Díli, 24 abr 2019 (Lusa) -- O
ex-Presidente timorense José Ramos-Horta disse hoje que os recentes ataques
terroristas no Sri Lanka são sinal do extremismo violento na Ásia onde ameaças
e ataques a minorias étnicas e religiosas continuam a ser demasiado frequentes.
"Ameaças e ataques contra
minorias étnicas e religiosas são demasiado frequentes na Ásia, inclusive no
sudeste da Ásia. Muitas vezes são alimentados através das redes sociais por
atores religiosos e políticos irresponsáveis ou por grupos marginais que
incendeiam paixões, raiva e violência", afirmou em Díli.
Numa intervenção num encontro
regional sobre diplomacia preventiva e alerta precoce, o Prémio Nobel da Paz
disse que a decisão extraordinária do Sri Lanka de bloquear as redes sociais
depois dos atentados, "reflete a crescente preocupação global,
particularmente entre os governos, sobre a capacidade das redes de propriedade
norte-americana de gerar violência".
O ex-chefe de Estado referia-se
aos oito atentados bombistas no domingo passado que mataram, pelo menos,
359 pessoas e provocaram mais de 500 feridos, tendo, segundo a polícia
sido detidos já 58 suspeitos.
As autoridades atribuíram os
ataques a um grupo extremista islâmico local, o National Thowheeth Jama'ath,
embora considerem que o grupo teve apoio internacional.
Numa das medidas anunciadas
imediatamente depois dos ataques, as autoridades do Sri Lanka bloquearam os
acessos a redes sociais como o Facebook e o Whattsapp.
Ramos-Horta sublinhou que antes
das redes sociais, os "líderes políticos, comunitários e religiosos
irresponsáveis faziam uso de uma ferramenta mais básica, mas eficaz e
disponível, o rádio, para disseminar a desinformação e as mentiras descaradas,
alimentando medos e violência".
Exemplos disso, referiu, são o
genocídio de 1994 no Ruanda e os conflitos na Bósnia, "tragédias causadas
em parte pelo uso deliberado de ferramentas de comunicação".
Contudo, sustentou, se uma
estação de rádio que esteja a "transmitir mensagens de ódio e
violência" pode ser fechada facilmente, "é muito mais difícil para os
governos adotarem leis que regulem as redes sociais e que garantam que os seus
proprietários estrangeiros, que lucram com elas, e os utilizadores locais são
responsáveis pelas suas ações".
José Ramos-Horta falava em Díli
na abertura de um encontro do Fórum Regional da Associação de Nações do Sudeste
Asiático (ASEAN) sobre sobre o papel da diplomacia preventiva e de alertas
prévios na resolução de conflitos, copresidido por Timor-Leste, Indonésia,
Estados Unidos e Nova Zelândia.
O encontro de três dias tem como
objetivo "aprofundar e melhorar a compreensão dos princípios da diplomacia
preventiva" e "explorar formas sobre como a ASEAN pode reforçar a
capacidade de impedir a escalada dos conflitos regionais através da implantação
de mecanismos de alerta precoce e de resposta antecipada".
O ex-Presidente timorense disse
que na era das redes sociais "um conflito pode ser instantaneamente aceso
com a publicação de rumores falsos e incendiários por seguidores de um
determinado grupo étnico ou religioso baseado em qualquer lugar" do mundo
e que pretendem "instigar tensões e conflitos no seu próprio país ou
noutro país".
"O Facebook e veículos de
comunicação similares são facilitadores críticos da crescente onda de racismo e
xenofobia, pois fornecem plataformas desimpedidas para demagogos e extremistas
para recrutar, instigar e realizar ataques terroristas", sublinhou.
Daí que, afirmou, é importante
rever os mecanismos internacionais e regionais existentes sobre prevenção de
conflitos e resolução de conflitos, em especial porque podem não conseguir
responder adequadamente a novos focos de tensão e conflito.
Até aqui, destacou, esses
mecanismos "giram em torno das causas tradicionais de conflito,
nomeadamente, disparidades sociais, desemprego, pobreza extrema, perceção e
ressentimento em relação a discriminação ou exclusão real ou percebida,
conflitos étnicos ou tribais, conflitos sobre fronteiras e recursos, conflitos
resultantes de rivalidades regionais", entre outros.
"As Nações Unidas e as
instituições multilaterais, como a UE, OSCE [Organização para a Segurança e
Cooperação na Europa], UA [União Africana], OEA [Organização dos Estados
Americanos], Liga dos Estados Árabes e ASEAN, têm ampla experiência e, por
vezes, empregam recursos significativos na resolução de conflitos entre
Estados. Mas a gama de conflitos intra-estatais e a sua natureza sensível
dificultam as tentativas de prevenção e mediação por fóruns regionais e
extra-regionais", frisou.
Na reunião que decorre em Díli
até sexta-feira participam representantes dos membros do Fórum Regional da
ASEAN, nomeadamente a Austrália, Bangladesh, Brunei, Camboja, Canada, China,
Coreia do Sul, Coreia do Norte, Estados Unidos, Índia, Indonésia, Japão, Laos,
Malásia, Mongólia, Myanmar, Nova Zelândia, Paquistão, Papua Nova Guiné,
Filipinas, Rússia, Singapura, Sri Lanka, Tailândia, Timor-Leste, União Europeia
e Vietname.
O encontro conta ainda com
representantes do Instituto da ASEAN para a Paz e Reconciliação e do Grupo de
Pessoas Eminentes, de instituições e organizações nacionais e regionais
envolvidas no alerta precoce e na paz e segurança, bem como daquelas que
trabalham com mulheres, jovens e populações minoritárias.
ASP // JMC