Díli, 03 set 2020 (Lusa) -- O
líder da Fretilin, maior partido timorense, disse que defende o projeto do
gasoduto dos poços de Greater Sunrise para Timor-Leste, se for viável, mas que,
em caso contrário, os líderes do país devem ser claros com a sociedade.
"Não estamos a ir contra o
gasoduto. Estamos é a garantir ao povo que queremos uma economia sustentável e
que o setor petrolífero contribui da melhor forma", afirmou Mari Alkatiri,
secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin),
em entrevista à Lusa.
"Não mudámos de linha.
Queremos é poder provar que a linha para onde o país estava direcionado é a
mais viável e benéfica para o país. Ninguém exclui nenhuma opção. Muito menos a
opção de trazer o gasoduto para Timor-Leste, desde que seja viável",
considerou.
Questionado sobre se a posição é
ecoada pelos outros dois partidos no Governo -- o Partido Libertação Popular
(PLP), do primeiro-ministro Taur Matan Ruak, e o Kmanek Haburas Unidade
Nacional Timor Oan (KHUNTO) -- Alkatiri disse que "a posição da Fretilin é
da Fretilin".
"A posição do Governo está
agora a ser assumida, e grandes mudanças estão a ser introduzidas no setor do
petróleo", afirmou, recordando que a nova liderança do setor, no Governo,
na petrolífera e no regulador -- a Autoridade Nacional de Petróleo e Minerais
(ANPM) -- está no cargo há pouco mais de dois meses.
"Os outros estiveram 12 anos
e não produziram nem um cêntimo cá para dentro. Só despesas", acusou.
Mari Alkatiri falava à Lusa na
sequência de uma troca de críticas entre a atual equipa que lidera o setor
petrolífero timorense e Francisco Monteiro, ex-presidente da petrolífera
nacional, Timor Gap, exonerado em julho.
"A Fretilin foi a primeira a
defender o gasoduto do Greater Sunrise para Timor. Mas a economia tem as suas
regras e para começar deve haver estudos de viabilidade. E eu ainda não vi
nada, não vi nenhum estudo que me convencesse", afirmou Mari Alkatiri.
Às críticas do ex-presidente da
Petrolífera, Alkatiri recomenda que "não se meta em questões
políticas".
"Devia apresentar argumentos
técnicos mais válidos. Não discuto política com um ex-presidente de uma
empresa. A verdade é que quando defendi o gasoduto para Timor, Monteiro era um
simples assessor do então Presidente Xanana Gusmão. E já na altura era
arrogante", considerou.
Alkatiri defendeu que é essencial
ter estudos de viabilidade económica antes de avançar com decisões políticas,
porque "se o objetivo é reforço da soberania então a economia só se
reforça quando é viável e floresce", disse.
"O que significa que estudos
técnicos têm de ser feitos. E não inventem números, não façam projeções para
poder justificar o resultado. Não inventem", afirmou.
Caso os estudos que o Governo
agora quer realizar mostrem que o projeto não é economicamente viável, Alkatiri
diz que os líderes políticos "têm que ser claros" para a população
timorense.
"Pessoalmente ainda acredito
que é possível trazer o gasoduto para cá, mas é preciso também que todo esse
esforço seja conjugado com a necessidade de diversificação da economia",
afirmou ainda.
E, caso seja inviável, então os
responsáveis pelo investimento feito até aqui "vão responder se a
informação que apresentaram foi feita de forma falaciosa" já que "em
termos económicos, o país só é sustentável se a economia for sustentável",
considerou.
Alkatiri sustentou que entre a
informação que falta está um estudo comparativo entre as várias opções,
incluindo a possibilidade de Timor-Leste comprar uma participação no gasoduto
para Darwin, no Norte da Austrália.
O líder da Fretilin considerou
ainda "gravíssimo" o investimento de 650 milhões de dólares que a
Timor Gap fez, em nome de Timor-Leste, para conseguir uma participação maioritária
no consórcio do Greater Sunrise.
"Ninguém entra para uma
atividade, altamente especializada sem capacidade de responder questões
técnicas e investir para ser o primeiro parceiro na 'joint-venture'. Este
investimento foi para comprar o quê? Se calhar até ferro velho abandonado no
mar", afirmou.
Alkatiri considerou várias
apresentações públicas feitas pelo ex-Presidente Xanana Gusmão sobre o projeto
como "propaganda política", em que ficou manifestada "muita
falta de seriedade".
E justificou a decisão de,
enquanto primeiro-ministro do VII Governo, o executivo ter autorizado Agio
Pereira, então ministro de Estado, a assinar o tratado de fronteiras marítimas
com a Austrália por questões eleitorais.
"Estávamos às portas de
campanha para as eleições e se não tivesse feito isso a grande arma que iriam
usar contra a Fretilin seria essa. Mas sabia que havia outro filtro por passar
que é o parlamento", afirmou, recordando que o seu partido votou contra.
Além disso, considerou, o acordo
de fronteiras com a Austrália é "completamente leonino" por misturar
questões de soberania fronteiriça com um pacote económico e por, na prática,
ainda dar à Austrália parte dos recursos que são de Timor-Leste.
"Segundo a fronteira, 100%
do Sunrise deveria ser nosso, mas damos 30% a Austrália para trazer o gasoduto
para Timor-Leste. E se for para Darwin, onde tínhamos antes 90% [no anterior
tratado] agora passamos a ter 80 e damos 20 à Austrália", considerou.
"Foi pura simplesmente o ego
de uma pessoa a querer dizer que delineou a fronteira marítima, mas que não
afirma verdadeiramente a nossa soberania porque a Austrália ainda tem algo a
dizer sobre exploração do Sunrise", afirmou.
Insistindo na necessidade de uma
auditoria a tudo o que foi gasto nos últimos no desenvolvimento da estratégia fronteiriça,
Alkatiri disse que se deve aproveitar a atual situação económica -- que adia
necessariamente o calendário de desenvolvimento proposto -- para concluir os
estudos.
"O calendário, com estudos
ou sem estudos, não vai ser cumprido. O preço do petróleo e os efeitos da
covid-19 e da recessão económica internacional têm esse feito. Portanto o
calendário já não ia ser cumprido e Xanana Gusmão sabe disso", afirmou,
referindo-se ao homem que liderou a estratégia para o setor na última década.
ASP // VM
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