Díli,
08 set (Lusa) - O setor judicial timorense necessita de uma reforma ampla e
urgente que inclua uma reorganização do Centro de Formação Judicial, para
responder à "séria preocupação" que continuam a representar os
julgamentos no país, segundo um relatório hoje divulgado.
"Justiça
na encruzilhada em Timor-Leste" é o título do relatório produzido pelo
Institute for Policy Analysis & Conflict (IPAC), que analisa o estado da
justiça no país tendo em conta, entre outros aspetos, a decisão do ano passado
de expulsão dos magistrados internacionais.
"A
justiça dos julgamentos em Timor-Leste continua a representar uma séria
preocupação, especialmente em termos dos direitos dos acusados", referem
os autores do relatório.
"A
prevalência de declarações de culpa e as tendências de juízes não questionarem
as confissões significa que há pouco incentivo para preparar os casos
efetivamente, com os advogados de defesa frequentemente a não chamarem
testemunhas", nota.
Entre
outros aspetos, o relatório considera que o Centro de Formação Judicial
"precisa de ser amplamente reorganizado" já que "não conseguiu
desenvolver um programa capaz de produzir profissionais jurídicos
competentes".
Em
particular, o relatório considera que a língua de formação deveria ser o tétum,
com aulas de português jurídico a passarem a ser estandardizadas no currículo
universitário.
Defende
ainda mais transparência na administração judicial com acesso a todos os
documentos públicos, exigências de relatórios anuais e a criação de uma base de
dados com decisões finais "facilmente acessível".
Tendo
em conta que 90% dos processos julgados em Timor-Leste são criminais, o
relatório defende uma reforma do processo criminal, especialmente para que os
códigos em vigor no país cumpram padrões internacionais no que toca, por
exemplo, aos direitos do acusado.
Timor-Leste,
refere, continua a ter um sistema especialmente restritivo de registo que
significa que "muito poucos advogados privados conseguem cumprir os
critérios", numa altura em que "as universidades locais produzem
centenas de licenciados".
O
país precisa de mais tribunais mas, até ao momento, não há planos para expansão
nem sequer uma análise, para planeamento, sobre previsões relativamente ao
número de casos para cada área do setor de justiça.
"Apesar
de 14 anos de assistência internacional e, em alguns casos, devido a ela, o
setor judicial timorense continua numa situação complicada", explica
Sidney Jones, diretora do IPAC.
Sedeado
em Jacarta e centrado especialmente em situações de conflito e pós-conflito na
Indonésia (como Aceh, Papua, Molucas), o IPAC dedica pontualmente atenção aos
países vizinhos, nomeadamente Timor-Leste e Filipinas.
A
organização é liderada por Sidney Jones - uma conhecida especialista em
direitos humanos na Indonésia e Timor-Leste e que, no passado, trabalhou com o
Internacional Crisis Group - e integra individualidades como o jornalista e
escritor indonésio Goenawan Mohamad.
Fazem
ainda parte da organização Todung Mulya Lubis, o mais conhecido advogado de
direitos humanos da Indonésia e o jornalista e ambientalista Aristides Katoppo.
Neste
estudo, o IPAC examinou o impacto da controversa decisão de expulsão de juízes
e as possibilidades de um processo de completa "timorização" do setor
judiciário, notando o "amplo consenso dentro do Governo e da elite
política de que é necessária uma mudança significativa".
Tendo
em conta a expulsão dos magistrados, o relatório sugere que isso poderá
constituir uma oportunidade para mudanças, já que "o fim da dependência em
funcionários judiciais internacionais era uma importante pré-condição para
reformas".
O
relatório foi feito depois de três meses de investigação, incluindo visitas de
campo, monitorização de julgamentos e de 39 entrevistas com representantes do
setor judicial, organizações da sociedade civil, Governo, Nações Unidas e
comunidade internacional.
ASP
// VM
Sem comentários:
Enviar um comentário