Macau, China, 12 mai 2019 (Lusa)
-- A organização não-governamental Amnistia Internacional (AI) considerou à
Lusa que a exploração das empregadas domésticas, em Hong Kong e Macau, é uma
"escravatura moderna".
Em resposta à Lusa, a AI explicou
que tem investigado a situação dos trabalhadores domésticos em Hong Kong, e que
em Macau "existem algumas semelhanças", denunciando que "os
trabalhadores domésticos migrantes podem ficar presos em ciclos de exploração
que equivalem a escravatura moderna".
"Somos discriminados, não
temos direitos, nem sistema de saúde e ninguém nos ouve", disse à Lusa a
presidente do Sindicato Verde dos Trabalhadores Migrantes das Filipinas em
Macau, Nedie Taberdo.
Pouco mais de 450 euros por mês,
é o que pedem de salário mínimo as associações de empregadas domésticas
contactadas pela Lusa, num território considerado pelo Fundo Monetário
Internacional (FMI) como o segundo com o maior rendimento 'per capita' do mundo
e que para o próximo ano passará a ser o primeiro, destronando o Qatar, subindo
para os 124 mil euros, quase o triplo da média das economias mais avançadas
como a Austrália, Estados Unidos, Áustria, Reino Unido e China.
Também fonte da organização
não-governamental Human Rights Watch, que identifica de "problema
global" a situação dos trabalhadores domésticos migrantes na Ásia, na
África Oriental e no Médio Oriente, disse à Lusa que "os trabalhadores
domésticos correm um alto risco de trabalhar excessivamente por longas horas,
sem descanso, e por uma fração do salário mínimo".
"As lacunas na proteção
legal tornam mais fáceis para os empregadores abusarem dos trabalhadores, e
mais difícil para os trabalhadores conseguirem ajuda", argumentou a Human
Rights Watch.
Por outro lado, a AI identificou
como o principal problema a "falta de regulamentação e regulação das
agências de colocação de trabalhadores domésticos migrantes",
principalmente oriundos da Indonésia.
Durante a pesquisa que a AI fez
em Hong Kong constatou que estas "agências estão rotineiramente envolvidas
no tráfico de trabalhadoras domésticas migrantes, explorando-as em condições de
trabalho forçado" e que são "compelidas a trabalhar em situações que
violam os seus direitos humanos e do trabalho".
Nesta investigação, a AI diz ter
descoberto casos de "confisco de documentos de identidade e restrições à
liberdade de movimento".
Em Macau é relativamente comum as
famílias empregarem uma trabalhadora doméstica a tempo inteiro e parte delas
reside mesmo em casa dos patrões.
"Queremos que o trabalho
doméstico seja respeitado, com um contrato normal para podermos ter uma vida
decente", contou à Lusa a presidente do Sindicato Progressistas dos
Trabalhadores Domésticos de Macau, Jenny Simeon, denunciando ainda a existência
de "empregadas a ganhar 2.000
a 3.000 patacas mês (entre 220 e 330 euros)".
Filipinos, Indonésios,
vietnamitas, nepaleses e tailandeses estão entre os grupos mais desprotegidos
em Macau: no antigo território administrado por Portugal, o contrato das
empregadas domésticas é feito através de uma agência, ou entre o patrão e a
trabalhadora, sendo que, na prática, o empregador fica com o poder de cancelar
a autorização de permanência no território à trabalhadora.
"Se o nosso empregador
quiser acabar com o nosso contrato, nós perdemos o nosso 'blue card' (permissão
de residência através de um contrato de trabalho) e temos de começar do início
outra vez", explicou Jenny Simeon.
Os trabalhadores não-locais têm
de regressar ao seu país de origem por seis meses em caso de cessação do
contrato e em casos excecionais, como despedimentos sem justa causa, têm seis
meses para encontrar um novo trabalho em Macau, mas sempre na mesma área.
"Para eles [patrões] nós não
somos humanos, não entendem as nossas dificuldades e é por isso que não nos
respeitam", acusou Jenny Simeon.
As duas dirigentes associativas
apontaram ainda a falta de interesse demonstrada pelos deputados e governantes
de Macau em solucionar o problema e em proporem alterações à lei que protejam
os direitos das trabalhadoras domésticas, um salário mínimo digno e ainda um
aumento no subsídio de habitação, que neste momento se cifra em cerca de 50
euros por mês.
"Desde que cheguei a Macau,
há 15 anos, a economia melhorou muito, mas nada mudou", disse Nedie
Taberdo, que pede há vários anos um aumento do subsídio de habitação para cerca
de 150 euros por mês.
Jenny Simeon garantiu ter já
estado em reuniões com os dois principais deputados pró-democratas em Macau,
Sulu Sou e José Pereira Coutinho, sobre o salário mínimo. "Foram muito
simpáticos, mas disseram que nada podiam fazer", disse.
MIM // VM
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