A
Renascença foi à procura do xadrez mental do clássico. Qual é a equipa mais
forte psicologicamente? Que jogadores aguentam melhor a pressão? E pior? As
tácticas e as análises de dois especialistas em Psicologia do Desporto. O
campeonato nacional também se ganhará com a cabeça.
João
Carlos Malta
Provavelmente
serão os golos de Jackson Martinez ou de Jonas a decidir o clássico do
título. Será o génio de Gaitán ou de Quaresma a fazer a diferença. Mas o jogo
não se resume à técnica. A parte mental pode ser decisiva quando duas equipas
de valor semelhante estão frente-a-frente ou pelo menos fazer “aquela” pequena
diferença.
Fomos à procura dos pontos fracos e fortes de dragões e águias, e procurar
pistas sobre qual será o gigante que estará mais próximo de tombar no próximo
domingo.
Ser melhor psicologicamente não vence jogos por si, mas que ajuda, ajuda. Vamos
então deitar Benfica e Porto no divã e deixar que Tomaz Morais, especialista em
aconselhamento desportivo e ex-selecionador de râguebi, e Jorge Silvério,
mestre em Psicologia do Desporto, fazer o seu trabalho: a análise.
Quem é mais forte psicologicamente?
A resposta é de tripla para Jorge Silvério. Ainda assim uma pequena vantagem
para quem privilegiou a estabilidade. “No Benfica há um treinador que está há
muitas épocas no clube, temos jogadores muito experientes que já tiveram
vantagem no campeonato e perderam, mas que também já ganharam. Olhando para o
factor estrutural haverá mais vantagem do Benfica”, sublinha o mestre em
Psicologia do Desporto.
A
força psicológica do FC Porto foi testada este ano na Madeira, no jogo com o
Nacional, depois de o Benfica ter sido derrotado em Vila do Conde pelo Rio Ave.
O resultado surpreendeu todos: “Outro Porto com jogadores da formação, como era
normal antes, não deixaria escapar aquela oportunidade”. Silvério diz que há
muitos jogadores novos que ainda não perceberam inteiramente “o que é o FC
Porto”. Portanto, ligeira vantagem para os encarnados.
Tomaz
Morais pega na caneta e põe um “x”. Empate no braço-de-ferro psicológico. “O
Benfica jogando em casa com menos sobrecarga nos últimos tempos, e só com este
jogo, parece-me que do ponto de vista mental pode estar a preparar-se melhor”,
diz primeiro. Mas? “O Porto sabe que o jogo é de tudo ou nada e vem de uma derrota
difícil. O regresso do Alex Sandro e do Danilo pode ajudar”, acrescenta.
Efeito
de Munique
Não há panos quentes aqui. Uma derrota de 6-1 é sempre uma derrota de 6-1. Terá
influência. Ainda assim, é Silvério que lhe dá mais relevo.
Para
o professor universitário não há botões de “on” e “off”. Os primeiros minutos
poderão ser jogados sobre brasas pelos azuis. “Se começa a correr mal e se
sofrem um golo cedo, pode vir o fantasma e a recordação do jogo de Munique”,
lembra. Para Silvério cabe ao Benfica “potenciar e aproveitar esta fragilidade
que foi criada por este resultado”.
Tomaz
desvaloriza. Diz que uma derrota pesada deixa marcas, mas “na segunda parte [na
Alemanha] já houve reacção”.
Para
os da Luz, os seis de Munique terão efeito zero. “Os jogadores do Benfica têm
demasiados quilómetros nas pernas e na cabeça para se preocuparem com essas
coisas. Estão preocupados é como o Porto se poderá posicionar em campo”,
defende o perito em aconselhamento desportivo.
Como
é que se eleva a moral? A prática
Quais são os truques usados para fazer com que o jogador puxe tudo o que tem
dentro de si e canalize as forças no jogo? Ou melhor, aquilo que o adepto
percebe melhor, como é que se faz com que “ele vá a todas”?
Tomaz
Morais dá o exemplo do trabalho com imagens. “Play” no vídeo e vamos à
motivação. Táctica simples: valorizar o que temos de melhor e encontrar os
pontos fracos dos adversários para atacar.
“Faz-se
uma auto-análise a cada jogador e podemos fazê-lo sentir que ele está muito
bem, está forte. Podemos ainda fazer ver onde estarão as fragilidades do
adversário”, resume. O resultado deste jogo psicológico é o de aumentar a
autoconfiança.
