Hong
Kong, China, 24 mar (Lusa) -- O filme "Ten Years", que apresenta uma
visão distópica de Hong Kong em 2025 e considerado"absurdo" pela
China, é candidato a "melhor filme" na antiga colónia britânica, mas
desapareceu das salas de cinema da região.
O
filme, lançado em dezembro, é descrito como uma sátira sociopolítica: na ficção
passada em Hong Kong em 2025, uma mulher idosa imola-se pelo fogo em protesto,
um taxista desespera com a erosão da língua local (cantonense) e crianças andam
nas ruas vestidas com uniformes militares, a fazer lembrar a Revolução Cultural
chinesa. "Ten years" concorre nos 35.º Hong Kong Film Awards (HKFA),
que serão entregues a 03 de abril.
"O
filme dá voz aos sentimentos que atormentam os residentes de Hong Kong",
disse à AFP Ng Ka-leung, de 34 anos, um dos jovens realizadores de Hong Kong
que assina uma das curtas que integram "Ten Years", "Egg
Man", que mostra um vendedor de ovos sob ataque dos "guardas
vermelhos" que procuram denunciar cidadãos.
"Eu
queria usar o filme para responder a algumas questões que sempre quis ver
respondidas, incluindo se Hong Kong tem alguma saída e como iria Hong Kong
mudar", acrescentou.
O
filme foi realizado com um orçamento de meio milhão de dólares de Hong Kong
(cerca de 57.400 euros) e gerou seis milhões de dólares de Hong Kong (cerca de
693 mil euros) em receitas. Não obstante o sucesso nas bilheteiras em Hong
Kong, o filme está a ter dificuldades na distribuição na antiga colónia
britânica.
"Por
que é que os cinemas não consideram o nosso filme, que foi rentável e que
muitas pessoas querem ver?", questionou Ng Ka-leung.
Na
China, o filme foi rotulado pelo jornal Global Times -- publicado em língua
inglesa --, de "totalmente absurdo", "demasiado pessimista"
e um "vírus para a mente".
"Sel-Immolator",
a curta assinada por Kiwi Chow, apresenta uma cena comum no Tibete, em que
ativistas recorrem à imolação pelo fogo para protestar contra o controlo de
Pequim, mas da qual não há registo em Hong Kong.
"Eu
não quero que a minha história se torne realidade", disse Chow, de 37
anos.
As
liberdades de Hong Kong estão protegidas pelo princípio 'Um país, dois
sistemas', que também se aplica em Macau e ao abrigo do qual a antiga colónia
britânica passou para a China em 1997, mas os receios têm aumentado sobre a crescente
influência de Pequim no território, desde a política à educação e imprensa, e
sobre o futuro da região administrativa especial chinesa.
Nos
últimos meses, foram conhecidas as detenções na China de cinco livreiros que
publicavam em Hong Kong livros críticos de Pequim. E na noite de 8 de
fevereiro, véspera da entrada do Ano Novo Lunar, a cidade foi palco dos piores
confrontos entre jovens e a polícia desde a ocupação das ruas por manifestantes
em 2014.
Críticos
de cinema dizem que a população de Hong Kong quer ver estes assuntos
diretamente abordados.
"Há
vários filmes políticos em Hong Kong, mas eles usam metáforas e formas
indiretas para contar a história", disse à AFP o crítico de cinema em Hong
Kong Dominic Li.
"Em
'Ten Years', eles são bastante diretos e atacam a presente situação em Hong
Kong", acrescentou.
O
filme vai estar no Osaka Asian Film Festival, no Japão, e vai ser exibido em
Taiwan.
Em
Hong Kong vai poder ser visto em 30 exibições comunitárias a 01 de abril.
FV
// MP
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