Lisboa,
21 mai (Lusa) - Os principais indicadores macroeconómicos dos nove países da
lusofonia mostram um grupo a três velocidades, com Brasil e Guiné Equatorial em
recessão, e com Moçambique a registar o maior crescimento, apesar das crises
que atravessa.
De
acordo com as previsões do Fundo Monetário Internacional para este ano e para
2017, o Brasil e a Guiné Equatorial são os únicos dois países em recessão,
seguindo-se depois um grupo de três países cuja expansão económica deverá ficar
abaixo dos 3% este ano - Angola, Cabo Verde e Portugal.
No
pelotão mantêm-se a Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, num grupo
liderado por Moçambique, que terá o maior crescimento da Comunidade de Países
de Língua Portuguesa (CPLP): 6% este ano e 6,8% em 2017.
Os
países da CPLP têm recentemente apontado a vertente económica como uma
prioridade no relacionamento entre estas nações e um fator fundamental para o
crescimento do setor privado.
As
previsões de crescimento das economias escondem, no entanto, uma realidade dura
em Moçambique: à crise da dívida que atravessa, fruto da ocultação de
empréstimos no valor de mais de 1,4 mil milhões de dólares nos últimos anos,
junta-se também a crise política e militar, para além da crise agrícola,
resultado das condições climatéricas.
Segunda-feira,
representantes de entidades estatais da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP) reúnem-se em Luanda num fórum que vai debater a gestão da
dívida pública.
Para
o economista chefe da Coface, uma empresa especializada em seguros de risco
para as exportações, existem três razões principais para Moçambique suplantar o
Brasil na lista dos países com mais risco soberano: "Em primeiro lugar,
teve uma política orçamental muito expansionista, nomeadamente com o forte
aumento dos salários dos funcionários públicos, e depois sofreu com o preço das
matérias-primas, que caíram bastante nos últimos meses e prejudicaram muitos
países em África".
O
economista chefe da Coface, Julien Marcilly, aponta ainda à Lusa uma terceira
razão para a debilidade do crédito soberano moçambicano, que tem a ver com a
desvalorização do metical face ao dólar.
"Menos
falado, mas também muito importante, é a depreciação da moeda, que prejudica
muito a dívida pública, porque uma grande parte da dívida é denominada em moeda
estrangeira", o que significa que a simples perda de valor do metical
aumenta, na prática, o montante em dívida.
Moçambique,
um país apresentado como caso de sucesso pelo próprio FMI há dois anos,
afunda-se agora numa espiral de notícias negativas, que começam na subida de
50% dos juros exigidos pelos investidores para transacionarem os 700 milhões de
dólares em títulos de dívida pública, passam pela desconfiança dos mercados
internacionais e pela suspensão das ajudas dos doadores, e terminam nas
críticas internas que são cada vez mais audíveis não só nos jornais, mas nas
ruas, onde a contestação está a crescer.
A
contestação, claro, não chega aos calcanhares da situação vivida no Brasil,
cuja mudança de Presidente agradou aos mercados e investidores internacionais,
mas que precisa do apoio político para conseguir as leis e regulamentos que
impedem um crescimento mais rápido do Brasil: a lei laboral e o sistema fiscal
são exemplos de reformas estruturais que todos os analistas dão quando
questionados sobre os caminhos para a recuperação económica brasileira.
"O
Brasil, sendo uma das maiores economias mundiais, é, de todos os países
lusófonos, o único que pode ter efeitos gravosos na economia mundial se
acontecer algum problema com a sua dívida pública, mas esse não é o maior
problema do país", comentou o economista-chefe da consultora Eaglestone.
Em
declarações à Lusa, Tiago Dionísio disse que "o maior problema no Brasil é
político e de crecimento económico; a forte recessão deve manter-se este ano
por via de uma correção fortíssima aos problemas macroeconómicos que se
antecipavam há anos".
Em
2015 e este ano, a maior economia da América Latina deve contrair-se em 3,8%,
diminuindo o poder de compra dos brasileiros por via não só da enorme
desvalorização do real face ao dólar, mas também por causa da subida da
inflação que deverá terminar o ano à volta dos 10%, mais ou menos o valor da
taxa de desemprego.
Em
Angola, a desvalorização do kwanza foi também a responsável pela perda do poder
de compra, mas as dificuldades económicas começaram quando a queda do preço do
petróleo pôs a nu a falta de reformas estruturais para diversificar a economia,
que continua excessivamente dependente do 'ouro negro' e, por isso,
extremamente vulnerável às flutuações do preço do barril, que vale bem menos de
metade do que valia há menos de dois anos.
O
segundo maior produtor de petróleo na África subsaariana e a terceira maior economia
africana viu-se, assim, obrigado a pedir ajuda técnica e financeira ao Fundo
Monetário Internacional, depois de se ver a braços com uma crise cambial,
orçamental, financeira e económica.
"A
boa notícia é que, comparado com Moçambique, o Governo reagiu muito depressa em
2015 e cortou muito rapidamente na despesa", lembrou Julien Marcilly,
considerando que "o processo de ajustamento será doloroso a curto prazo,
mas tem um efeito limitado em termos de risco soberano" da Coface.
MBA
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