Brasília,
30 out (Lusa) - O analista brasileiro Carlos Henrique Cardim considerou que o
Brasil, maior país da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) que vai
assumir a presidência do grupo até 2018, "não tem dado a prioridade que
merece" a organização.
O
professor da Universidade de Brasília (UNB) e também diplomata, mas que falou à
agência Lusa como independente, defendeu que "o Brasil deveria dar maior
prioridade conceptual e operacional à CPLP".
Segundo
Carlos Henrique Cardim, que já dirigiu o Instituto de Pesquisa de Relações
Internacionais (IPRI), ligado à diplomacia brasileira, "é
impressionante" que existam vários grupos atuando em "quase todas as
áreas científicas, tecnológicas, culturais", mas "outra coisa é a
prioridade do Governo".
O
diplomata destacou a "adesão muito grande", pelo menos a Portugal,
entre "diplomatas, intelectuais e políticos inclusive" no Brasil,
acrescentando que, na CPLP, quer se queira quer não, "há um eixo
fundamental", entre Brasil e Portugal, "como em toda as comunidades
deste tipo", como o eixo na União Europeia, entre França e Alemanha.
"Portugal
está realmente priorizando e investindo" na CPLP, enquanto na relação do
Brasil com o grupo "há momentos e depois esquecimentos", avaliou.
A
propósito da cimeira de chefes de Estado e de Governo da CPLP, que se realiza
na segunda e na terça-feira em Brasília, que ditará o início da presidência
brasileira, Carlos Henrique Cardim afirmou esperar que esta presidência
"dê mais estabilidade à prioridade da CPLP" uma vez que falta ao
Brasil "continuidade nessa estabilidade e engajamento institucional com
recursos".
Nessa
esfera, o diplomata propôs uma valorização sobretudo das áreas da educação e da
cultura, mas também da ciência e da tecnologia.
O
novo Presidente brasileiro, Michel Temer, "é um professor universitário e
um homem da cultura", destacou.
Questionado
sobre a aposta económica que a comunidade deverá assumir na cimeira, o
diplomata disse "concordar plenamente", mas vincou que
"comunidades deste tipo deveriam priorizar mais a cultura e a
educação" para depois chegar à economia.
Neste
sentido, lembrou as palavras de Jean Monnet, fundador da União Europeia, de
que, se pudesse reiniciar a UE, apostaria na cultura e não na economia.
"Quem
tem visão estratégica do mundo sabe da importância das comunidades
linguísticas. Você tem aí não somente um instrumento de comunicação, mas um
instrumento de visão do mundo, de sentimento, de perceção da realidade, que é
dado através da língua de uma maneira muito subtil", vincou.
Carlos
Henrique Cardim defendeu a difusão da literatura lusófona nos países da CPLP, a
facilitação de acessos a textos de autores lusófonos em livrarias e numa biblioteca
digital internacional de língua portuguesa, programas televisivos semanais
sobre os países da CPLP e até a criação da "disciplina da história da
comunidade da língua portuguesa" em escolas e universidades.
O
investigador organizou, juntamente com João Batista Cruz, o livro "CPLP:
Oportunidades e Perspetivas", que resultou de um seminário sobre a CPLP em
Brasília, em 2002, altura em que já se assinalava o défice de informação sobre
a organização.
Passados
14 anos, o analista ainda entende que "há um défice", dando o exemplo
dos seus alunos na universidade, que "não têm muita ideia da CPLP".
A
CPLP, que comemora este ano 20 anos, reúne Angola, Brasil, Cabo Verde,
Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e
Timor-Leste.
ANYN
// VM
Brasil
recusa apurar violações de direitos humanos na Guiné Equatorial
Brasília,
30 out (Lusa) - O Brasil, que vai assumir a presidência rotativa da Comunidade
dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), rejeita que a organização averigue
alegadas violações de direitos humanos na Guiné Equatorial para confirmar se o
país cumpre os estatutos.
O
conselheiro Paulo André Moraes de Lima, chefe da coordenação-geral da CPLP do
Ministério das Relações Exteriores brasileiro, respondeu à agência Lusa que
"o Brasil acredita que há dentro do sistema internacional de direitos
humanos instâncias com competência para isso [monitorização da situação de
respeito pelos direitos humanos no país]".
Recentemente,
as organizações Conectas Direitos Humanos, brasileira, e EG Justice,
norte-americana, exortaram os restantes países da CPLP a fazerem uma
investigação 'in loco' sobre as violações de direitos humanos na Guiné
Equatorial e a "tomar medidas decisivas".
Desde
que o país entrou formalmente para a CPLP, em julho de 2014, a situação dos
direitos humanos "piorou", desde logo, com a pena de morte ainda a
vigorar no país, apesar de essa ter sido uma das condições para aderir ao bloco
lusófono, alertaram as organizações.
O
diplomata Moraes de Lima lembrou que o Brasil sempre acreditou que
"promove mais e melhores mudanças pela inclusão", daí que o país se
tenha juntado ao bloco de países africanos que "eram muito
entusiastas" da adesão do país africano à CPLP, ao contrário de Portugal.
"O
facto de a Guine Equatorial estar dentro da CPLP ajuda a que possamos
efetivamente influir, agora influir não significa interferir", explicou,
lembrando o princípio da CPLP de não-ingerência nos assuntos internos de cada
país.
Confrontado
com o caso da Guiné-Bissau, o diplomata lembrou que "há uma demanda do
Governo" - que reconhece que "há uma crise interna e uma situação de
instabilidade" - para que "a CPLP esteja presente e contribua",
bem como outras entidades, "sempre em coordenação com o Governo".
A
Guiné Equatorial tornou-se, a 23 de julho de 2014, o nono país a ser admitido
como Estado-membro da CPLP, juntando-se assim a Angola, Brasil, Cabo Verde,
Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Na
altura, o executivo brasileiro foi acusado de considerar apenas interesses
económicos e estratégicos.
O
facto de o Brasil importar petróleo e gás da Guiné Equatorial e de grandes
construtoras estarem presentes naquele país eram apontados por analistas como
as principais razões por trás do patrocínio brasileiro.
Estender
a influência brasileira no mundo e procurar mais um voto para o Brasil entrar
para o Conselho de Segurança das Nações Unidas eram outros motivos referidos.
Em
julho último, para assinalar o segundo aniversário da adesão, o Presidente brasileiro,
Michel Temer, respondeu à Lusa ser prematuro fazer um balanço dos dois anos,
acrescentando: "Creio que teremos de trabalhar por uma dinâmica
construtiva, lastreada nos nossos interesses e nos nossos valores".
ANYN
// VM