Lisboa,
24 mai (Lusa) -- A adoção do português como língua oficial nas ex-colónias
africanas portuguesas "era a solução mais prática" e "surgiu
naturalmente", disseram hoje à Lusa ex-membros da Casa dos Estudantes do
Império, atualmente dirigentes políticos naqueles países.
Há
cerca de 40 anos, a quase totalidade dos Estados africanos, que hoje integram
os Países de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), alcançaram a independência de
Portugal através de conflito armado.
Com
a proclamação da independência, todos os países decidiram usar o português como
língua oficial.
Questionado
hoje pela Lusa sobre a opção seguida pelos países africanos, o ex-primeiro-ministro
de Angola Fernando França Van-Dúnem disse que "nunca houve
concertação" entre os antigos associados da Casa dos Estudantes do Império
que, posteriormente, exerceram funções políticas naqueles países, para a adoção
do português como língua oficial.
Esta
preferência "surgiu naturalmente", disse Van-Dúnem, secundado pelo
ex-presidente cabo-verdiano Pedro Pires, que afirmou ter sido uma "solução
mais prática" para os novos Estados africanos.
"Era
o único instrumento (...) entre mãos e tínhamos que o utilizar. A língua serviu
como meio de comunicação, de difusão e cultura, portanto, teria de ser assim,
não tínhamos outra língua. Era a solução mais prática, porque é língua escrita,
de comunicação, em que nós aprendemos (...) e fizemos os estudos", disse.
Durante
os anos em que funcionou (1944-1965), a Casa dos Estudantes do Império teve um
papel importante no despertar de consciências críticas entre a juventude
oriunda das colónias, na contestação ao regime e ao domínio colonial, na
redescoberta das suas identidades culturais (das múltiplas Áfricas de origem,
de Goa, Macau ou Timor), na conceção de novos projetos políticos.
Segundo
a União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA), aquele local
"cedo subverteu as expectativas oficiais de um corpo obediente e alinhado
com a ideologia imperial".
Em
declarações à Lusa, Pedro Pires, depois de visitar a ex-cadeia do Aljube, atual
Museu da Resistência e Liberdade, e o local onde funcionou a Casa dos
Estudantes de Império, em Lisboa, defendeu, contudo, a necessidade de "se
valorizarem" as línguas africanas.
Durante
horas, cinco antigos chefes de Estado e de Governo de Angola (Fernando França
Van-Dúnem), Moçambique (Pascoal Mocumbi e Mário Machungo) São Tomé e Príncipe
(Miguel Trovoada) e Cabo Verde (Pedro Pires) percorreram a ex-cadeia do Aljube
e o Instituto Superior da Agronomia, em Lisboa, onde estudou o fundador do
PAICG, Amílcar Cabral.
Em
declarações à Lusa, o secretário-geral da UCCLA, Vítor Ramalho, considerou que
"foi imenso" o papel desempenhado pela sua instituição na introdução
do português como língua de trabalho nos PALOP, após a independência, uma vez
que parte dos protagonistas dos movimentos de libertação passaram por Portugal.
"Desde
logo, os então jovens publicaram três antologias poéticas, de Angola, São Tomé
e Príncipe e Cabo Verde. Publicaram também 22 pequenos livros de poesia e
aprofundamento das identidades dos países de onde eram originários e essa
poesia e os próprios autores são personalidade absolutamente inultrapassáveis
do ponto de vista cultural dos nossos países", disse Vitor Ramalho.
Exemplificando,
o responsável destacou nomes de vários poetas, desde José Craveirinha,
"que escreveu muito para a Casa dos Estudantes do Império", ao Rui
Monteiro, autor do Hino de Angola, bem como Amílcar Cabral.
MMT
// JLG