terça-feira, 15 de dezembro de 2015

"Filhos" de Albuquerque em Malaca herdaram "lealdade" a Portugal


Malaca, 15 dez (Lusa) -- Os descendentes de portugueses em Malaca (Malásia), uma comunidade iniciada com a conquista da região por Afonso de Albuquerque em 1511, herdaram do conquistador do Oriente a lealdade a Portugal, país que nunca conheceram.

Afonso de Albuquerque, que morreu há exatamente 500 anos, ficou conhecido não apenas pelas suas conquistas e pela sua visão estratégica essencial na manutenção do império português no Oriente, mas também pela sua lealdade ao país e ao rei.

"Nós queremos ser portugueses", justificou Christopher De Mello, um dos promotores da herança de Portugal naquele canto do mundo. E dá m exemplo quotidiano que é visível nas ruas de Malaca: aqueles que se afirmam descendentes de portugueses continuam a cumprimentar-se com dois beijos, uma saudação que não é vulgar na Malásia.

"Não queremos saber do país, se é rico ou pobre, não interessa", diz, referindo-se a Portugal. "O mais importante é quem somos. Isso é a riqueza que temos em nós", acrescenta.

No bairro dos portugueses, o idioma está a perder espaço para o inglês, num país onde o malaio é a língua oficial, mas o orgulho em ser português é passado de geração em geração através da música e dos costumes.

Para Joseph Sta Maria, representante das minorias junto da administração de Malaca, a lealdade a Portugal é uma herança de Afonso de Albuquerque, embora não tenha a ver com patriotismo, mas com uma ligação cultural.

"Nós nunca morremos, nós somos portugueses. Amamos os portugueses, ainda que eles não tenham feito assim muito [por nós]. É a afinidade e o orgulho de nos chamarmos portugueses", vincou, reconhecendo ainda que "Portugal tem os seus próprios problemas" e está "muito longe de Malaca".

"Repare para o quanto os portugueses fizeram por Timor-Leste. Foram 450 anos de administração e quando eles devolveram Timor-Leste, o país estava em ruínas, logo, eu não espero que Portugal faça muito [pelos portugueses de Malaca]", diz.

A visão que os portugueses de Malaca têm de Portugal é muito própria e, ainda que exista um desejo de um contacto maior com os portugueses de Portugal e o sonho de visitar terras lusas, há também um orgulho em manter a portugalidade específica de Malaca.

A língua portuguesa é preterida em relação ao idioma local conhecido como kristang (cristão-português), que mistura português antigo com malaio, e as músicas e danças de folclore também não são para adequar ao Portugal de hoje.

Joseph Sta Maria, autor do livro "Pessoas proeminentes na Comunidade Portuguesa em Malaca", acredita que o seu povo nunca irá desaparecer, a menos que o 'Portuguese Settlement', o bairro onde residem, seja destruído.

Também a religião católica "mantém-nos unidos", destacou, defendendo que para quem não é católico, é difícil fazer parte da comunidade, porque tem de celebrar o Natal, o São Pedro ou o São João".

O forte catolicismo leva Christopher De Mello a pedir a Portugal "um padre português, talvez reformado, para viver connosco no 'Portuguese Settlement' e para ensinar-nos", porque há poucos presbíteros na Malásia, país de maioria muçulmana.

O padre Michael Mannayagam, de origem indiana, é um dos sacerdotes da região que se desdobra em celebrações numa cidade com "cerca de 20000 católicos", sobretudo de origem chinesa e indiana, dado que os portugueses não representam mais do que mil.

O presbítero considera que a expansão do catolicismo através dos portugueses não foi muito notória na região, já na altura maioritariamente muçulmana, mas destaca a resistência dos católicos durante as perseguições holandesas.

" Alguns fugiram da cidade. Dispersaram-se por aqui e ali. Mantinham-se clandestinos e onde houvesse um padre, eles teriam uma missa", recordou.

Na visão de alguns malaios, disse Christopher De Mello, o povo português adora beber e, tendo dinheiro ou não, sabe divertir-se e "celebra um Natal muito bonito", convidando toda a gente a participar e oferecendo comida e bebida nas suas casas.

"Na verdade, os malaios admiram-nos e também têm inveja de nós, porque tudo o que fazemos na Malaca é diversão, é festa, é prazer, mas algumas coisas são muitíssimo sensíveis para nós falarmos aqui", referiu.

ANYN // PJA

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