cerca de 4 mil casas. Muitas delas no município de Orlalan, uma região montanhosa onde vivem 5.872 pessoas, espalhadas em oito subvilas.
Simulando um desastre
Os moradores, que na época não sabiam como melhor se proteger de alagamentos e deslizamentos de terra, hoje se sentem mais preparados para um futuro que tende a ser marcado pelo caos climático.
A líder comunitária Armandina Valentina disse que faz um trabalho constante de informar os moradores, batendo de porta em porta, falando sobre os locais seguros para onde devem ir em caso de desastre. Ela ressaltou que “mulheres grávidas e crianças devem receber atenção especial para que não entrem em pânico”.
A ONU News acompanhou uma das simulações que ajudam os habitantes da remota vila timorense a saberem o que fazer em caso de eventos extremos. As crianças são as mais animadas durante o exercício, no qual elas aprendem a ficar juntas em um local visível, protegendo a cabeça e gritando por ajuda.
Algumas delas simulam estar feridas e recebem primeiros socorros, outras seguem as equipes de resgate até o local designado como seguro.
Os primeiros a responder
Em cada subvila, existem pessoas que se oferecem como voluntárias e passam então a fazer parte da rede da Cruz Vermelha de Timor-Leste, Cvtl. A organização é parceira do Programa da ONU para o Meio Ambiente, Pnuma, e responsável por preparar seis municípios no país.
A jovem voluntária Fretiliana Alves explicou que “sua principal motivação é salvar a vida das pessoas” e disse que encoraja outros jovens a seguirem seu exemplo. Ela revelou que a parte que mais gosta da simulação é quando faz o resgate e oferece cuidados de saúde aos moradores que precisam de ajuda.
A coordenadora de Redução de Risco de Desastres do Cvtl, Emidia Belo, enfatizou que os voluntários são fundamentais, pois conhecem os riscos das áreas onde vivem. Durante uma tragédia, eles serão os primeiros a responder, juntamente com os líderes comunitários, pois muitas vezes o acesso às comunidades fica bloqueado.
Treinamento inclusivo
O treinamento também envolve pessoas com necessidades especiais, como Antonio Ornai, deficiente visual, que estava participando da simulação de deslizamento de terra pela primeira vez.
Ele revelou estar muito feliz de ser incluído e disse que vai aplicar tudo que aprendeu. Ornai também encorajou outras pessoas com deficiencia a “serem ativas e buscarem informações sobre como se manterem seguras em desastres”.
Emidia Belo ressalta que o treinamento envolve pessoas com deficiência, crianças, mulheres grávidas, idosos, justamente porque eles são as mais vulneráveis durante a situação de desastre.
Para ela, “mudar a mentalidade da comunidade para estar preparada para o desastre”, não é algo que dá pra fazer em um ou dois anos, e sim num prazo mais longo. Nesse sentido, ela elogiou o fato do apoio do Pnuma durar cinco anos.
O passo a passo da evacuação
A simulação tem cinco etapas. Primeiro chega um alerta das autoridades nacionais informando sobre o risco de fortes chuvas. Em seguida, os líderes líderes das comunidades locais se reúnem para analisar rotas de fuga e locais de refúgio.
A informação é então transmitida por equipamentos de som, alimentados por energia solar e espalhados por áreas remotas, e por voluntários que utilizam megafones para avisar os moradores. No momento da evacuação, entram em ação as equipes de resgate da defesa civil e os voluntários treinados em primeiros socorros.
Todas as pessoas são conduzidas para um local seguro, a começar pelas mais vulneráveis. Por fim, o governo entrega itens essenciais nos locais de abrigo.
Segundo Adriano Soares, chefe da subvila Torilalan, “uma das coisas mais difíceis no processo de evacuação é manter comida suficiente durante o desastre, pois os campos, plantações e colheitas são danificados, esgotando todos os recursos da comunidade”.
Reforço tecnológico
O representante da administração da Vila Orlalan, José Alves, ressaltou a importância dos equipamentos instalados e entregues por meio do projeto do Pnuma, que são usados para “partilhar e disseminar as mensagens de alerta precoce para a comunidade”.
Mas para que os avisos possam ser feitos com eficiencia e antecipação, o país também precisa melhorar a coleta e análise de dados. Nesse sentido, o Pnuma está apoiando a instalação de nove Estações Automáticas de Clima, dois sistemas Automatizados de Observação Meteorológica, uma estação manual, três radares e uma bóia marinha.
O diretor do Departamento Nacional de Meteorologia e Geofísica, Dnmg, Terêncio Fernandes, explicou que essas tecnologias vão fazer com que o país avance do nível um para o nível três em observação do clima, podendo chegar ao cinco. Essa etapa envolverá medições a partir da atmosfera, com apoio adicional do Mecanismo de Financiamento de Observações Sistemáticas, Soff.
As Estações Automáticas representam um grande avanço, pois são de baixo custo e operam em uma frequência que permite a transmissão de dados mesmo sem internet, o que é ideal para zonas remotas como a vila Orlalan.
Elas medem chuva, temperatura, pressão velocidade do vento e radiação solar e coletam dados a cada um minuto. Esses dados chegam a um aparelho com internet que os transmite para o Dnmg, onde é feito o monitoramento e a análise.
Resultado de uma decisão tomada
O sistema que está sendo estabelecido em Timor-Leste, irá gerar informações em quatro plataformas: risco de desastres, ameaças de saúde, impactos na agricultura e ambiente marinho.
Com apoio da comunidade internacional, esse que é um dos países mais vulneráveis do mundo às mudanças do clima, está conseguindo criar condições para proteger sua população, mesmo nas áreas mais remotas.
Toda essa expertise acumulada pela comunidade é resultado de uma decisão tomada na COP16, quando foi criado o Fundo Verde do Clima, um mecanismo financeiro que apoia projetos voltados para mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Isso reforça a necessidade de mais financiamento para sustentar esse trabalho e replicá-lo em outras nações sob risco, por meio de decisões na COP29 e futuras negociações climáticas.
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