Pequim,
02 jun (Lusa) - A China assinala quinta-feira uma das efemérides mais sensíveis
da sua história recente, mas como sempre, as autoridades preferem esquecer a
data (04 de junho de 1989), canalizando antes as atenções para o "enorme
progresso económico" do país.
"O
governo e o povo chineses já chegaram a uma conclusão acerca dos incidentes
políticos da década de 1980" na praça Tiananmen, disse hoje a porta-voz do
ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, Hua Chunying. "O progresso
económico provou que a via de desenvolvimento seguida pela China está certa e
tem o apoio de 1.300 milhões", acrescentou.
Na
semana passada, respondendo a uma carta difundida por jovens chineses que
estudam fora do país, um jornal do Partido Comunista Chinês (PCC) afirmou que
"a sociedade chinesa concordou não debater o incidente de 1989".
O
"incidente" diz respeito ao movimento pro-democracia da Praça
Tiananmen - ou "rebelião contra-revolucionária, segundo a terminologia
oficial - iniciado por estudantes das universidades de Pequim e esmagado pelo
exército no dia 04 de junho de 1989.
Centenas
de pessoas morreram e milhares de outras foram presas ou exilaram-se.
"Esta
parte da história tem sido tão cuidadosamente manipulada e escondida que muitos
de nós sabem muito pouco sobre ela", assinala-se na carta.
Os
cerca de 28 milhões de jovens que frequentam hoje as universidades chinesas -
catorze vezes mais do que em 1989 - ainda não tinham nascido quando os seus
antigos colegas ocuparam a mítica Praça Tiananmen, reclamando mais liberdade e
protestando contra a corrupção do regime, há 26 anos.
Politicamente,
o PCC não abdicou do "papel dirigente", mas no plano económico, as
reformas acentuaram-se e os próprios empresários, vistos outrora como
"inimigos de classe", já podem filiar-se no Partido.
Entretanto,
a China tornou-se a segunda maior economia mundial e no final da próxima década
poderá já ser a primeira.
Em
2014, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) chinês (7,4 por cento) foi o
mais baixo dos últimos 24 anos, mas, mesmo assim, representou mais do dobro da
média global.
Mais
de cem milhões de chineses fazem férias fora da China continental e centenas de
milhares de famílias enviam os filhos para universidades estrangeiras.
A
China já é também o maior mercado automóvel do mundo e um dos maiores
investidores do planeta.
Internamente,
o PCC lançou uma campanha sem precedentes contra a corrupção, procurando
recuperar a credibilidade e legitimar a sua permanência no poder.
Dezenas
de quadros com a categoria de vice-ministro ou superior, entre os quais o
ex-chefe da Segurança Zhou Yongkang, foram presos desde que Xi Jinping assumiu
a chefia do PCC, em novembro de 2012.
A
"guerra a poluição", declarada o ano passado, é outra frente
suscetível de aumentar a popularidade do PCC.
Ao
mesmo tempo, o governo reforçou o controlo sobre a internet e a imprensa,
parecendo empenhado em "combater os valores ocidentais" e impor mais
rígidos limites ideológicos à criação artística e ao ativismo social
independente.
Segundo
o relatório anual da organização Human Rights Watch, difundido em janeiro, sob
a direção de Xi Jinping, as autoridades desencadearam mesmo "a mais dura campanha
de investigações, detenções e condenações políticas da última década,
assinalando uma acentuada viragem no sentido da intolerância de criticas".
Daniel
A. Bell, professor da Universidade Qinghua, em Pequim, considera que "a
democracia, na China, não é inevitável", mas constata que "há uma
forte procura por valores ocidentais como a liberdade de expressão,
transparência do governo e primado da lei, e que esta procura continuará a
aumentar è medida que a China se moderniza".
"Um
dia, o governo terá de escolher entre uma sociedade mais aberta e uma repressão
estilo Praça Tiananmen para preservar a estabilidade", escreveu Daniel A.
Bell na ediçao de maio da revista "The Atlantic".
AC
// APN
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