Malaca,
15 dez (Lusa) -- Os descendentes de portugueses em Malaca (Malásia), uma
comunidade iniciada com a conquista da região por Afonso de Albuquerque em
1511, herdaram do conquistador do Oriente a lealdade a Portugal, país que nunca
conheceram.
Afonso
de Albuquerque, que morreu há exatamente 500 anos, ficou conhecido não apenas
pelas suas conquistas e pela sua visão estratégica essencial na manutenção do
império português no Oriente, mas também pela sua lealdade ao país e ao rei.
"Nós
queremos ser portugueses", justificou Christopher De Mello, um dos
promotores da herança de Portugal naquele canto do mundo. E dá m exemplo
quotidiano que é visível nas ruas de Malaca: aqueles que se afirmam
descendentes de portugueses continuam a cumprimentar-se com dois beijos, uma
saudação que não é vulgar na Malásia.
"Não
queremos saber do país, se é rico ou pobre, não interessa", diz,
referindo-se a Portugal. "O mais importante é quem somos. Isso é a riqueza
que temos em nós", acrescenta.
No
bairro dos portugueses, o idioma está a perder espaço para o inglês, num país
onde o malaio é a língua oficial, mas o orgulho em ser português é passado de
geração em geração através da música e dos costumes.
Para
Joseph Sta Maria, representante das minorias junto da administração de Malaca,
a lealdade a Portugal é uma herança de Afonso de Albuquerque, embora não tenha
a ver com patriotismo, mas com uma ligação cultural.
"Nós
nunca morremos, nós somos portugueses. Amamos os portugueses, ainda que eles não
tenham feito assim muito [por nós]. É a afinidade e o orgulho de nos chamarmos
portugueses", vincou, reconhecendo ainda que "Portugal tem os seus
próprios problemas" e está "muito longe de Malaca".
"Repare
para o quanto os portugueses fizeram por Timor-Leste. Foram 450 anos de
administração e quando eles devolveram Timor-Leste, o país estava em ruínas,
logo, eu não espero que Portugal faça muito [pelos portugueses de
Malaca]", diz.
A
visão que os portugueses de Malaca têm de Portugal é muito própria e, ainda que
exista um desejo de um contacto maior com os portugueses de Portugal e o sonho
de visitar terras lusas, há também um orgulho em manter a portugalidade
específica de Malaca.
A
língua portuguesa é preterida em relação ao idioma local conhecido como kristang
(cristão-português), que mistura português antigo com malaio, e as músicas e
danças de folclore também não são para adequar ao Portugal de hoje.
Joseph
Sta Maria, autor do livro "Pessoas proeminentes na Comunidade Portuguesa
em Malaca", acredita que o seu povo nunca irá desaparecer, a menos que o
'Portuguese Settlement', o bairro onde residem, seja destruído.
Também
a religião católica "mantém-nos unidos", destacou, defendendo que
para quem não é católico, é difícil fazer parte da comunidade, porque tem de
celebrar o Natal, o São Pedro ou o São João".
O
forte catolicismo leva Christopher De Mello a pedir a Portugal "um padre
português, talvez reformado, para viver connosco no 'Portuguese Settlement' e
para ensinar-nos", porque há poucos presbíteros na Malásia, país de
maioria muçulmana.
O
padre Michael Mannayagam, de origem indiana, é um dos sacerdotes da região que
se desdobra em celebrações numa cidade com "cerca de 20000
católicos", sobretudo de origem chinesa e indiana, dado que os portugueses
não representam mais do que mil.
O
presbítero considera que a expansão do catolicismo através dos portugueses não
foi muito notória na região, já na altura maioritariamente muçulmana, mas
destaca a resistência dos católicos durante as perseguições holandesas.
"
Alguns fugiram da cidade. Dispersaram-se por aqui e ali. Mantinham-se
clandestinos e onde houvesse um padre, eles teriam uma missa", recordou.
Na
visão de alguns malaios, disse Christopher De Mello, o povo português adora
beber e, tendo dinheiro ou não, sabe divertir-se e "celebra um Natal muito
bonito", convidando toda a gente a participar e oferecendo comida e bebida
nas suas casas.
"Na
verdade, os malaios admiram-nos e também têm inveja de nós, porque tudo o que
fazemos na Malaca é diversão, é festa, é prazer, mas algumas coisas são
muitíssimo sensíveis para nós falarmos aqui", referiu.
ANYN
// PJA