Pante Macassar, Timor-Leste, 30
abr (Lusa) - O líder timorense Xanana Gusmão admitiu hoje ter usado Rui Araújo,
que nomeou como seu sucessor no cargo de primeiro-ministro, numa ação de
"guerrilha política" em que se aliou com a Fretilin para controlar o
parlamento.
"Sei que vou ofender o Rui.
O Rui é muito meu amigo, gosto muito dele e trabalhamos desde o tempo da
clandestinidade. Mas usei-o. Usei-o", disse numa entrevista à Lusa em
Pante Macassar, no enclave de Oecusse, região onde está, desde domingo, em
campanha.
Recorde-se que no início de 2015
Xanana Gusmão se demitiu do cargo de primeiro-ministro - o Governo era formado
por uma coligação de três partidos (CNRT, PD e FM) - nomeando como seu sucessor
um membro do Comité Central da Fretilin, Rui Maria de Araújo.
O PD foi formalmente expulso do
Governo, os seus membros ficaram como independentes e com Araújo entraram mais
três elementos da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin),
que continuou a votar ao lado do Governo em praticamente tudo.
A mudança - a meio da legislatura
e que ditou o fim do V e o arranque do VI Governo - surgiu depois de um tenso
final de 2014 marcado, particularmente, pela expulsão dos magistrados
internacionais, maioritariamente portugueses, que estavam em Timor-Leste.
Nos bastidores de todo este
processo estava a questão dos processos por supostos impostos devidos a
Timor-Leste por empresas petrolíferas com os quais, segundo Xanana Gusmão, os
magistrados não lidaram adequadamente. O líder timorense culpa-os por
Timor-Leste ter perdido os processos.
"O mais irritante para mim
foi aqueles processos todos desde a primeira à última página, as palavras eram
igualíssimas. Só mudavam o nome da companhia e a quantidade de dinheiro. Mas
como eram [processos] grossíssimos, lá dentro passava-lhes e aparecia o nome de
outra companhia", disse.
"Um corta e cola que não nos
ajudava e ajudava as companhias", disse.
Xanana Gusmão explicou que, no
debate sobre os juízes no Parlamento Nacional e perante a posição da Fretilin,
decidiu mudar de estratégia e "fazer guerrilha".
"Fui ao parlamento e levei
horas a discutir aquilo até que fiquei exasperado e disse à bancada da
Fretilin: pensam que estou aqui a perder tempo para defender o meu dinheiro?
Isto é do nosso povo. Se não quiserem, podem sair que nós aprovamos",
disse, referindo-se ao decreto com a ordem de expulsão dos magistrados.
"Perante toda esta
dificuldade de defender interesses nacionais com uma total vontade das
instituições do estado, tive que fazer guerrilha. Chamo a Fretilin e controlo o
parlamento", contou, admitindo que por isso usou Rui Araújo.
Referindo que já no IV Governo
tinha convidado Rui Araújo para ser vice-primeiro-ministro - "ele não
aceitou, claro" -, Xanana Gusmão explicou que tudo foi feito num processo
de preparação para o que acabaria por ser a conciliação e o acordo sobre
fronteiras assinado este ano.
"Todo este processo de
preparação para meter a Austrália a sentar-se connosco levou tempo. Amadureci
em termos de estudar todos os condicionalismos, perceber o que pode vir a criar
dificuldades nas decisões", disse.
Já durante a campanha agora em
curso, Xanana Gusmão voltou a piscar o olho a Rui Araújo, por considerar que
"está metido na lama" do seu partido.
"Eu tenho pensado muito no
irmão Rui Araújo. Rui, sai da lama. Sai junto dos maus. Eles meteram-te na lama
e tu precisas de sair. Amo muito esse irmão do coração. Ele precisa de
levantar-se forte", afirmou, durante um comício.
Na altura, Rui Araújo disse à
Lusa, em reação ao comentário, que "se mantém firme" nas fileiras da Fretilin.
"Fico honrado e até certo
ponto lisonjeado por esses cumprimentos de um líder nacional, que não mereço.
Mas o líder nacional conhece-me muito bem e sabe que não sou
troca-tintas", disse à Lusa.
ASP // VM
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