Quarenta
anos após a queda de Saigon, país ainda tem dificuldade em encontrar
significado para a intervenção militar. Até hoje, derrota é referência em
debates sobre entrada americana em outros conflitos armados.
liff
Riley viu a queda
de Saigon pela TV. Uma década antes, em 1966, ele havia se
voluntariado no Exército, em meio à onda de patriotismo americano que sucedeu a
Segunda Guerra Mundial. Intervir no Vietnã, pensava ele na época, era uma ação
legítima para combater a ameaça do comunismo.
Ao
desembarcar no Vietnã do Sul, então com 19 anos, ele viu a pobreza e achou que
os Estados Unidos de fato poderiam ajudar. Com o tempo, porém, enquanto
trabalhava no setor de comunicações do Exército, sua percepção das coisas foi
mudando.
"Começou
a me incomodar o dano que estávamos causando", relembra. "Nós
estávamos destruindo a terra deles. Eu me questionava sobre o que eles iriam
ter quando saíssemos."
Só
de sua antiga escola, no estado de Ohio, Riley perdeu sete colegas. Quando já
de volta em casa, ele acompanhou a queda da então capital do Vietnã do Sul com
um misto de tristeza e raiva: "Meus amigos foram mortos. E pelo quê?"
A
ambiguidade de Lyndon Johnson
Passados
40 anos, ninguém consegue ao certo responder pelo que os amigos de Riley e
outros 58 mil americanos morreram. Uma dúvida que se reflete na figura de
Lyndon Johnson, presidente dos EUA entre 1963 e 1969.
Texano
e liberal-democrata, ele apoiava a equidade racial e social nos EUA, numa
agenda doméstica que contrastava com uma política externa agressiva. Em 1965,
foi ele que transformou uma missão militar limitada numa guerra de fato, que
envolvia quase 500 mil soldados americanos.
"As
evidências mostram claramente que Johnson estava dividido", opina o
historiador Edward G. Miller, autor de um livro sobre a guerra. "De um
lado, ele achava que os EUA, por estarem profundamente envolvidos nos assuntos
do Vietnã do Sul há 15 anos, tinham obrigação de ajudar o país. Por outro, ele
estava seriamente preocupado com as consequências de uma guerra."
O
assunto ainda divide historiadores e analistas políticos. Para uns, Johnson de
fato temia um efeito dominó, com um comunismo se espalhando se o Vietnã do Sul
fosse dominado pelo Norte. Para outros, tinha medo, na verdade, da pressão
republicana interna caso não agisse.
"Johnson
era um homem complicado, tinha medo de ser visto como fraco" afirma
Miller. "Dizia com frequência que não queria ser visto como o primeiro
presidente americano a perder uma guerra."
Com
a guerra, começou o recrutamento. Ken Williamson era estudante de fotografia na
Universidade de Ohio quando a intervenção no Vietnã começou a escalar. Ele
recebeu permissão para continuar os estudos, enquanto o campus era dominado por
discussões sobre o conflito.
"Estávamos
envolvidos numa guerra civil que, na minha opinião, não tinha nada a ver com a
gente", conta Williamson.
Após
alguns anos, já formado na universidade, Williamson foi recrutado e recebeu a
missão de ir ao Vietnã como fotógrafo, trabalhando, porém, longe do front.
Outros opositores da guerra fugiram para o Canadá, mas ele conta que, na época,
sentiu que tinha a obrigação de servir a seu país. A intuição de que algo
estava sendo escondido da população, porém, permaneceu.
"O
governo americano realmente mentiu ao país sobre o que estava
acontecendo", afirma Williamson, hoje com 72 anos. "Naquele tempo,
era só uma impressão, mas hoje é possível provar que é verdade em várias áreas,
como no uso do Agente Laranja."
As
sequelas da derrota
O
Exército americano despejou mais de 80 milhões de litros de Agente Laranja – um
herbicida desfolhante com uma perigosa dioxina – nas selvas do sul do Vietnã
para destruir os cultivos e a selva usada pela guerrilha comunista. Durante
anos, os EUA não admitiram a ligação entre a substância e os futuros problemas
de saúde apresentados por soldados, como Cliff Riley.
"A
dioxina estava deixando muitos de nós doentes", conta Riley, hoje com 69
anos. "As pessoas que foram expostas têm mais chances de ter doenças como
câncer de próstata, de pulmão ou Parkinson."
Com
40 anos, o ex-soldado já tinha sofrido dois enfartes. Foi diagnosticado com
câncer colorretal e hoje tem diabetes. Só com a aprovação do chamado Agent
Orange Act, em 1991, o governo começou a indenizar veteranos por doenças
causadas pela exposição ao desfolhante.
O
horror da guerra e a derrota dos EUA foram tão traumatizantes que alguns
americanos acreditam que o país sofre de uma "síndrome do Vietnã".
"A
ideia por trás do conceito é que a Guerra do Vietnã foi tão desastrosa e
impopular que os líderes americanos estariam, por isso, relutantes em se
envolver em conflitos internacionais", opina Miller. "Até hoje, onde
quer que haja uma discussão sobre o que os EUA deveriam fazer no Iraque, no
Afeganistão ou contra o 'Estado Islâmico', o Vietnã continua sendo uma
referência", completa o historiador.
Spencer
Kimball (rpr) – Deutsche Welle
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