Díli, 29 abr 2019 (Lusa) --
Xanana Gusmão pediu aos militantes do Congresso Nacional da Reconstrução
Timorense (CNRT), maior força política da coligação do Governo timorense, uma
reflexão sobre o futuro do partido, que lidera, admitindo, até, a sua possível
dissolução.
"O partido tem de fazer uma
forte reflexão. Quadros e militantes têm de analisar a ética política, sobre as
várias manobras, as propagandas que surgem, para compreender melhor as pessoas
que gerem a nação, e as suas visões e comportamento políticos", disse numa
mensagem ao partido, durante o fim de semana.
"O que tem acontecido no
partido tem de ser mesmo analisado como uma lição para o partido", disse,
numa mensagem em vídeo gravada por ocasião dos 12 anos do Congresso Nacional da
Reconstrução Timorense (CNRT).
Para Xanana Gusmão, as mudanças
verificadas em Timor-Leste entre 2007 e 2017 -- com mais investimento privado e
uma economia mais robusta -- "não são valorizadas" com o partido a
continuar a ser acusado de ser "um partido corrupto, que roubou milhões de
dólares ao Estado, e que tudo o que o CNRT fez foi errado".
Em 2017, quando o CNRT perdeu as
legislativas, "o povo demonstrou que não confia no CNRT", mas "a
lição" não foi totalmente compreendida pelo partido, disse.
"Por isso, companheiros, o
partido tem de aprender através destas lições, a não confiar arbitrariamente
noutras organizações, cada pessoa tem de os seus próprios interesses",
apontou.
"O partido tem de considerar
discutir ainda mais profundamente o seu futuro. Se o CNRT só promove a
corrupção, se só as pessoas e qualquer pessoa do CNRT é que são corruptas, se é
necessário salvar a nação, então o melhor é mesmo fechar, dissolver o
partido", afirmou.
Xanana Gusmão pede, por isso, que
os membros do partido se foquem nos problemas internos, deixando de
"trocar acusações, trocar invejas e pensar somente nos interesses
pessoais", como, afirma, já está a ocorrer.
"Alguns já sentem
presunção... como veteranos e veteranas do partido. Alguns outros companheiros
esquecem-se de defender os direitos do partido e esqueceram que o partido é que
lhes deu e dá abrigo", disse.
"Se queremos consolidar o
partido temos que começar a ter uma autocrítica honesta e franca dentro do
partido. Se não pensarmos bem no futuro do partido, na próxima eleição vamos
perder novamente, e vamos ter que nos esforçar nos anos seguintes a pagar as
dívidas da campanha. Temos que pensar bem no futuro do partido, porque este tem
que aguentar tudo isto", sublinhou.
A mensagem de Xanana Gusmão foi
gravada na semana passada e foi distribuída pela liderança e pelos militantes
do CNRT durante o fim de semana, em que se comemoram os 12 anos de criação do
partido.
Fonte do CNRT explicou à Lusa que
o objetivo é divulgar a mensagem a nível nacional antes de uma eventual
conferência nacional cuja data, para já, ainda não está definida.
Ao longo de quase 26 minutos de
vídeo, Xanana Gusmão referiu que o CNRT apareceu em 2007 "para resolver
uma grande crise na qual os timorenses se separaram, se vingaram, fizeram mal
uns aos outros, havendo até mortes".
Uma referência à crise que
assolou Timor-Leste entre 2006 e 2008 e aos anos seguintes em que, garante, o
Governo da Aliança de Maioria Parlamentar (AMP) trabalhou para melhorar as
instituições do Estado e para "estabelecer um sistema financeiro bom e
moderno" no país.
"Procurou apoiar as empresas
locais a desenvolverem-se para desenvolver o setor privado nacional, procurou
despertar a despartidarização e o funcionalismo público; procurou dar uma visão
abrangente a todos sobre como desenvolver a nossa nação", disse.
A eletrificação do país, um
esforço para "melhorar o comportamento das empresas nacionais na
implementação de projetos e obras" e na correção das "ineficiências
nas instituições do Estado, especialmente no Governo".
Uma lista de conquistas, explica,
que incluíram, entre outros, correções na gestão do apoio dos parceiros
internacionais de Timor-Leste e a criação do G7+ (uma organização
intergovernamental que reúne países que enfrentam conflitos ativos ou que têm
experiência recente de conflito e fragilidade).
"O CNRT não quer dizer
que fez tudo; o CNRT não quer chamar a atenção a todo o povo para avaliar as mudanças
desde 2007 até 2017. Caso não existam diferenças, então o CNRT assume esse
fracasso", disse.
Caso haja diferenças, "mesmo
que pequenas", Xanana Gusmão diz que o CNRT "não fez tudo
sozinho" e por isso recorda os partidos que estiveram nas coligações do IV
e V Governo e a própria Fretilin.
"Um partido, que aceitou
apoiar o VI Governo de modo a podermos unir esforços, com um propósito único, e
assim alcançar uma grande vitória sobre a Austrália, com respeito às fronteiras
marítimas, para assim, sermos soberanos das nossas riquezas", disse.
"Obrigado à Fretilin por
aliar-se ao CNRT na defesa do interesse nacional acima dos interesses de cada partido",
afirmou.
No discurso, Xanana Gusmão retoma
a ideia de que o CNRT deve aprender com as lições do processo de construção do
Estado, olhando para o que ocorreu com sinceridade, honestidade e abertura para
"reconhecer as fraquezas" internas.
"Isto é fundamental para o
partido, porque se não analisamos estes aspetos, não teremos consciência para
melhorar partido, não sentimos a necessidade de melhorar o nosso próprio
comportamento, como membro dos quadros ou como militante", disse.
"Quando não se faz
introspeção, quando a nossa tendência é só trocar acusações, quando só exigimos
os nossos direitos e esquecemos que dentro dos quadros do nosso partido também
temos deveres para com a nação", afirmou.
Timor-Leste, disse, vive ainda
uma "situação política confusas", depois de duas eleições, em 2017 e
2018 que mostraram a fragilidade do Estado e das suas instituições, "desde
o Presidente da República até ao Parlamento, desde o Governo até aos Tribunais
e todos os setores da Justiça".
No capítulo da justiça, Xanana
Gusmão disse, ironizando, que todos os membros do partido, incluindo ele
próprio, "devem começar a receber "acusações dos tribunais", de
uma justiça "já aprisionou muitas pessoas do CNRT" e que
"procuram sempre pessoas do CNRT, quer sejam ou não culpadas".
ASP // MIM