Macau,
China, 10 jul (Lusa) -- O agudizar da crise tem levado muitos macaenses a
deixar Portugal e a voltar a casa, onde dizem ser mais fácil progredir na
carreira e ter uma vida confortável, fatores que se aliam às saudades da cidade
onde nasceram.
"Sempre
quis regressar, sou um filho da terra, tinha esse bichinho", explica
António Teixeira, 34 anos, informático.
A
sua é uma história comum: deixou Macau em 1999, ano da transferência da
administração do território para a China, e ingressou na universidade em
Portugal, para onde muitas famílias macaenses se mudaram por receio do futuro.
Começou
a trabalhar em 2007, mas "o mercado de trabalho" levou-o a Espanha em
2012. Uma oferta de emprego vinda de Macau chegou em 2013. "Em Espanha
tinha condições bastante melhores [do que em Portugal] mas para sair, preferia
ir para casa, para Macau", recorda à Lusa.
Além
de uma maior estabilidade financeira, na cidade natal encontrou também outras
facilidades: "Macau permite ter uma vida pós-laboral, que não seja só
casa-trabalho de segunda a sexta, [em Portugal] perde-se muito tempo em
deslocações".
Como
visitava Macau com regularidade, o "choque" de voltar a viver numa
cidade que aumentou de população em cerca de 50% foi "gradual".
"Há muito mais população, confusão, os preços das casas são uma grande
preocupação. Mas ainda existe muito do que existia, ainda há a Macau
antiga", diz.
Henrique
Siqueira, de 30 anos, tem uma história semelhante. Deixou Macau em 1995, aos
oito anos, com a família a recear as consequências da transferência de
administração.
Os
macaenses têm, regra geral, Bilhete de Identidade de Residente em Macau, que os
liberta de autorizações de permanência ou trabalho, falam as duas línguas
oficiais, português e chinês, e têm família na cidade.
Estes
fatores estiveram sempre no horizonte do especialista em análises clínicas e
foram decisivos quando percebeu que "as perspetivas profissionais não eram
boas" em Portugal.
"Tinha
emprego, mas sou uma pessoa ambiciosa e queria mais da minha vida. Desde que
comecei a trabalhar (2009), senti que era altura de sair. Ainda fiquei seis
anos, mas progressão na carreira era coisa para pôr de parte", justifica.
Ao
regressar a Macau, em 2015, Henrique Siqueira apercebeu-se de que não era o
único a voltar: "O pessoal está a regressar, as pessoas não se sentem bem
em Portugal, não há trabalho, não há futuro".
Apesar
de satisfeito com a mudança, lamenta ter tido de deixar Portimão para trás.
"Vivia no paraíso e não sabia", comenta.
O
regresso não se faz apenas na juventude. Jorge Sales Marques esperou até aos 55
anos para voltar a Macau, em 2015, onde agora é presidente da Associação de
Médicos de Língua Portuguesa.
"Voltei
16 anos depois porque senti que era a altura certa, os meus filhos estão
crescidos, a minha mulher também gosta de Macau, senti que era tempo de ajudar
mais a família. Além disso, já tinha sido abordado para voltar a trabalhar para
os Serviços de Saúde. Tinha todos os ingredientes", conta.
A
situação profissional em Portugal era boa, mas "a partir de certa altura
uma pessoa cansa-se, trabalha-se imenso, era um desgaste enorme andar sempre de
um lado para o outro".
O
pediatra gostava até de ver os filhos seguirem-lhe as pisadas "porque
todos sabem que a situação para os jovens é muito má, o emprego é precário, mal
pago e as finanças ficam com metade".
A
Macau que deixou há década e meia é hoje muito diferente, mas Jorge Sales
Marques continua a sentir-se confortável: "Apesar de ter praticamente
duplicado desde que nasci, quando tinha 16 quilómetros quadrados [hoje tem 30],
é pequeno, é fácil, acolhedor, tem boa comida e cultura".
O
regresso dos 'filhos da terra' -- uma tendência que se verifica desde o 'boom'
dos casinos -- é confirmado por Miguel Senna Fernandes, presidente da
Associação dos Macaenses.
"Nos
últimos três anos tem sido assim, não é um retorno massivo, mas como as
condições em Portugal não são as melhores, quando as pessoas podem, regressam a
casa", explica.
Os
jovens, diz, "têm mais propensão para a aventura", mas Senna
Fernandes verifica muitos regressos de macaenses com idades entre os 40 e os 50
anos "que conhecem Macau e sabem o que é trabalhar". E também os
reformados "voltam por uma questão sentimental".
"Há
sempre espaço para os macaenses em Macau", assegura.
ISG
// VM
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