No dia 27 de Agosto de 2020, o
porta-voz da Câmara Eclesiástica da Diocese de Díli, rejeitou uma notícia que
circulava pelas redes sociais segundo a qual a Igreja Católica apoiava a
manifestação contra o Presidente da RDTL, contudo, o Padre Maubere (na imagem) não esconde
a sua indignação em relação à situação vivida no país.
M. Azancot de
Menezes* | Tornado
Independentemente do
posicionamento oficial da Igreja Católica nesta matéria, circula uma mensagem
por telemóvel, atribuída ao Padre Domingos Maubere, com o seguinte teor:
"Por favor informem o mundo que
Timor está sob o terror das Forças Armadas Timorenses. Neste momento estão a
cercar a casa da Sra. Ângela que está preparando uma manifestação contra o
Presidente, acusado de violação da Constituição. Timor-Leste está numa situação
gravíssima. Salvai-nos dos ditadores!"
As posições do Padre Domingos
Maubere em relação à vontade de unir os timorenses e de combater a incoerência
e a injustiça são conhecidos de longa data, desde a Convenção com a diáspora
timorense realizada em Portugal ainda antes do referendo em 1999, na tentativa
de unir os timorenses, lembro-me muito bem disso.
Este tipo de posicionamento
repetiu-se no dia 19 de Maio de 2020 quando este sacerdote esteve no Parlamento
Nacional, em Díli, ao ter tomado posições muito duras, acusando alguns
deputados de falta de maturidade política. Nesse dia, profundamente emocionado
e triste, as palavras do Pe. Maubere foram (muito) contundentes:
"O mundo e a solidariedade
internacional devem estar a rir-se do comportamento infantil dos deputados;
está a viver-se o terceiro ano de impasse político quando se devia estar a
resolver os problemas do povo."
Presidente Lu Olo acusado de não
respeitar a constituição de Timor-Leste
O problema em análise é que
Ângela Freitas (na imagem), porta-voz de um recém criado Movimento, acusou o Presidente da
República de estar a violar a Constituição da RDTL.
Após ter publicitado que prepara
uma manifestação pacífica em desacordo às posições assumidas pelo Chefe da
Nação, Ângela passou a ter a sua casa cercada por um grupo de militares, uma
medida musculada que não está a agradar a uma grande parte da sociedade.
O clima de instabilidade política
em Timor-Leste, após alguma aparente acalmia, portanto, assumiu contornos mais
visíveis no final de Agosto e início de Setembro de 2020. A casa de Ângela
Freitas, líder do Partido Trabalhista (PT) e ex-candidata presidencial está
agora “cercada” por elementos das Forças Armadas e gerou-se um clima de tensão
acrescida que divide partidos políticos e a própria Igreja Católica.
Ângela Freitas tem o apoio de
António Ai-tahn Matak, um dos líderes mais tenebrosos da Frente Clandestina na
luta contra o regime indonésio, bem como de outros seguidores, onde se inclui
Lucas Soares Colibere.
Em posição diametralmente oposta
ao Movimento intitulado “Resistência Nacional de Defesa da Justiça e
Constituição de Timor-Leste”, está a Bancada Parlamentar que inclui a Frente
Revolucionária de Timor-Leste Independente (FRETILIN), o Partido de Libertação
Popular (PLP) e o Kmanek Haburas Unidade Nasional Timor Oan (KHUNTO). Na
opinião destes três partidos com assento parlamentar, o “grupo de Ângela
Freitas é subversivo”.
Segundo alguns analistas esta
tese segundo a qual o Movimento “Resistência Nacional de Defesa da Justiça e
Constituição de Timor-Leste” se trata apenas de “um grupo” não é tão linear
como aparenta ser porque um pouco por todo o país, apesar de não ter havido
envolvimento das lideranças nem orientações oficiais nesse sentido, tem havido
contestação pública às posições oficiais do Presidente Francisco Guterres no
sentido de que não estará a haver o distanciamento partidário necessário, como
está explanado na constituição da RDTL.
Efectivamente, tem havido
conferências de imprensa e pontos de vista vários com a implicação de cidadãos
afectos a diversas franjas políticas, económicas e religiosas da sociedade,
onde se incluem militantes e simpatizantes do Conselho Nacional para a
Reconstrução de Timor-Leste (CNRT) e do Partido Democrático (PD).
Inclusivamente, uma célula da
Brigada Negra (comando especial das FALINTIL que no passado se responsabilizava
por actividades de guerrilha urbana em Timor-Leste e na Indonésia) realizou a
semana passada uma Conferência de Imprensa, com cobertura televisiva, a
manifestar o seu descontentamento em relação à imparcialidade do Presidente da
República e ao incumprimento inconstitucional.
A Constituição da República
Democrática de Timor-Leste (RDTL) é muita explícita no que diz respeito à
liberdade de reunião e de manifestação dos cidadãos nacionais na medida em que,
em conformidade com o seu Artigo 42º:
"A todos é garantida a liberdade
de reunião pacífica e sem armas, sem necessidade de autorização prévia.
A todos é reconhecido o direito
de manifestação, nos termos da lei."
Se o teor da mensagem enviada
pelo Padre Domingos Maubere for realmente verdadeiro e corresponder à
realidade, estamos a experimentar momentos maus que não favorecem o clima de
paz e diálogo.
É preciso não esquecer, se não
houver bom senso, em caso de crise absoluta, incontrolável, poderemos assistir
à divisão da liderança militar e da cúpula da Polícia Nacional de Timor-Leste
(PNTL) que integra oficiais da FRETILIN e do CNRT, portanto, com consequências
muito perigosas que poderão descambar em outra guerra civil e em nova
intervenção militar estrangeira no país.
Timor-Leste já conheceu momentos
muito conturbados, com sangue derramado, recomenda-se por isso muita ponderação
de todas as partes, colocando em primeiro lugar os interesses da Nação e do seu
martirizado povo.
*PhD em Educação / Universidade
de Lisboa
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