quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Ex-ministra das Finanças timorense está a ser "julgada na imprensa" - ministro


Díli, 06 dez (Lusa) -- O ministro timorense Dionísio Babo considera que a ex-ministra das Finanças Emília Pires está a ser alvo de um "julgamento na imprensa", com notícias que "manipulam" e intoxicam o debate e ignoram os seus direitos fundamentais.

Dionísio Babo, ministro de Estado, Coordenador dos Assuntos da Administração do Estado e da Justiça, reagia assim em declarações à Lusa às inúmeras notícias publicadas nas últimas semanas na imprensa e nas redes sociais timorenses, em torno ao julgamento das ex-ministras Emília Pires e Madalena Hanjam.

"Estamos a ser manipulados pelas notícias nos media que intoxicam toda a gente, como se as pessoas já tivessem sido julgadas e condenadas, com decisões transitadas em julgado", afirmou em declarações à Lusa.

"Está a decorrer um julgamento pela imprensa em Timor, o que não é saudável. Apelo a todos para que cooperem com a justiça. Temos que respeitar o direito de escolha que é um direito fundamental, de alguém que se sente mais seguro em recorrer a outros tribunais", frisou.

A polémica em torno ao caso de Emília Pires subiu de tom depois de, no passado dia 19 de novembro, a Lusa ter noticiado que a ex-ministra solicitou a delegação do seu processo para Portugal, alegando falta de capacidade ou vontade de assegurar justiça por parte do sistema judicial timorense.

"Acho que sim, que é um linchamento da Emília Pires. Não é só da media mas de comentários de muita gente que não conhecem profundamente o tema, o assunto e a lei. E isso prejudica a situação dessa ex-ministra. As coisas devem ser tratadas mais dignamente do que estão a ser", disse Babo.

Emília Pires é acusada, com a ex-vice-ministra da Saúde Madalena Hanjam, de participação económica em negócio e administração danosa por supostas irregularidades na compra de centenas de camas hospitalares em contratos adjudicados à empresa do marido da primeira, com um suposto conluio entre os três para a concretização do negócio, no valor de 800 mil dólares.

O seu julgamento ficou visto para sentença na semana passada - a decisão deve ser lida a 20 de dezembro - com a reta final a ficar marcada por grande polémica relacionada com a ausência do país de Emília Pires, que tinha sido autorizada pelo Tribunal a viajar em representação do Estado timorense.

Estava no estrangeiro quando, segundo a defesa, um acidente agravou uma lesão antiga obrigando a intervenção cirúrgica, o que impediu o seu regresso a Timor-Leste no prazo previsto. Foi operada a 05 de novembro na Austrália e está em Portugal para tratamentos médicos adicionais.

A sua ausência na data prevista levou o Tribunal Distrital de Díli a emitir um mandado de captura e a alterar a medida de coação para prisão preventiva, ordenando a detenção de Emília Pires no momento em que esta se apresente numa fronteira timorense.

Desde aí a imprensa tem estado dominada por críticas de vários quadrantes políticos e de representantes da sociedade civil timorense à ação de Emília Pires, com insultos a multiplicarem-se nas redes sociais e debates sobre o facto de a ex-governante recorrer à sua segunda nacionalidade, a portuguesa.

As críticas acabaram por visar também vários membros do atual executivo com pedidos de demissão e de investigação do primeiro-ministro, Rui Araújo, do ministro do Planeamento Estratégico, Xanana Gusmão e da ministra das Finanças, Santina Cardoso por terem nomeado Emília Pires para representar o Estado.

"Uma coisa é um representante do Governo que foi autorizado pelo Tribunal de Díli a representar o Estado fora do país. Outra é a questão pessoal, uma questão individual, e de responsabilidade individual e não do executivo", disse.

"A decisão de ficar fora não é política é pessoal. Estamos perante um direito pessoal, de escolha. Há acordos e legislação que permitem a transferência de julgamentos entre países, e especialmente em caso da pessoa ser cidadã desse país", afirmou.

Para Babo é um "direito fundamental" uma pessoa "poder escolher onde se sente mais seguro ser julgado" mas deve cooperar com a justiça, notificando que opção deve tomar.

O pedido de "transmissão de processo penal" está definido na lei timorense 15/2011, sobre Cooperação Judiciária Internacional Penal, que prevê que processos-crime instaurados em Timor-Leste "podem ser delegadas num Estado estrangeiro que as aceite".

Entre as condições exigidas para que isso está o tempo de pena máximo possível ou que o arguido tenha a nacionalidade do Estado estrangeiro.

Em março de 2015, ainda antes do arranque do julgamento - que começou em outubro do ano passado - Emília Pires exerceu o seu direito de petição dando conta às autoridades de Timor-Leste de "violações sistemáticas e graves" dos seus direitos e de "decisões arbitrárias e incompreensíveis" no processo.

Nesse direito de petição, a que a Lusa teve acesso na altura, Emília Pires manifestava receio que a "patente incapacidade ou falta de vontade do sistema judicial" impedissem um processo justo e equilibrado, com a politização do caso a "fazer temer que seja crucificada" como "forma simbólica de afirmação do poder dos tribunais". Acusou ainda a comunicação social de violações do segredo de justiça e de não fazer uma cobertura objetiva dos processos.

Também em março do ano passado, numa entrevista à Lusa, Emília Pires disse que os tribunais a queriam usar como "vingança" contra o Governo e que a tinham informado de que seria condenada a 10 anos de prisão.

Nas alegações finais, a 20 de setembro último, o Ministério Público deu tudo como provado e pediu uma pena de prisão de dez anos para Emília Pires e Madalena Hanjam.

ASP // PJA

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