A Constituição da República
Democrática de Timor-Leste (CRDTL), no seu Artigo 13.° (Línguas oficiais e
línguas nacionais), é referido que «O tétum e o português são as línguas
oficiais da República Democrática de Timor-Leste» (ponto 1) e que «o tétum e as
outras línguas nacionais são valorizadas e desenvolvidas pelo Estado» (ponto 2).
Em 1974, quando Timor-Leste
procurava transitar para a independência, não precisou de procurar uma
identidade nacional porque estava unificado pelo uso de duas línguas
complementares, o tétum praça (essencialmente falado), como língua franca
urbana, e uma língua essencialmente escrita, o português, utilizado como língua
de ensino, desde a abertura das primeiras escolas primárias pelos dominicanos,
no século XVII (Fonseca, 2015). De notar que o português começou a ser
utilizado como língua da administração desde o início do século XVIII.
A Constituição da República
Democrática de Timor-Leste (CRDTL), no seu Artigo 13.° (Línguas oficiais e
línguas nacionais), é referido que «O tétum e o português são as línguas
oficiais da República Democrática de Timor-Leste» (ponto 1) e que «o tétum e as
outras línguas nacionais são valorizadas e desenvolvidas pelo Estado» (ponto
2).
Em conformidade com a CRDTL, a
Lei de Bases da Educação (LBE), aprovada pela Lei n.º 14/2008, de 28 de
Outubro, vem definir no seu artigo 8.º que as línguas de ensino do sistema
educativo timorense são o tétum e o português. Assim, a resolução do
Parlamento Nacional n.º 24/2010, de 26 de Outubro, ressalta que a língua tétum
e a língua portuguesa constituem ambas património nacional, e que a língua
portuguesa constitui um fator crucial para o desenvolvimento da língua tétum.
O que dizem os especialistas, os
políticos timorenses e o Parlamento Nacional
A explicação para a opção de duas
línguas oficiais, tétum e português, segundo a opinião de especialistas,
políticos e governantes de Timor-Leste, e com base nas resoluções do Parlamento
Nacional, assenta no facto de haver factores de ordem identitária, histórica,
política, afectiva, científica e pedagógica, entre outros, que ajudam a
fundamentar a necessidade da coexistência das duas línguas oficiais de
Timor-Leste e de se optar pelo português como língua única de ensino, sem
prejuízo de ser utilizado, em casos que facilitem as metodologias didácticas, o
tétum e as línguas nacionais.
Apesar da língua portuguesa não
constituir a língua materna da maioria dos timorenses, e em muitos casos também
não o Tétum, após ter revisitado o estudo intitulado «Processo Educativo na
Educação Pré-Escolar e no 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico. Diagnósitco e
Recomendações» (Ministério da Educação e Cultura, 2018), que será oportunamente
divulgado no Jornal Tornado, na íntegra, aglomerei alguma dessa argumentação
para ajudar a fundamentar a escolha do português como uma das línguas oficias,
como se segue:
i. língua da resistência
O Português sobreviveu como
língua de resistência, sendo utilizada pela FRETILIN e pelas outras
organizações da oposição ao ocupante nas suas comunicações internas e no
contacto para o exterior.
Batoréo, 2010
Ramos-Horta destaca que «apesar
da brutal colonização indonésia e da repressão cultural dos últimos 21 anos, da
proibição de uma língua e cultura que chegaram à nossa região há cerca de 500
anos, em Timor-Leste esta língua secular persiste teimosamente» (Ramos Horta,
1997).
Paulino, 2015
ii. língua da identidade
[O português] funciona como um
elemento de distinção identitária, uma afirmação da diferença.
Almeida, 2011
[O português] é uma língua de
identidade histórica e do presente, válida porque serve de elo de ligação entre
a grande família dos países lusófonos, que oferece ao país uma identidade única
em todo o Sudoeste Asiático.
Almeida, 2011
Sem o português, a identidade do
país rapidamente se dissolveria nas culturas circundantes, indonésia e
australiana. «Se somos um país pequeno, ainda por cima sem recursos, porque não
investimos em ser diferentes?» diz Alkatiri [ex-primeiro ministro] (Moura,
2007).
Batoréo, 2010
Nas palavras de Xanana Gusmão foi
exactamente o facto de falarem o português que determinou o reconhecimento da
ONU da sua diferença cultural do resto da Indonésia e por isso a necessária
tutela no processo de independência: «Somos a metade de uma das 13.000 ilhas da
Indonésia e só somos diferentes porque temos uma cultura diferente, uma identidade
diferente… Nossa língua é o português.» (ou seja, são as línguas portuguesa e
tétum que demarcam claramente o território de Timor-Leste em relação aos seus
países vizinhos (Austrália e Indonésia)).
Tupinambá, 2001
iii. factores históricos /
herança cultural / tradição
A escolha do Português para uma
das LO do país justifica-se, nas palavras de Xanana Gusmão, pelo peso da sua
tradição: «O português é a nossa identidade histórica, que ironicamente nos foi
concedida pela presença colonial».
Batoréo, 2010
O português faz parte da história
e do povo timorense e é um elemento essencial da sua identidade nacional, pois
«o facto de ter sobrevivido à perseguição que lhe foi movida, prova que é parte
da cultura nacional» (Mendes, 2005).
