segunda-feira, 27 de julho de 2015

Scott Chiang, vice-presidente da Novo Macau: “Somos activistas quando temos de o ser”



Não se assume como activista, nem a associação que representa pretende sê-lo. O vice-presidente da Novo Macau, com humor, fala sobre a má relação com os deputados do mesmo grupo, do mais recente caso de corrupção que envolve Chan Meng Kam e da forma como é feita e vista a política no território

Começando pelo caso mais recente que envolve Chan Meng Kam, qual a visão da Associação Novo Macau (ANM) sobre o assunto? 

Não percebo como é que corrupção e Chan Meng Kam podem estar na mesma frase (risos). O sistema legal actual torna muito mais complicado que as pessoas candidatas a eleições sejam responsabilizadas por aquilo que a sua equipa fez. Esta não devia ter sido a única acusação feita, porque acho que há mais casos, como houve em eleições anteriores. Se se está a ir na direcção certa [para os evitar]? Não o suficiente. As sanções deviam ser mais pesadas para o candidatos que tentam comprar votos, seja com dinheiro ou quaisquer outros interesses.

Qual o balanço que faz da sua participação na ANM?

Tem sido uma espécie de aventura. Saímos de um ponto às escuras para encontrar alguma luz. No início, tínhamos várias hipóteses à nossa frente, tivemos que escolher o que queríamos fazer com a ANM, qual o caminho a seguir. Tivemos que perceber o que as pessoas estavam à espera que fizéssemos e agora, claro, com o tempo, fomos construindo e temos várias pontos a trabalhar, aos quais nos dedicamos. Se esta é a melhor estratégia? Não sei. Sempre ouvimos e acreditamos que os mais novos devem tentar fazer algo, por isso, é o que estamos a fazer. Não existe um espécie de guia que nos indique o caminho e diga o que fazer, acreditamos que se é a coisa certa, e se temos vontade para o fazer, então vamos fazê-lo. Tentamos observar as problemáticas e perceber se o devemos fazer, porquê e como. Às vezes erramos, outras vezes as coisas não correm como nós achávamos que poderiam correr, mas a verdade é que as pessoas têm sido bastante bondosas para com a Associação e este percurso tem-nos feito crescer e melhorar.

Acha que as pessoas exigem muito da ANM e dos seus membros?

É uma boa questão, porque sim. As pessoas exigem bastante da ANM. As pessoas esperam que sejamos uma espécie de santos (risos). Por exemplo, há uns dez anos num fórum online alguém escreveu que viu o deputado Ng Kuok Cheong num café e que ficou desapontado porque o viu, a ele e à sua esposa, a comer carne de porco. Quer dizer por ser uma pessoa tão normal como as outras não poderia ser deputado? (risos) Esta pessoa ficou desapontada porque o deputado é efectivamente uma pessoa normal. Não sei o que dizer. As pessoas têm quase todo o tipo de expectativas sobre nós. Esperam que sejamos auto-suficientes, que não precisemos, por exemplo, de donativos. Também esperam que não haja qualquer tipo de erro da nossa parte, somos humanos, isso é impossível de acontecer. E por aí fora.

Já se falou na hipótese de ser presidente da ANM. Gostaria de ocupar esse lugar? 

Não, não agora. Antes da presidência de Sou Ka Hou foi uma boa altura para mim, isto porque ele tinha imenso trabalho e eu é que ficava com os créditos (risos). A verdadeira resposta é que nesta Associação o cargo de presidente é só um cargo, basicamente quem tem disponibilidade para assumir o cargo candidata-se. Não é uma coisa que esteja relacionada com a capacidade, mas sim um conjunto de factores, companheirismo, disponibilidade, vontade para o fazer. Claro, se algum dia for o único disponível para tal, porque não? Mas não para já.

A ANM tem o rótulo de ser uma associação activista. Assume-se como tal?

Se perguntar isso aos deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San eles vão mostrar-se contra esse rótulo. Porque eles não se assumem como activistas, mas sim como uma força de construção da sociedade.

E o Scott assume-se como activista? 

Somos uma associação com muitos activistas (risos). Quando eu assumo uma acção, sim sou activista, mas às vezes só falo, aí não estou a ser activista, outras vezes brinco, também não é ser-se activista. O que é importante é que a ANM tente não ser apenas uma coisa, neste caso ser activista. É-o quando tem que o ser. Se olharmos para a sociedade em geral, a visão [das pessoas] não é tão abrangente. Quando estava em Taiwan, por exemplo, só no campus [da faculdade] era perceptível [a existência de] vários movimentos, várias associações. Isto não acontece em Macau, ainda não existe um leque de opções de associações e posições. Por isso mesmo é que muitas vezes temos de assumir papéis diferentes e não sermos um só. Por isso é que não sou de assumir um rótulo para a associação. Não direi somos isto ou aquilo, fazemos o que achamos que deve de ser feito.

Acha que é difícil ser-se activista em Macau? 

Não, o que eu acho é que é difícil é interiorizarmos a ideia de que se é um activista. Mas uma vez superado esse desafio, é fácil porque a concorrência é muito pequena.

Acha que os jovens estão mais atentos às questões políticas? Estão a interiorizar a ideia?
Estão mais abertos a ideias diferentes, mas não acho que a grande maioria se torne a voz local como a última geração. Porque ainda estão a aprender e a descobrir a política. Creio que não querem fazer parte da política, mas estão mais atentos. Por isso é que temos que trabalhar arduamente agora, para que quando estes jovens estiverem mais velhos, estejam mais envolvidos nos assuntos sociais. Temos que mostrar enquanto são novos, que é bom que sejam mais participativos na discussão pública, que sejam membros activos da sociedade. Quando acalmarem, casarem, tiverem um trabalho fixo, construírem família estarão menos focados nesta possibilidade de ser um ser activo.

