Pequim,
22 abr (Lusa) - Mais de 70% dos chineses têm relações sexuais antes de casar,
rompendo com a milenar "cultura de abstinência" que dominou a China
até ao final da década de 1970.
De
acordo com um estudo de Li Yinhe, investigadora reformada da Academia Chinesa
de Ciências Sociais, aquela percentagem subiu de 15% para 71% durante os
últimos 25 anos.
"Isto
é uma revolução sexual tranquila", afirma a socióloga. "As pessoas
passaram a falar sobre sexo mais abertamente".
Li
Yinhe, 63 anos, é considerada "a primeira sexóloga da China".
Num
recente encontro com jornalistas estrangeiros, Li Yinhe situou o início da
referida revolução em 1977, "o ano da revisão do Código Penal, que
descriminalizou as relações extraconjugais".
Uma
mulher que mantivesse relações sexuais com vários homens podia ser condenada e
presa, contou a socióloga.
Na
China antiga, "as pessoas eram muito positivas em relação ao sexo",
mas desde a dinastia Song (960-1279) até à "Grande Revolução Cultural
Proletária (1966-76) predominou "uma cultura de abstinência sexual".
O
Partido Comunista Chinês (PCC), que tomou o poder em 1949, "era, em muitos
aspetos, parecido com a igreja cristã" e "associava o sexo à burguesa
e ao capitalismo", sustenta a socióloga.
"Para
os comunistas, a prioridade era alimentar a população. A comida, em primeiro
lugar. Um das primeiras medidas que tomaram foi fechar os bordéis", disse.
"É
verdade que, para quem tem uma vida muito dura, o sexo é um luxo. Mas as
pessoas, hoje, já têm a barriga cheia e o sexo passou a ser uma necessidade
corrente", acrescentou.
O
PCC, entretanto, renunciou ao "aprofundamento da luta de classes" e
sem abdicar do seu "papel dirigente", adotou uma nova política,
focada no desenvolvimento económico.
Em
apenas três décadas, a pobre e isolada China tornou-se a segunda economia
mundial, ultrapassando o Japão e a Alemanha. Mais de 650 milhões de chineses
usam a internet, 80% dos quais através de smartphones e outros dispositivos
móveis.
"Muitas
coisas mudaram", salienta Li Yinhe. "A comunidade 'gay' tornou-se
mais visível e a sociedade chinesa tem-se mostrado bastante tolerante acerca da
homossexualidade".
A
homossexualidade foi retirada da lista oficial de "perturbações
mentais" em 2001, mas a socióloga considera que, neste domínio, continuam
em vigor "leis absurdas e ultrapassadas".
Li
Yinhe defende a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo e a
"descriminalização da prostituição, da pornografia e do sexo em
grupo".
"Além
da Coreia do Norte, não conheço outro país que tenha uma lei como esta",
disse a sexóloga acerca da proibição da pornografia.
Quanto
à legalização da prostituição, argumentou que "todas as relações
consentidas entre adultos devem deixar de ser punidas pela lei, quer haja ou
não dinheiro envolvido".
"As
amantes e concubinas dos ricos, que eles sustentam como símbolos do seu sucesso
e poder, não são punidas", observou.
Nas
décadas de 1960 e 1970, Li Yinhe estaria provavelmente detida num "campo
de reeducação através do trabalho", acusada de promover "ideias
decadentes" e "contrarrevolucionárias".
Em
dezembro passado, a socióloga assumiu que tem há 17 anos uma relação amorosa
com um transexual e vivem juntos com uma criança deficiente adotada.
"O
meu companheiro nasceu mulher, mas identifica-se como homem e só consegue
apaixonar-se por mulheres heterossexuais e não por mulheres homossexuais",
escreveu Li Yinhe na sua conta no Sina Weibo, o "twitter chinês".
Foi
uma "confissão" sem precedentes nos meios intelectuais chineses e,
logo nas primeiras 24 horas, atraiu mais de 200.000 leitores.
"Toda
a gente é, de alguma forma, única. Respeitar as escolhas das Li Yinhe que vivem
entre nós é respeitarmo-nos a nos próprios", comentou na altura o Diário
do Povo, órgão central do PCC.
AC
// DM
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