Surpreendentemente
os tailandeses que votaram no referendo foram a favor da opção do texto
constitucional que viola princípios fundamentais da democracia e dos direitos
humanos. Dos mais de 50 milhões de tailandeses em idade de votar ainda se desconhece
a percentagem de eleitores que se deslocaram às secções de voto. Observadores
situados em ONGs são de opinião que a abstenção foi superior a 60%.
“Isso
fez toda a diferença na anunciada vitória do sim às alterações da Constituição
e aprovação do texto antidemocrático construído pela ditadura militar que está no
poder às ordens do rei pela repressão e força das armas”, acrescentaram.
A
Tailândia é uma monarquia constitucional cujo rei, Bhumibol Adulyade, é o monarca que reina há mais tempo
e o chefe de Estado ativo mais antigo em todo o mundo, tendo
ascendido ao trono tailandês em 1946. Só na década de 1990 permitiu a
ascendência da Tailândia ao regime semelhante à democracia, mas tem
uma especial e comprovada apetência pelo regime autocrático, recuperando
ciclicamente períodos ditatoriais e de manifesta violação dos direitos humanos
ratificados pelo país mas só muito raramente respeitados.
Do
jornal Público o que se segue sobre os resultados do referendo, antecedentes e
previstas consequências. (Timor Agora)
Tailândia
aprova Constituição moldada pela junta militar
Generais
prometem novas eleições em 2017, mas o texto aprovado neste domingo assegura
que vão continuar a ter a última palavra na governação do país.
A
junta militar que governa a Tailândia desde o golpe de Estado de 2014 conseguiu
a aprovação, em referendo, daquela que será a vigésima Constituição do país
desde a abolição da monarquia absoluta, há 84 anos. O resultado da votação abre
caminho a eleições gerais – várias vezes prometidas e previstas agora para o
próximo ano –, mas garante que os generais vão continuar a ter a última palavra
sobre os desígnios do país.
Com
a contagem de votos quase terminada, a nova Lei Fundamental recolhia o apoio de
quase dois terços dos eleitores (61.4%) que foram às urnas. “A diferença é
demasiado grande para que o resultado se altere”, anunciou ao final do dia o
presidente da comissão eleitoral, que colocou a participação ligeiramente acima
dos 50%.
Um
resultado que não reflecte o repúdio dos principais partidos políticos em
relação ao diploma, mas espelha a repressão imposta pelos militares em nome da
estabilidade – nos últimos dois anos centenas de pessoas foram detidas e
interrogadas, as redes sociais foram postas sob vigilância e os comícios
banidos. A junta proibiu também qualquer campanha contra uma Constituição que,
afirma, permitirá pôr fim a uma década de turbulência política no país.
“É
o futuro da Tailândia. É a democracia, venham votar”, apelou o general Prayut Chan-ocha, chefe da junta
militar, depois de votar de manhã, em Banguecoque.
Para
muitos eleitores, a aprovação do texto é a única via mais rápida para o
regresso da democracia ao país, depois de há dois anos os militares terem derrubado o Governo de Yingluck
Shinawatra, irmã do antigo primeiro-ministro, Thaksin Shinawatra – herói
das classes populares, mas grande adversário das elites realistas, a começar
pelo Exército. “Só quero que a situação regresse ao normal e que haja
eleições”, disse à AFP Potchana Surapitic, um habitante da capital, de 53 anos.
Um
dia
Normalidade
democrática é uma coisa a que a Tailândia não está habituada – desde o fim da
monarquia absoluta, em 1932, houve 12 golpes militares –, mas para os
opositores, o que os militares realmente pretendem com o novo texto é
perpetuar-se no poder, sem necessidade de novas intentonas. Uma das principais
mudanças introduzidas estipula que o Senado (a câmara alta do Parlamento) passe
a ser nomeado e reserva uma percentagem dos lugares às chefias militares.
A
alteração é vista como essencial numa altura em que se acumulam rumores sobre a
saúde do rei Bhumibol, de 88 anos, muito respeitado no país e visto como um
garante da união nacional.
A
oposição diz também que o texto visa terminar aquilo que o golpe de 2006 contra
Thaksin Shinawatra não conseguiu – nas eleições seguintes, em 2011, a irmã do
líder populista, que vive exilado desde que foi acusado de corrupção, arrebatou
de novo o poder. Yingluck está a ser julgada pelo crime de negligência e, em
Janeiro, foi banida da política por cinco anos, mas a junta receia que a
popularidade dos irmãos continue inabalável entre as classes mais pobres,
sobretudo nos bastiões rurais do nordeste.
“Prayut,
não deves ficar orgulhoso com a tua vitória, porque os teus opositores não
puderam bater-se como deviam, por causa das ameaças e assédio”, reagiu Jatuporn
Prompan, líder dos Camisas Vermelhas, movimento popular que apoiou nas ruas os
governos dos irmãos Shinawatra, em manifestações que muitas vezes degeneraram
em confrontos com a oposição de então (os Camisas Amarelas), provocando dezenas
de mortos. O dirigente admitiu a derrota mas, desafiador, disse estar convicto
que “um dia o poder regressará ao povo”.
Ana
Fonseca Pereira – Público
Na
foto: O monarca Bhumibol Adulyade, há 70 anos no poder, e o general Prayuth
Chan-ocha, chefe da junta militar que mantém a Tailândia sob ditadura.
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