Num momento em que vivemos uma
situação conturbada devido às incoerências da Ministra da Educação Dulce de
Jesus, a Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros de Portugal está a
fazer uma visita oficial a Timor-Leste.
M. Azancot de
Menezes | Jornal Tornado
Após ter sido recebida pelo
Presidente da República Democrática de Timor-Leste (RDTL), no dia 8 de Outubro
de 2018, a
Secretária de Estado do Ministério dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação de
Portugal, Teresa Ribeiro, prestou declarações aos jornalistas sobre as razões
da visita oficial ao nosso país e em relação ao principal tema abordado durante
o encontro com o Chefe de Estado Francisco Guterres / Lu´Olo.
A questão da língua portuguesa em
Timor-Leste, como não podia deixar de ser, mereceu destaque nas suas
declarações aos jornalistas e despertou-me a atenção porque transpareceu das
palavras de Teresa Ribeiro uma mensagem clara ao Estado timorense no sentido de
se assumir, de uma vez por todas, uma postura firme sobre a opção a seguir, se
o português ou outra língua.
A Secretária de Estado dos
Negócios Estrangeiros e da Cooperação declarou que Portugal está empenhado no
ensino da língua portuguesa em Timor-Leste “se for essa a vontade dos
timorenses”. Timor-Leste quer ou não quer a língua portuguesa? Aqui reside a
grande confusão que decorre das incoerências registadas sempre que mudam os
governos, em particular, os ministros da educação.
Recomendações do III Congresso
Nacional da Educação devem ser cumpridas
Durante o VII Governo
Constitucional, formado pela FRETILIN e pelo PD, não havia qualquer dúvida
sobre essa matéria. Mari Alkatiri, enquanto Primeiro Ministro, mas também
António da Conceição, na qualidade de Ex-Ministro da Educação, foram
categóricos, coerentes e inequívocos.
No III Congresso Nacional da
Educação, realizado em 2017, Alkatiri defendeu uma linha de pensamento segundo
a qual a melhor forma de reforçar a nossa diferença nesta região geográfica e o
nosso papel em contexto de globalização é “fazer do português a língua de
ensino e da educação em parceria com o tétum; fazer do português a língua da
ciência e do domínio da tecnologia; fazer do português a língua para o
desenvolvimento e, inevitavelmente, fazer do tétum a língua para afirmar a
nossa maneira diferente de pensar…”. António da Conceição afirmou que “as
línguas oficiais no sistema educativo devem ser entendidas enquanto meios,
instrumentos e recursos para um único fim, ou seja, o acesso a uma educação de
qualidade por todos os cidadãos”.
Na perspectiva de académicos
nacionais altamente conceituados, e refiro-me a Benjamim da Corte-Real Araújo,
Director do Instituto Nacional de Linguística da Universidade Nacional de Timor
Lorosa´e (UNTL), Professor e Investigador desta única universidade
pública do país, o apelo neste III Congresso foi no mesmo sentido, ao declarar
que “há necessidade de elevar a carga horária para a aprendizagem da língua
portuguesa”, solicitando que se desse “ouvidos às conclusões advindas do III
Congresso Nacional da Educação”.
Ministra da educação Dulce de Jesus
é incoerente em relação à política linguística e prejudica gravemente o futuro
de Timor-Leste
O que rapidamente podemos
concluir é que as políticas educativas no domínio das línguas, refiro-me ao
tempo do VII Governo Constitucional, eram coerentes com a Constituição da RDTL
e coerentes com princípios científicos e pedagógicos elementares. Portanto,
interrogo-me, por que razão a Senhora Ministra da Educação não valoriza as
recomendações do III Congresso Nacional da Educação em matéria linguística (e
outras)? Por que razão as recomendações de Benjamim Corte-Real, note-se,
Director do Instituto Nacional de Linguística da Universidade Nacional de Timor
Lorosa´e (UNTL), um especialista na matéria, não são ouvidas nem achadas
pela Senhora Ministra da Educação Dulce de Jesus?
Recentemente, o Jornal Tornado
entrevistou uma académica da UNTL, Sabina da Fonseca, doutorada em linguística
pela Universidade Nova de Lisboa. Na opinião desta académica, “a língua de
ensino deve ser o português; a iniciação à leitura e à escrita deve ser em
português; se queremos projectar a educação das crianças para o futuro, o
ensino deve ser em língua portuguesa com recurso ao tétum”. Segundo Sabina
da Fonseca “o tétum está em fase de desenvolvimento e deve apoiar-se ao
português para se desenvolver”. Esta académica foi mais longe e adiantou que “o
ensino-aprendizagem nas línguas maternas só irá contribuir para retardar e
complicar a aprendizagem das crianças”.
Por que razão a Ministra da
Educação Dulce de Jesus não valoriza os académicos especialistas da UNTL, a
universidade mais prestigiada do país, e prefere ouvir as opiniões de
membros de Organizações Não Governamentais, como a Fundação Alola, entre
outras? Será que na opinião da Senhora Ministra da Educação os académicos da
UNTL não possuem competências científicas e pedagógicas?
A Senhora Ministra da Educação
afirma publicamente que defende a língua portuguesa. De facto, visita várias
instituições como os «CAFE» e o «Projecto Formar Mais», inaugura bibliotecas
com livros em língua portuguesa, contudo, demonstrando total incoerência,
cometeu um erro que se não for corrigido será um erro histórico.
Qual foi esse erro? Decidiu
propor no Parlamento Nacional que fossem anulados os Decretos-lei 3/2018 de 14
de Março e 4/2018 de 14 de Março. E porquê? Para retirar horas de ensino em
língua portuguesa na Educação Pré-Escolar e no 1.º Ciclo do Ensino Básico. Na
prática trata-se do início de mais uma tentativa para a erradicação da língua
portuguesa do sistema de ensino nacional.
Por estas e por outras razões é
que a Senhora Secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e Cooperação
portuguesa terá afirmado que Portugal está empenhado no ensino da língua
portuguesa em Timor-Leste “se for essa a vontade dos timorenses”.
Por estas e por outras razões é
que a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e o resto do mundo
olham para nós sem saber bem para onde vamos e o que realmente queremos.
*M. Azancot de Menezes,
professor universitário | também colabora no Timor Agora
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