segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Tribunal de Recurso confirma, duas vezes, anulação de sanção a procuradores timorenses

Díli, 22 Jan (Lusa) - O Tribunal de Recurso timorense voltou a declarar nula uma decisão do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) de condenar disciplinarmente sete procuradores que questionaram a liderança do procurador-geral e de outros responsáveis do Ministério Público.

Os sete procuradores, que transmitiram esta posição numa carta dirigida aos líderes do país, tinham sido condenados em outubro a seis meses de suspensão de atividade, sem vencimento, mas recorreram da decisão para o Tribunal de Recurso, que a 12 de dezembro decidiu a favor do recurso dos magistrados.

Depois de notificado, o CSMP fez um "recurso extraordinário" de novo para o Tribunal de Recurso - a única instância judicial superior em Timor-Leste - que, num acórdão a que a Lusa teve acesso, confirmou a sua decisão inicial de anular o processo disciplinar.

A condenação disciplinar inicial do CSMP abrangeu sete de um grupo de 18 procuradores que em abril do ano passado escreveram ao Presidente da República, ao Parlamento e ao primeiro-ministro a questionar a liderança do Ministério Público (MP).

Os subscritores diziam haver "motivos de grande preocupação" sobre o funcionamento do MP, que consideravam funcionar num sistema de "familiarismo, nepotismo e divisionismo", sem justiça nas promoções na carreira.

Esse documento apontava alegadas irregularidades, abusos de direitos, além de criticar diretamente um dos assessores estrangeiros do MP, que acusava de "atitudes imorais". Também argumentava que a liderança do MP gere a instituição "como se fosse a sua companhia privada".

O texto acabou por servir como base para uma resolução do Parlamento Nacional, aprovada em maio, em que os deputados pediam a exoneração imediata do procurador-geral, José da Costa Ximenes, "por não reunir condições objetivas para a nomeação do cargo", considerando que o seu primeiro mandato se caracterizava "pela prática de inconstitucionalidades e ilegalidades graves".

Na sequência da carta e da resolução, o CSMP, numa deliberação assinada pelo próprio procurador-geral, mandou "instaurar procedimento disciplinar" aos procuradores, considerando o seu comportamento "suscetível de constituir ilícito disciplinar".

"Tal tipo de comportamento não pode ser encorajado, sob pena de promover a indisciplina e o incumprimento dos deveres a questão adstritos os magistrados" do MP, refere a deliberação.

Em julho, os procuradores apresentaram um recurso contencioso pedindo a nulidade, revogação ou anulação da deliberação, considerando que "padece de um vício insanável" porque "ofende o direito de petição" dos procuradores. Contestam também estar assinada pelo próprio procurador-geral que, porque o caso lhe dizia diretamente respeito, se deveria ter autoexcluído das reuniões do CSMP sobre o caso.

O CSMP acabou por deduzir acusação, a que a Lusa também teve acesso, que dizia que os subscritores da carta "transmitiram falsamente a imagem de um Ministério Público desorganizado, destituído das suas funções".

"Os arguidos tinham plena consciência de estarem a colocar os interesses pessoais acima do interesse da nação e do Ministério Público e a prejudicar a boa organização e o bom funcionamento deste último, provocando instabilidade, desunião e perda de confiança nesta instituição, bem como a sua desorganização interna e externa", refere.

A carta em questão, de 27 de abril, é subscrita por 18 procuradores (mais de metade do total em ativo em Timor-Leste, atualmente 30), ainda que só tenha as assinaturas de sete deles: Domingos Barreto, Renato Bere Nahak, Antonio Tavares da Silva, José Elo, Gustavo Moreira da Silva, Bartolomeu de Araújo e Osório de Deus.

A condenação pelo CSMP, a que Lusa teve acesso, considera que a carta "comporta acusações, expressões, afirmações e insinuações falsas de extrema gravidade, que traduzem falta de respeito devido" ao procurador-geral da República, José da Costa Ximenes, à adjunta do procurador-geral, Zélia Trindade, à procuradora de Díli Angelina Saldanha e à instituição.

"Com tais acusações falsas, imputações e expressões de caráter injurioso, os arguidos beliscaram a honra, o bom nome e a reputação desses dirigentes do Ministério Público", refere a decisão que aplica aos procuradores a "pena de inatividade".

A carta dos procuradores surgiu num momento de crise institucional entre o Parlamento Nacional e o então Presidente da República, Taur Matan Ruak, na sequência das decisões do chefe de Estado sobre a nomeação do novo presidente do Tribunal de Recurso e a renovação do mandato do procurador-geral timorenses.

ASP. // JH.

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