Díli,
02 dez (Lusa) - Tradições culturais, ativismo político e nacionalismo, são os
tons dominantes das obras artísticas timorenses que se consolidaram desde a
independência do país, compondo o que é apelidado de "Movimento
Kultura".
Um
espaço eclético de criação que descreve um pouco do que tem sido, nos últimos
anos, a crescente expressão cultural e artística de jovens timorenses através de
pintura, escultura, videoarte, música, performance e outras formas artísticas.
Obras
em que as referências ao passado, quer ao mais místico e animista quer ao mais
político, relacionado com a ocupação ou o colonialismo, se fundem com imagens
mais atuais de contestação ou simplesmente de expressão individual.
Experiências
onde coletivos de arte e expressão se formam, projetos multinacionais se
experimentam e artistas individuais desenvolvem obras com maior ou menor
expressão, 'alimentados' pelo interesse, e pela 'carteira' dos estrangeiros ou
das instituições em Timor.
O
país já tinha, mesmo antes da independência, vários artistas de algum renome e
até alguns com reconhecimento internacional, incluindo Maria Madeira, Gabriela
Carrascalão ou Sebastião Silva, quase todos a viver na diáspora.
Internamente,
desde pelo menos a década de 90 do século passado que algumas manifestações
culturais mais alternativas se começaram a ver, com graffiti político ou murais
em espaços públicos a ser as primeiras telas.
Desde
o fim da ocupação indonésia, porém, esse número aumentou significativamente com
dezenas de novos artistas em iniciativas individuais ou projetos como os
coletivos artísticos Arte Morais, de 2003, ou Gembel, que surge em 2008.
Projetos
que mantêm a natureza eclética dos artistas - muitos são multifacetados
combinando música com pintura ou escultura com performance - e acentuam a
tónica intervencionista da sua arte.
Arte
onde rostos, figuras e expressões de timorenses - quase que a querer dar rosto
a quem, durante anos, não o teve - se misturam com simbologia nacional,
referências ao natural ou com um abstrato em jeito de grito.
Os
primeiros esforços para tentar reunir artistas timorenses foram feitos no
projeto Arte Moris, uma comunidade, escola de artes e centro cultural que se
instalou no espaço do antigo museu indonésio da 27ª província (como Jacarta
considerava Timor-Leste).
A
placa da inauguração em 1995 pelo então vice-presidente indonésio Try Sutrisno,
é hoje mais um espaço para uma das muitas instalações exteriores, onde restos
de carros, de mobílias ou ferro-velho são cartão-de-visita para um centro que
em 2013 completou 10 anos.
Um
espaço que pretendia ir além da arte, contribuindo para a reconstrução social
de um país devastado por décadas de conflito e onde tudo era limitado,
inclusive a expressão artística.
Hoje
mais enfraquecido que nunca - há indícios de que o espaço pode ser retomado
pelo Governo - o Arte Moris ainda é um sítio a visitar em Díli mas muitos dos
membros da comunidade estão já em outros projetos.
Iniciativas
individuais, colaborações nacionais ou internacionais ou projetos como o Gembel
que regularmente organiza eventos culturais, entre exposições, concertos e
debates.
Artistas
como Alfeo, Edson Caminha, Evang, Ino ou outros que tentam sobreviver com a sua
arte, trabalhando praticamente sem apoios.
A
nível da música, os primeiros anos pós-independência também viram
transformações importantes, com a sonoridade do passado, de grupos históricos
como os 5 do Oriente (mais pensada para os bailes tão populares em Timor-Leste)
a ser substituída por musicalidades mais política, mais contestatárias.
Grupos
como os Vi-Almaa X, um dos mais populares depois da independência com temas
como Rona ba (Ouve lá), um apelo aos políticos que não escutam o povo ou então
os Bibi Bulak, um grupo de música e performance também saído do coletivo Arte
Moris.
Ou
então os mais recentes Galaxy que começaram como um grupo de hard rock mas
foram progressivamente transitando para o reggae, uma sonorização que, como
explica o viola baixo Edson Caminha, permite melhor retratar
O
seu maior hit, Taka Matan (Olhos fechados) é uma canção de amor que fez furor
nos concertos do grupo ao lado de outros temas mais carregados de contestação.
A
falta de emprego e de dinheiro, a poderosa máquina das agências internacionais
em Timor-Leste, o problema da SIDA e a reintrodução do português, a falta de
"ossan" (dinheiro), o crime "no caminho da meia-noite":
tudo tem sido temas, nos últimos anos, para cantar música em tétum.
'Revolucionários'
com uma pequena mesa de mistura, algum equipamento de som e criatividade nas
letras que escolhem para relatar a vida em Timor-Leste, nos primeiros anos
depois da independência, onde se misturam rap, hard rock ou rock urbano e
reggae.
Na
música timorense - marcada pelo pseudo-pop melodramático herdado da indonésia
ou pelo 'pimba' português -- foram uma lufada de ar fresco que veio para ficar.
Em
casas, bares e até na praia, as noites da juventude timorense foram-se
multiplicando, ampliando-se chegando a festivais de música, dias da música e
grandes encontros com milhares de assistentes.
E
também em pequenos encontros mais alternativos como os de música improvisada e
pintura, na ONG Luta Hamutuk, ou os de jazz no novo sítio 'in' de Díli, o Meow,
onde a decoração é tão eclética como o seu dono, o extravagante Robbie.
Um
escocês que chegou a Timor-Leste pouco tempo depois da independência, abriu um
dos primeiros cabeleireiros alternativos, passeava com uma cabra de estimação
pela trela e criou um dos espaços mais divertidos dos últimos anos: o bar
(Z)iggy, de onde trouxe os manequins que marcam presença no Meow.
ASP
// PJA
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