Redação, 24 jul (Lusa) - O
julgamento de um ex-agente dos serviços secretos e de um advogado acusados de
conspiração pelo Ministério Público australiano num caso relacionado com as
negociações de fronteiras e exploração petrolífera começa na próxima
quarta-feira.
O ex-agente do Serviço Secreto de
Informação Australiano, conhecido apenas por 'Testemunha K', e o seu advogado,
Bernard Collaery, foram acusados de conspiração no passado dia 28 de junho pelo
Ministério Público e são agora julgados à porta fechada.
Os acusados enfrentam uma pena
máxima de dois anos de prisão, se forem considerados culpados em julgamento.
Em causa está uma denúncia por parte
da 'Testemunha K', que revelou um esquema de escutas montado pelos serviços
secretos australianos em escritórios do Governo timorense, em Díli.
As escutas terão sido instaladas
em 2004 por uma equipa liderada pela 'Testemunha K' durante obras de reconstrução
dos escritórios, oferecidas como cooperação humanitária pela Austrália.
De acordo com os relatos, através
das escutas, o Governo australiano obteve informações que permitiriam favorecer
as intenções australianas nas negociações com Timor-Leste da fronteira marítima
e pelo controlo da zona Greater Sunrise, uma rica reserva de petróleo e gás.
O tratado, que acabaria por ser
assinado, apontava que cada país teria 50% da área a explorar, embora a maior
parte das reservas se encontrasse dentro de território timorense.
Quando tomou conhecimento da
existência das escutas, Díli contestou o tratado e apresentou uma queixa contra
a espionagem de Camberra junto do Tribunal Arbitral de Haia, argumentando que,
devido às ações do Governo australiano, o acordo era ilegal.
Timor-Leste retirou a acusação
como um ato de boa fé e, em março de 2018, os dois países assinaram um novo
tratado que delimitou uma fronteira marítima permanente entre os dois países,
passando Timor a receber pelo menos 70% das receitas originárias da exploração
do Greater Sunrise.
Desde 2012 que a 'Testemunha K'
está retida na Austrália, após uma rusga organizada pelos ASIO (serviços
secretos australianos) ter confiscado vária documentação, incluindo o
passaporte.
Em 2016, a testemunha viu-se impossibilitada
de viajar até Haia para dar o seu testemunho, visto que o Ministério dos
Negócios Estrageiros australiano negou uma nova emissão do passaporte.
O caso tem sido contestado por
várias organizações e personalidades.
Recentemente, vários ativistas do
Movimento Contra a Ocupação do Mar de Timor condenaram o Governo australiano
pela sua atuação, comparando-a com as do ditador indonésio Suharto.
"O Movimento Contra a
Ocupação do Mar de Timor está surpreendido que, nos dias de hoje, o Governo
australiano esteja a fazer o que antes julgavam que apenas o ditador Suharto
fazia durante o seu reino".
O movimento, que é composto por
várias organizações timorenses, condenou as acusações, apelidando-as de terem
"motivações políticas" um ataque do Governo à democracia e liberdade
de expressão.
"Esta atitude do Governo da
Austrália demonstra que o Governo fará qualquer coisa em prol dos interesses
comerciais do país", mesmo que implique "violar a lei internacional e
privando um dos seus vizinhos mais pobres", disse o movimento.
Atualmente, Timor-Leste é o país
asiático com menor Produto Interno Bruto.
No início do mês, um ex-diplomata
da ONU que integrou a equipa de Timor-Leste espiada em 2004 criticou a Justiça
australiana.
Em declarações ao jornal
britânico The Guardian, Peter Galbraith considerou a acusação aos dois homens
uma ação "vingativa e sem sentido", quando o que a Austrália devia
fazer era esquecer este "episódio pouco edificante".
Galbraith insistiu que a operação
de espionagem conduzida contra ele e outros funcionários de Timor-Leste foi
"claramente um crime" à luz da lei internacional.
"É apenas vingativo e
inútil, é hora de seguir em frente. Finalmente, depois de 18 anos, a Austrália
fez a coisa certa [assinando o tratado de petróleo e gás em março desde ano].
Aceite os elogios, que são merecidos, e siga em frente", considerou.
JYO (ASP) // ARA
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