Jacarta,
04 dez (Lusa) -- O ex-líder das milícias pró-Indonésia Aitarak, Eurico
Guterres, acusa Portugal de ter "roubado" os timorenses durante 450
anos de colonização, e o regresso em 1999 visou branquear a imagem deixada
"com a forma irresponsável" como saiu em 1975.
"Portugal
colonizou o povo de Timor-Leste durante 450 anos. O que é que Portugal fez?
Nada!", acusou o ex-guerrilheiro, em entrevista à agência Lusa,
considerando que "o que Portugal fez foi roubar os direitos do povo"
e, depois, "em 1975, Portugal, de forma irresponsável, deixou a população
de Timor-Leste".
"Esse
é o erro, pecado cometido por Portugal, que não pode ser aceite, mesmo quando
eles regressaram a Timor-Leste, em 1999, como se fossem anjos",
considerou.
O
timorense, agora com nacionalidade indonésia, referia-se ao atribulado processo
da descolonização portuguesa, que criou instabilidade no território e que levou
a uma guerra civil entre a Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente
(Fretilin) e a União Democrática Timorense (UDT).
O
conflito e a saída dos portugueses abriram portas a um período de 24 anos de
ocupação indonésia, que ficou marcado por cerca de 100 mil mortes entre civis
timorenses e por muitas memórias de violações, torturas e fome.
Em
entrevista ao jornal australiano Sydney Morning Herald em 2007, Eurico Guterres
além de responsabilizar Lisboa, atribuiu igualmente responsabilidades a Jacarta
e às Nações Unidas pela violência registada em Timor-Leste em 1999, ao
permitirem o referendo da independência sem garantia prévia de condições de
segurança.
Na
entrevista à Lusa, Eurico Guterres, principal rosto da campanha violenta contra
os independentistas timorenses em 1999, disse que "a Indonésia entrou em
Timor-Leste não por sua própria vontade, mas pelo desejo de uma parte do povo de
Timor-Leste que via a integração na Indonésia como um compromisso para acabar
com a guerra civil criada por Portugal".
A
invasão indonésia, acrescentou, ocorreu "também devido ao incentivo da
comunidade internacional, em particular dos Estados Unidos e da Austrália, que
estavam preocupados com o avanço da ideologia comunista" em Timor-Leste.
"Por
isso, a Indonésia, na verdade, entrou em Timor-Leste com uma missão nobre, que
deve ser valorizada", defendeu.
Contudo,
"infelizmente, houve generais do exército indonésio que, deliberadamente,
aproveitaram a integração de Timor-Leste com a Indonésia para o seu interesse
pessoal, da sua família ou do seu grupo ao cometerem atos que, depois,
mancharam o bom nome da Indonésia aos olhos da comunidade internacional", continuou,
mas sem precisar nomes.
Eurico
Guterres ficou órfão depois de militares indonésios matarem o seu pai, nos
primeiros anos da ocupação.
Ligado
à resistência timorense, Guterres conta que foi detido em 1989 porque as forças
indonésias descobriram que estava envolvido num plano para assassinar o
Presidente Suharto durante a visita a Díli.
Prabowo
Subianto, o genro de Suharto que desempenhou várias missões em Timor-Leste,
colocou Eurico Guterres na senda de agente duplo e, depois, de fiel servidor
dos indonésios no território.
O
ex-líder da milícia Aitarak foi a única pessoa que esteve detida devido à
violência que se seguiu ao referendo de 1999 e que fez mil mortos, mas volvidos
dois anos o Supremo Tribunal da Indonésia absolveu-o por falta de provas.
"Não
me arrependo do que eu fiz, porque naquela época eu também estava a lutar pela
independência do povo de Timor Leste, mas pela via da autonomia, porque, na
minha opinião, a autonomia é o mesmo que a independência", confessa.
A
via da autonomia teria dado "tempo suficiente para preparar a
independência de Timor-Leste com base na vontade coletiva do povo de
Timor-Leste, não baseada na vontade de um indivíduo, de uma determinada família
ou de um certo grupo, como é agora", acrescentou, mais uma vez sem precisar.
Eurico
Guterres, que tem estado envolvido na política indonésia, afirmou ainda que não
tem receio de regressar à sua terra natal, mas simplesmente não deseja fazê-lo.
ANYN
// EL