Morais
aconselha ainda a não “mudar a rotina”. Porquê? “Aumenta a ansiedade e a
ansiedade leva a cometer erros. O melhor é não alterar nada”, sublinha.
O
desempenho psicológico ganha um jogo?
Silvério joga ao ataque. Admite ser suspeito. É o seu “métier”. Mas avança: “A
equipa que controlar melhor as suas emoções, que for capaz de ser tenaz e jogar
melhor com aquilo que o jogo lhe for dando [está mais próxima de ganhar]”.
E
balanceia a resposta com o lado empírico. Tripartindo os factores em jogo:
físico, técnico e psicológico. Os atletas e os treinadores enfatizam a
importância da cabeça estar a 100%.
Morais
aposta numa resposta em contenção. “Não ganha, mas repare, o corpo só está
forte quando a cabeça está forte. Tudo o que se faz do ponto de vista técnico e
táctico tem a parte mental incluída”, sublinha.
Os
jogadores mais fortes e mais fracos?
As dificuldades de escolha foi nos “menos”. Os “mais” estavam na ponta da
língua.
As
escolhas de Tomaz Morais: Jackson do Porto e Jonas do Benfica são os ases de
trunfo. O colombiano “não treme”, qualquer que seja o ambiente ou o jogo.
Desempenho sempre em níveis altíssimos. Jonas, diz, vai pelo mesmo caminho. Mas
este jogo será um teste. “A minha expectativa é ver se no jogo com o Porto
consegue manter o nível de facturação e se consegue evidenciar o controlo
emocional como até aqui”, define.
Este
especialista vacila um pouco em apontar dois nomes para “duques”. Ainda assim,
e frisando que são jogadores fortes mentalmente, nomeia Quaresma e Maxi
Pereira. O primeiro, porque o virtuosismo o faz ir do oito ao 80.
“Pode fazer um jogo fantástico ou não existir”, sintetiza.
O
encarnado ferve em pouca água. Baseia o jogo em duelos individuais e muitas
vezes a emoção fá-lo perder o controlo. Pode por aí gerar desiquilibrios.
Silvério
diz que não vai falar das debilidades. Centra-se nos pontos fortes. Luisão na
berlinda. Tomaz também já o tinha referido. “É o capitão e um referencial
de estabilidade”, refere. Do outro lado do tabuleiro, a escolha recai em
Helton. “Pelas mesmíssimas razões”.
"Mind
Games". Quem é melhor? Jesus ou Lopetegui?
Não há Mourinho, a análise do “bate boca pré-jogo” fica mais cinzenta. Logo dá
empate. Não será um zero a zero, porque ambos os treinadores arriscam sempre
nas conferências de imprensa.
Ainda
assim, Silvério e Morais são unânimes. Tanto Jesus como Lopetegui trabalham bem
a área. Apenas um reparo. Às vezes, os tiros de "JJ" saem-lhe
pelo sítio menos favorável, a colatra.
E
depois do clássico? 1x2
1-Se o Benfica ganhar não há quase espaço para dúvidas, conquistará o 34º
título nacional.
“É
uma vantagem de seis pontos e do outro lado haverá uma reacção de desânimo. Serão
duas derrotas seguidas e passa a ser muito difícil atingir os objectivos da
época”, atira Jorge Silvério.
“O
Benfica fica com uma margem boa. Não estou a ver como poderá deixar fugir este
campeonato. Ainda há um ou outro jogo com alguma intensidade”, chuta Tomaz
Morais. “Duas derrotas desanimará em muito o Porto”, recarga.
X- Tudo
em aberto. Mas
a vantagem permanece do lado do Benfica. No entanto, o passado mostra que três
pontos de vantagem para o Benfica e quatro jornadas para jogar não são
sinónimo de título. A história, segundo diz o povo, não se repete. Mas deixa
avisos.
“Há
mais vantagem para o Benfica apesar de tudo. Mantém a vantagem pontual e ganhou
no Estádio do Dragão”, lembra Silvério.
2- Se o FC Porto ganhar, então o passado cairá nos ombros do Benfica
com o peso brutal de um fantasma.
Assombração?
“Se o Porto ganhar será o ressuscitar do fantasma de algumas épocas em que
tinham uma vantagem grande, mas perderam o campeonato”, finaliza Jorge Silvério.