Díli,
03 dez (Lusa) - Um dos fundadores da Fretilin, Abílio Araújo, considera, em
entrevista à Lusa, que o oportunismo político criou e alimentou uma divisão
falsa entre o leste e o este do país, apenas para gerar instabilidade e
confusão.
"Houve
muito oportunismo político, que encobriu toda a história e todo o processo de
luta. Por parte de várias pessoas", refere Abílio Araújo, em entrevista à
Lusa.
"Houve
em determinados momentos da nossa luta a ideia e a opinião de que só foram os
leste-timorenses, os da ponta leste, que fizeram a luta. Isso não é verdade,
porque a luta, de facto, as grandes campanhas de cerco e aniquilamento até
começaram pela fronteira, onde muita gente morreu, não só os de oeste como os
de leste", afirma.
Araújo,
um dos criadores do programa e manual político da Fretilin (Frente
Revolucionária do Timor-Leste Independente) e ministro de Estado para os
Assuntos Económicos e Sociais do I Governo, insiste que a luta foi ganha
"por haver um espírito de comunidade, de povo".
A
ideia "de que uns lutaram e outros não lutaram" demonstra
"desconhecimento da história e oportunismo, de quem não quer transmitir
mas quer mistificar a realidade", o que, diz, cria "ideias falsas e o
terreno propício e favorável para a instabilidade".
Pontualmente
ao longo das últimas décadas - e mais recentemente nos confrontos de 2006 que
levaram à queda do Governo da Fretilin, liderado por Mari Alkatiri - houve
referências a uma suposta divisão entre as zonas mais a leste do país e as mais
próximas à fronteira com Timor indonésio.
Referências
a termos como lorosae (da ponta leste) e loromono (da parte oeste) ou aos
firacos (mais ao leste) e os caladi (mais a oeste) ou tentativas de
'contabilizar' quem mais contribuiu para a luta ou quem era mais ou menos a
favor da independência.
Uma
divisão que, imaginária ou não, real ou simbólica, acaba por surgir em momentos
de tensão e instabilidade política e até mesmo, em alguns casos, na
contabilidade de apoios eleitorais ou políticos.
Apesar
disso, Araújo insiste que "a divisão Leste/Oeste é uma divisão que nunca
existiu", sublinhando que os laços exogâmicos, pelo casamento, tornaram os
timorenses quase todos família, "mas o genocídio destruiu parte
disso".
Lá
fora, e apesar de divisões e diferenças que se manifestaram com maior ou menor
intensidade durante toda a ocupação indonésia, também havia uma unidade de
propósito "porque toda a gente andava a atacar a Indonésia".
"Toda
a gente lá fora, cada um a dar os tiros por seu lado, mas estavam todos a
tentar atingir a Indonésia na denúncia do genocídio, da violação dos direitos
humanos e da militarização que estava a ocorrer em Timor", disse.
Recorda
que depois da morte de Nicolau Lobato (considerado pai da nação timorense e
segundo presidente, que morreu em 1978), houve "dois anos de
desorganização total das forças, ficando a reorganização cargo de Xanana Gusmão
e de Ma'Huno, "os dois únicos sobrevivente do Comité Central".
Em
março de 1981, recorda, realizou-se em Timor-Leste a primeira Conferência
Nacional de Reorganização das Forças onde, apesar de não participar, Abílio
Araújo garante ter sido eleito secretário-geral da Fretilin e onde se vincou a
ideologia marxista-leninista.
Uma
fase de "maior radicalização" - antes da despartidarização que Xanana
Gusmão conduziria pouco tempo depois - em que o partido proclamou "aos
sete ventos que era comunista, um partido marxista-leninista".
Opção
que diz não ter apoiado e que considera "contraproducente" porque na
altura havia já uma aproximação à Igreja.
Progressivamente
Fretilin e UDT (União Democrática Timorense), primeiro partido timorense e que
defendeu em 1974 uma transição para a independência ou autonomia sob Portugal,
foram-se aproximando.
Projetos
como a Convergência Nacionalista, esforços que acabaram por criar o Conselho
Nacional da Resistência Timorense (CNRT) ou outras iniciativas de aproximação
das várias correntes timorenses foram-se consolidando.
Abílio
Araújo considera mesmo que um dos momentos mais importantes da luta foi a
decisão dos timorenses, apesar de divergências anteriores (e algumas
posteriores) terem decidido "sentar-se juntos", incluindo os que
"estavam a trabalhar com os indonésios".
"O
diálogo timorense inclusivo, que decorreu na Áustria sob os auspício das Nações
Unidas, foi um marco decisivo, porque veio dar uma nova força, um novo alento,
à luta diplomática que Portugal estava a desenvolver", disse, referindo-se
aos encontros de 1993.
"E
nisso o que eu posso dizer, como ninguém fala, ou se falam procuram denegrir a
minha contribuição, quero dizer, é que tive uma grande contribuição, não direi
exclusiva, mas uma grande contribuição com a minha entrada na Indonésia e os
contactos com os vários sectores, nomeadamente o futuro presidente (indonésio)
Habibie", disse.
ASP
// PJA
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