Díli,
19 nov (Lusa) - A ex-ministra timorense Emília Pires, que está a ser julgada em
Timor-Leste, solicitou ao tribunal a delegação do seu processo para Portugal,
alegando falta de capacidade ou vontade de assegurar justiça por parte do
sistema judicial timorense.
O
requerimento da ex-ministra das Finanças, ao qual a Lusa teve acesso, não quer
impedir o Tribunal de Díli de proferir o acórdão - a sentença poderá ser
conhecida até final do ano - mas que eventuais recursos sejam julgados em
tribunais portugueses.
Além
de considerar que se cumprem as condições previstas na lei para essa
transmissão de processo penal, o requerimento reitera declarações de Emília
Pires, repetidas fora e dentro do tribunal, de que o seu processo-crime tem
sido marcado por violações sistemáticas dos seus direitos fundamentais.
Algo
que, considera o texto, demonstra que o sistema judicial de Timor-Leste não tem
"capacidade ou vontade de assegurar a realização da Justiça".
O
objetivo é que depois de ser lido o acórdão do Tribunal de Díli eventuais
recursos sejam julgados em instâncias judiciais portuguesas até porque,
sublinha o requerimento, Emília Pires está a receber tratamento médico em
Portugal e não é previsível a data do seu regresso a Díli.
O
requerimento foi apresentado na terça-feira na Embaixada de Timor-Leste em
Lisboa, que tem agora a responsabilidade de o fazer chegar ao Tribunal de Díli,
que tem previsto para 25 de novembro nova audiência no processo.
Recorde-se
que Emília Pires e a ex-vice-ministra da Saúde Madalena Hanjam são acusadas de
irregularidades na compra de centenas de camas hospitalares em contratos
adjudicados à empresa do marido da primeira, com um suposto conluio entre os
três para a concretização do negócio, no valor de 800 mil dólares.
O
julgamento já deveria estar visto para sentença, mas um adiamento do coletivo
de juízes acabou por impedir que Emília Pires fosse ouvida nas suas declarações
finais, por já estar na visita ao estrangeiro.
A
defesa já prescindiu do direito a estar presente para as declarações finais -
algo em que até aqui o Tribunal de Díli continua a insistir - solicitando que
não se atrase a leitura da sentença, cuja data continua por marcar.
Emília
Pires, que foi operada no passado dia 05 de novembro na Austrália, está
atualmente em Portugal para tratamentos médicos adicionais - facto de que o
Tribunal já foi informado, garantiu à Lusa fonte da defesa.
O
pedido de "transmissão de processo penal" está definido na lei
timorense 15/2011, sobre Cooperação Judiciária Internacional Penal, que prevê
que processos-crime instaurados em Timor-Leste "podem ser delegadas num
Estado estrangeiro que as aceite".
Entre
as condições exigidas para que isso ocorra contam-se aspetos como o tempo de
pena máxima possível ou que o arguido tenha a nacionalidade do Estado
estrangeiro - Emília Pires tem a nacionalidade portuguesa, a par da timorense.
Recorde-se
que em março de 2015, ainda antes do arranque do julgamento - que começou em
outubro do ano passado - Emília Pires exerceu o seu direito de petição dando
conta às autoridades de Timor-Leste de que estava a ser alvo de "violações
sistemáticas e graves" dos seus direitos e "decisões arbitrárias e
incompreensíveis" no processo.
Nesse
direito de petição, a que a Lusa teve acesso na altura, Emília Pires
manifestava receio que a "patente incapacidade ou falta de vontade do
sistema judicial" impedissem um processo justo e equilibrado, com a
politização do caso a "fazer temer que seja crucificada" como
"forma simbólica de afirmação do poder dos tribunais".
Acusou
ainda a comunicação social de violações do segredo de justiça e de não fazer
uma cobertura objetiva dos processos.
"Quem
exerce ou exerceu cargos públicos vê-se ainda na necessidade de enfrentar estas
agressões do sistema judicial enquanto é humilhado e insultado na comunicação
social, que, sabendo que não existe em Timor-Leste o crime da difamação,
frequentemente acusa, distorce e manipula a verdade dos factos com o único
propósito de destruir a honra dos visados e não de informar o público",
escreve.
Também
em março, numa entrevista à Lusa sete meses antes do início do julgamento,
Emília Pires disse que os tribunais a querem usar como "vingança"
contra o Governo e que a tinham informado de que seria condenada a 10 anos de
prisão.
Nas
alegações finais, a 20 de setembro último, o Ministério Público deu tudo como
provado e pediu uma pena de prisão de 10 anos para Emília Pires e Madalena
Hanjam.
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