As lutas que a ANM tem trazido para a rua, têm tido algum efeito positivo? 

Sim, acho que sim. Acho que temos conseguido mostrar às pessoas que é preciso que elas se convençam que conseguem por si só, pelas suas acções e alteração de comportamento, [fazer coisas]. As pessoas não precisam de mim. Há um ditado que diz que “se um mau cavalo conseguiu vencer a corrida, os bons cavalos vão perguntar-se: como é que deixei que ele ganhasse? Eu teria conseguido ganhar o troféu”. Talvez o efeito seja esse mesmo, mostrar que se alguém como Scott Chiang consegue, então porque é que não conseguimos todos?

Tentou ser deputado, como número dois de Jason Chao, mas a vossa lista não foi escolhida. Acha que isso aconteceu porque as pessoas não estão preparadas para dar lugar a jovens e a ideias frescas? 

Nós estamos ligados à imagem de activistas e as pessoas querem “a força da construção da sociedade” na Assembleia Legislativa. Isto é o que penso, que as pessoas não querem pessoas que protestam. Se conseguirmos convencer as pessoas que somos capaz de assumir essa responsabilidade, então as hipóteses serão bem mais reais.

Gostaria de ser deputado?

Por agora não. Quando estivermos mais maduros, talvez.

Mas vão tentar nas próximas eleições para a Assembleia Legislativa? 

Concorremos e vamos concorrer para os lugares, mas não é por querermos assumir o cargo agora. Concorremos porque é uma boa forma de consolidar o nosso trabalho, é uma forma de crescimento, é também uma boa forma de comunicar com a sociedade. Com o passar dos anos, e com a observação da sociedade ao nosso trabalho e ao nosso crescimento, a sociedade conseguirá perceber as diferenças e tudo aquilo que evoluímos. Nessa altura, estaremos prontos e as pessoas irão estar prontas para votar em nós. Aí, alguns de nós seremos bem sucedidos. Pelo menos é o que espero que aconteça.

Os membros mais jovens da Associação vivem um momento de desacordo com os deputados Ng Kuok Cheong e Au Kam San. O que aconteceu?

É como uma tragédia grega. O filho cresceu e o velho rei tinha outros planos e achou que não devia deixar o seu filho fazer o que queria. Mas o filho achou, que sendo rei no futuro, deveria tentar o seu caminho. Era quase inevitável o confronto de gerações. Mas o mais importante é como se consegue lidar com essas diferenças. Não posso chamar-lhe conflito, para já, vamos só dizer que são diferenças que nos separam. Diferenças de como vemos o mundo e de como queremos agir para com o mundo. Se a nova geração se resumir a uma cópia da geração anterior nunca seremos bons activistas, nunca seremos uma boa oposição, nunca seremos uma boa voz. Não estamos a trabalhar juntos, mas somos do mesmo grupo, portanto [trabalhamos] num todo e temos de ver o que é o melhor para a sociedade.

Acha que no futuro essas diferenças serão ainda maiores? 

Tendo em conta que o cenário político de Macau está bastante vazio, isto pode ser visto não como um conflito mas como a diversificação, que é aquilo que quero ver. Se conseguimos ir para diferentes lados, mas ainda assim manter-nos no grupo dos pró-democratas. Isso é bom, melhor que bom, estarmos num todo mas com diferentes perspectivas. Se dentro do mesmo grupo estivermos sempre a discutir, gastarmos o nosso tempo com as diferenças, então isso é um problema.

Mas como estão as relações entre os membros e os deputados? 

Não podemos pensar nos membros só como um grupo. Todos temos diferentes visões e valores. A maioria do tempo descobrimos o ponto principal pelo qual todos lutamos. A meta é a mesma.

Considera que as ideias destes dois deputados defendem efectivamente os interesses da sociedade? 

Não como nós, claro que não. Eles defendem, mas não como nós. Se fizéssemos o mesmo nós é o que estaríamos a imitar, não eles a nós. Efectivamente pensamos de maneira diferente, somos de diferentes gerações, eles são deputados e têm recursos diferentes. Temos pensamentos diferentes, mas claro, acho que ambos queremos o mesmo: defender os interesses da população.

E as intervenções do deputado Fong Chi Keong são representativas do pensamento de Macau?

Não acredito nisso. A maioria das pessoas sabe que o que ele diz são tretas. O que as pessoas vêem e talvez admirem é que está em bruto, ou seja, não é trabalhado, não tem alguém que lhe escreva os textos para parecer bonito, como outros deputados. O que ele diz é preocupante, ele não tem um discurso bonito, diz o que lhe vem ao cérebro, se é que tem um. Fong Chi Keong não é nada, às vezes é um palhaço, mas na maioria das vezes é só um cidadão comum a defender aquilo em que acredita.

Planos para o futuro?

As pessoas de Macau e o que elas pensam é o nosso futuro. É naquilo que estamos arduamente a tentar trabalhar. Seria muito difícil defender aquilo que as outras gerações já conseguiram, seria ainda mais difícil pensar em alternativas que vão para além daquilo que eles já estabeleceram. Estas duas coisas deixam-nos bastante ocupados, mas na verdade, nas últimas duas décadas, Macau mudou muito e continuamos a tentar perceber e a tentar arranjar formas de melhor servir este novo conceito do território.

Hoje Macau

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