M.Azancot de Menezes*, opinião
O
Parlamento Nacional aprovou a proposta de lei nº 22/III (3ª), segunda alteração
à lei nº 5/2006, de 28 de Dezembro (Órgãos de Administração Eleitoral). A
aprovação desta lei é um verdadeiro escândalo nacional que deve ser denunciado
em Timor-Leste e em todo o mundo porque esta nova lei tem como objectivo
encapotado a interrupção do actual mandato da CNE - Comissão Nacional de
Eleições (2013/2019), e a expulsão dos seus comissários, note-se, antes das
eleições, violando princípios fundamentais da Constituição da República
Democrática de Timor-Leste (RDTL), senão, vejamos:
Em
conformidade com a lei anterior sobre Órgãos de Administração Eleitoral (Artigo
6º - Estatuto), e que se mantém na lei ora aprovada, “Os membros da CNE são
inamovíveis e independentes no exercício do mandato...”;
De
acordo com a lei anterior sobre Órgãos de Administração Eleitoral (Artigo 4º -
Atribuições genéricas), e que se mantém na lei ora aprovada, “A CNE é
independente de quaisquer órgãos do poder político, central ou local e goza de
autonomia financeira, administrativa e organizativa”;
Ora,
sem qualquer tipo de explicação ao povo timorense, as eleições estão
sucessivamente a ser adiadas, o que levanta forte suspeição (!), tudo indica,
para que a apresentação do novo calendário eleitoral por parte do Secretariado
Técnico Eleitoral (STAE), órgão que já é dependente do governo seja, por sua
vez, apresentado a uma nova Comissão Nacional de Eleições com um presidente
indicado pelo actual Parlamento Nacional (exigência da nova lei!), não eleito
pela CNE, o que tornaria a nova CNE dependente, violando o Ponto 6 do artigo
65º da Constituição da RDTL;
Considerando
estes aspectos referidos e atendendo a que nos termos da Constituição da
República Democrática de Timor-Leste (RDTL):
“Os
órgãos eleitos de soberania e do poder local são escolhidos através de
eleições, mediante sufrágio universal, livre, directo, secreto, pessoal e
periódico” (Ponto 1 do Artigo 65º) e o “sufrágio periódico” não está
(premeditadamente) a ser cumprido porque antes se pretende expulsar os actuais
comissários da CNE, ou seja, se o sufrágio não é periódico, há uma clara
violação da Constituição da RDTL;
“A
supervisão do recenseamento e dos actos eleitorais cabe a um órgão
independente, cujas competências, composição, organização e funcionamento são
fixados por lei” (Ponto 6 do Artigo 65º), o que deixará de acontecer porque na
nova lei (Ponto 3 do Artigo 5º) defende-se que “O Parlamento Nacional elege o
presidente da Comissão Nacional de Eleições, de entre os seus membros, por
maioria absoluta dos deputados em efectividade de funções”, portanto, o
presidente da CNE deixaria de ser independente;
Considerando
que a actual Comissão Nacional de Eleições (CNE) é independente porque o
presidente foi eleito pelos actuais comissários e é representativa, porquanto,
na sua composição, há representantes de todos os órgãos de soberania, da igreja
católica e de outras confissões religiosas, e das mulheres, e a nova lei não
prevê esta representatividade;
E
considerando ainda que a postura da CNE tem sido irrepreensível sob o ponto de
vista da ética e das boas práticas, tem a confiança dos chefes de Suco e
Aldeias de todo o território nacional como uma entidade independente, séria e
isenta, durante o mandato afirmou-se nacionalmente com actividades de educação
cívica, entre outras, e internacionalmente, com parcerias já concretizadas e
outras em curso com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), com a
Asian Network for Free Elections (ANFREL), assim como, com a Associação dos
Órgão Eleitorais do Mundo (A-WEB / Association of World Election Bodies),
havendo compromissos internacionais assumidos e outros em curso.
Por
tudo o que aqui acabo de explicar, não há razões racionais, nem objectivas, e
muito menos previstas na lei e na Constituição da RDTL que justifiquem a
interrupção abrupta do mandato legal da CNE (2013/2019).
A
decisão tomada pelo Parlamento Nacional é uma vergonha, só é possível num
Estado que não seja democrático, não dignifica a imagem de Timor-Leste em
termos internacionais e coloca em causa a estabilidade necessária a todo o
processo eleitoral havendo mesmo o risco das próximas eleições serem
irregulares, pelo que, impõe-se o veto a esta lei por parte de Sua Excelência
Presidente da República da RDTL, Senhor Taur Matan Ruak, e a condenação
enérgica da comunidade internacional.
*M.
Azancot de Menezes é Secretário-Geral do PST (Timor-Leste)
- em Página Global