Díli,
26 fev (Lusa) -- O ex-primeiro-ministro timorense Xanana Gusmão devolveu hoje a
condecoração com que foi agraciado a 20 de maio do ano passado pelo chefe de
Estado, descontente com os comentários que este proferiu na quinta-feira no
Parlamento.
"A
condecoração foi entregue nos serviços de correspondência do Palácio da
Presidência da República às 14:30 de hoje", confirmou à Lusa fonte do
gabinete de Xanana Gusmão, atual ministro do Planeamento e Investimento
Estratégico.
A
mesma fonte confirmou que a condecoração foi acompanhada de uma carta em que
Xanana Gusmão explica o motivo da devolução, que ocorre 24 horas depois de uma
polémica intervenção do chefe de Estado timorense, Taur Matan Ruak, no
parlamento.
O
Presidente comparou os benefícios que dirigentes do país como Xanana Gusmão e o
secretário-geral da Fretilin, Mari Alkatiri, têm dado a "familiares e
amigos" com práticas do ex-ditador indonésio Suharto.
"Desde
2013, Xanana Gusmão, Mari Alkatiri, Lu-olo [Francisco Guterres, presidente da
Fretilin] usam a unanimidade para quê? Não usam a unanimidade e o entendimento
para resolver todos os assuntos que há por resolver. Usam-na para poder e
privilégio", disse ainda o chefe de Estado.
Na
carta endereçada ao chefe da Casa Civil, e a que a Lusa teve acesso, Xanana
Gusmão explicou que devolve a medalha por considerar que não a merece, pedindo
que seja entregue a outros que a mereçam mais.
"Eu
Xanana Gusmão quero informar sua excelência chefe da Casa Civil que eu não sou
veterano. Porque não fiz o procedimento da Lei dos Combatentes da Libertação
Nacional. Só podem ser considerados veteranos as pessoas que se registaram
e assim obtêm os benefícios previstos na lei", disse.
"Até
à data eu ainda não sinto que mereço e como tal não posso ser considerado
veterano", disse Xanana Gusmão, afirmando ter ficado um pouco nervoso
pela decisão de a medalha lhe ser conferida.
O
ministro timorense disse que foi "obrigado" por muitos a ir receber a
condecoração mas que se sentiu "constrangido" por a receber.
"Assim
gostaria de informar sua excelência que, eu humildemente peço para aceitar o
devolver desta medalha, para a poder entregar a outras pessoas que a merecem
mais", explicou.
"Despeço-me
e peço desculpa por interferir com o seu trabalho", concluiu o ex-primeiro-ministro.
Xanana
Gusmão já hoje, numa intervenção no 1.º Fórum Económico Global da
CPLP, em Díli, fez referência a esse discurso, sem o mencionar diretamente.
"Timor-Leste
foi chamado um país falhado, em 2006, há 10 anos. Acredito que os senhores não
estão alheios ao desenvolvimento atual de política interna do país", disse
o atual ministro do Planeamento e Investimento Estratégico timorense.
"Quero
garantir que não será a segunda vez que a comunidade internacional nos chamará
de Estado falhado ou da possibilidade de Estado falhado", acrescentou.
No
seu primeiro comentário público sobre as declarações, Xanana Gusmão falou aos
empresários presentes em Díli, ironizando com as declarações do Presidente da
República.
"A
minha única experiência em economia é dar contratos aos meus familiares. Uma
profissão que está em voga agora", disse.
Xanana
Gusmão foi condecorado por Taur Matan Ruak a 20 de agosto do ano passado
"pela sua inexcedível liderança na luta da libertação nacional", num
momento que assinalou os 40 anos da criação das Falintil, o braço armado da
resistência timorense.
"Pelo
seu exemplo, em momentos-chave da nossa história, e pela capacidade de
liderança, Xanana Gusmão foi verdadeiramente um pai fundador de
Timor-Leste", disse na altura Taur Matan Ruak.
"A
sua visão - antes e depois da Independência - está na base da política de
reconciliação, paz e estabilidade que o nosso país e o nosso povo adotaram e
implementaram com grande determinação e de coração aberto", afirmou.
ASP
// VM
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