Díli,
19 jul (Lusa) - Jovens e dirigentes da sociedade civil timorense manifestaram
hoje preocupação com o esboço da nova política de planeamento familiar de
Timor-Leste que, entre outros aspetos polémicos, sugere que esses métodos sejam
disponibilizados apenas para casais.
A
avançar no conteúdo atual, refere uma petição e uma carta aberta dirigida ao
primeiro-ministro, Rui Maria de Araújo, a política terá "um impacto
negativo e afetaria os direitos de todos, especialmente jovens, pessoas não
casadas e mulheres nas zonas rurais".
O
rascunho determina, por exemplo, que as mulheres só podem ter acesso aos
métodos de contraceção ou de planeamento familiar se forem a uma clínica com os
maridos.
Segundo
os apoiantes da carta aberta, este tipo de medidas são introduzidas no texto
devido à influência no debate de vários dirigentes religiosos.
Nas
redes sociais circularam, por exemplo, imagens do debate público deste tema em
que na mesa estavam apenas dois religiosos, um católico e um protestante. O
debate, sobre o qual a imprensa não foi informada, passou despercebido ao ser
realizado quando todo o país está em campanha eleitoral.
"O
esboço apresentado pelo Ministério da Saúde recentemente viola a nossa
constituição, as nossas leis e políticas nacionais e acordos internacionais que
Timor-Leste se comprometeu a seguir", refere o texto da carta aberta.
Os
signatários pedem mais debates públicos sobre o assunto, alargados para
"incluir as perspetivas de todos os interessados", incluindo
organizações da sociedade civil.
Para
a académica Berta Antonieta, uma das promotoras da carta aberta, "os
grupos religiosos não devem estar envolvidos neste tipo de decisões do Estado",
sendo necessária "uma clara separação entre igreja e Estado".
"O
direito das mulheres de acesso ao planeamento familiar não pode ser determinado
por líderes religiosos. É inaceitável que mulheres não casadas não possam ter
acesso ao planeamento familiar ou que só possam ter se o forem pedir com os
maridos", refere.
A
poucos dias das eleições legislativas, Berta Antonieta, de 25 anos, relembra
aos líderes políticos do país que mais de metade dos eleitores têm menos de 30
anos e que os jovens representam a grande maioria da população.
"Se
querem vencer, não podem ignorar os jovens. Estas políticas, acesso à saúde
sexual e reprodutiva, são questões muito importantes para nós", disse.
"E
há muita gente mais velha que também pensa assim, que diz que argumentos que
são mais moralistas do que sobre saúde pública não podem determinar a
política", referiu.
Os
promotores da carta aberta insistem que "toda a gente tem direito de
acesso ao planeamento familiar, independente da sua idade ou estado
civil", e o direito de escolher "qualquer método de planeamento
familiar" e de poder decidir "livremente, se querem ou não ter
crianças, quantas e quando as querem ter".
Apesar
de Estado timorense ser constitucionalmente laico, o peso social e político da
Igreja católica é particularmente intenso com padres, freiras e outros
religiosos a participarem ativamente na definição de políticas sobre vários
temas sociais, tanto em saúde como educação.
A
Comissão Nacional de Luta Contra a SIDA é liderada por um pastor protestante que
acabou com a recomendação do uso de preservativos, numa das primeiras medidas
adotadas.
A
sua presença nos 'media' nacionais, com um discurso ultra conservador, é
regular com recomendações moralistas contra o que diz ser o "sexo
livre", tendo chegado a considerar que a dança angolana 'quizomba', uma
das mais populares no país asiático, "estraga o futuro dos jovens"
que a praticam.
O
acesso a métodos de planeamento familiar em Timor-Leste continua a ser difícil
e o estigma social associado ao tema impede muitos jovens de serem
adequadamente aconselhados.
Mitos
relacionados com a menstruação ainda são perpetuados no ensino público, a
violência sexual continua a ser bastante prevalente e os direitos das mulheres,
no que toca à sexualidade, continuam a ser ignorados, indicam estudos
realizados no país.
ASP
//EJ
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