Paulino, 2015
Na verdade, pode-se afirmar que a
política de língua que minimize o lugar e o papel da língua portuguesa em
Timor-Leste não considera a força que canalizou a Resistência Nacional contra a
ocupação: o apego dos timorenses à génese da sua herança cultural.
Resolução do Parlamento Nacional
N.º 20/2011, p. 5133
iv. factores
político-estratégicos
Nas palavras de um político
timorense, Francisco Guterres, presidente da FRETILIN, trata-se de «uma opção
política de natureza estratégica para afirmação da nossa identidade pela
diferença que se impôs ao mundo».
Batoréo, 2010
Por uma decisão
político-estratégica de marcar a identidade nacional timorense diante da
Indonésia e da Austrália e de ressaltar a sua especificidade no contexto
regional do Sudoeste Asiático e Oceânia.
Batoréo, 2010
Neste sentido, o desafio,
consagrado constitucionalmente em 2002, de adotar o tétum e o português como
Língua Oficial, apesar de o tétum ter sido até então uma língua franca
sobretudo falada e de o português ter sido, entretanto, reduzido a 5% da
população, não foi mais do que o corolário da consolidação da identidade
cultural e política de Timor-Leste, antes e durante a ocupação, e da sua
afirmação pela diferença, que sempre existiu, em relação à outra metade da ilha
e às ilhas vizinhas.
Resolução do Parlamento Nacional
N.º 20/2011, p. 5133
v. instrumento administrativo,
religioso e cultural
O Português mantém-se, ainda
hoje, como a língua da escrita, da religião, da escola e da escolarização, da
administração (parcial) e da cultura.
Batoréo, 2010
vi. simbolismo / afectividade
Segundo estudiosos da área, o
Português goza de uma forte carga simbólica e de uma grande afectividade, rara
noutros países em relação a uma antiga língua colonial, constituindo «cimento
aglutinador da identidade cultural entre os povos do Timor Oriental» (Thomaz,
1998: 648) e «cordão umbilical que articula as culturas locais» (Thomaz, 2002:
140).
Batoréo, 2010
(…) esta afectividade traduz-se,
por exemplo, a nível onomástico: calcula-se que, ainda hoje, 70% dos apelidos e
98 % dos nomes próprios são portugueses» (Carvalho, 2002: 71).
Batoréo, 2010
vii. valorização e
desenvolvimento do tétum
Nas palavras do [antigo]
presidente de Timor [José Ramos-Horta]: «A língua portuguesa é fundamental para
a nossa identidade. O próprio tétum, para se desenvolver, precisa do português.
Alimenta-se dele.» (Moura, 2007: 2).
Batoréo, 2009
(…) parceiro histórico na
evolução do Tétum moderno (…).
Batoréo, 2010
As perspectivas para a
sobrevivência e o desenvolvimento do tétum são mais animadoras num contexto de
relação contínua com o português, que é a sua fonte tradicional para a
ampliação e a renovação do léxico.
Hull, 2001
(…) a aparência de uma imediata
vantagem para o tétum e para outros vernáculos no português ter um prestígio
menor do que tem o inglês. Este facto faz com que o português não vá constituir
uma ameaça para a ordem linguística tradicional.
Hull, 2001
Os timorenses escolheram o
português como a sua Língua Oficial em vez do inglês, porque, dizia Gunn
(2001), o Tétum, para sobreviver, precisa do português e o sistema de
valorização é essencial e inalienável para os timorenses definirem a sua
identidade nacional, de modo que as línguas coexistem num relacionamento
mutuamente benéfico, sendo o português o suporte natural do tétum no seu
desenvolvimento continuado. (Mendes, 2005, p. 234).
Paulino, 2015
viii. semelhanças entre o
português e o tétum
O português tem também a vantagem
de que o tétum (língua franca) não seja formalmente muito afastado do português
na sua pronúncia, gramática e vocabulário. O português não é um idioma
demasiado difícil para os timorenses pois estes já possuem um relativo
conhecimento passivo do português devido ao facto de que já falam o tétum-Díli.
O mesmo já não se poderia dizer da relação entre o tétum e o inglês.
Hull, 2001
Conforme sintetiza Costa (2012),
a propósito da escolha das Línguas oficiais de Timor-Leste:
[…] o povo timorense, através dos
seus legítimos representantes, escolheu o tétum e o português como suas Línguas
oficiais. A escolha da língua portuguesa contabiliza: um peso simbólico (por
ser língua de resistência à invasão indonésia, língua usada para dar
informações ao mundo sobre a luta e os efeitos da invasão), um aspecto
identitário (o do seu passado sem grandes imposições, sem grande impacto), um
aspecto afectivo (ligação ao catolicismo, igreja que em conflitos de guerra –
segunda guerra mundial, invasão indonésia – nunca abandonou o povo) e um
aspecto geoestratégico (Timor confinado à Indonésia e à Austrália).
A escolha da língua tétum
constitui, por um lado, a assunção do compromisso de defesa, desenvolvimento e
promoção de uma língua em situação altamente desfavorecida.
Costa, 2012, p. 215, citado por
Carvalho in Guedes et al., 2015