Macau,
China, 09 abr (Lusa) -- "Macau Confidencial", livro do investigador
da História de Macau João Guedes recentemente publicado, relata episódios
guardados a sete chaves durante décadas, como o jantar que desencadeou o
Iberismo ou a fundação do Partido Comunista do Vietname.
O
livro, publicado recentemente, fala "de variadíssimos episódios situados
nos finais do século XIX mas principalmente nos inícios do século XX, até à
ascensão de Salazar, que foi um período interessantíssimo da história de
Macau", explicou João Guedes à agência Lusa, destacando três momentos: o
Iberismo, a coincidência (ou não) da I República em Portugal e na China e a
fundação do Partido Comunista do Vietname.
O
"Iberismo", ideologia que defende a unificação política de Portugal e
Espanha, que teve o seu apogeu na segunda metade do século XIX, como narra João
Guedes, é "bem conhecido". Contudo, talvez poucos saibam que a ideia
de união ibérica, dois séculos depois da restauração de Portugal em 1640, teve
o seu nascimento, de facto, no Paço Episcopal de Macau.
A
corrente que pretendia unir as duas coroas teve como impulsionadores Jerónimo
José da Mata, bispo da diocese de Macau, Carlos José Caldeira (seu primo),
enviado especial do Governo português à China, Sinibaldo de Mas, catalão de
origem e ministro plenipotenciário de Espanha na China, o padre canonista J.
Foixa e o dominicano espanhol J. Fernando, que "selaram num jantar",
no verão de 1850, um pacto "em que se brindou à Ibéria e à 'conveniência
da união pacífica e legal de Portugal e Espanha'", escreve o também
jornalista na sua mais recente obra.
"Esses
vultos da altura entendiam que Portugal e Espanha deviam unir-se porque estavam
em perigo os seus respetivos impérios ultramarinos", detalha o jornalista
e investigador, observando que "este assunto é substancialmente mais
tratado e publicado em Espanha do que em Portugal".
Relacionado
com o Iberismo surge outro "episódio raramente contado": "O
mistério do maior desastre naval ultramarino português dos últimos 200
anos", em 1850.
"Na
explosão da fragata D. Maria II [enviada para Macau após o assassínio do
governador Ferreira do Amaral, em agosto de 1849], na Taipa, morre quase toda a
tripulação constituída por 200 marinheiros. Foi um desastre que resultou de uma
ação das seitas, das tríades, porque estava em Macau como parte de uma força
expedicionária -- que incluía depois a Corveta Íris e uma outra fragata -- com
a missão de invadir a região" vizinha em torno da então colónia
portuguesa, desvenda João Guedes.
"Esse
projeto, completamente peregrino, não chegou depois a ser subscrito em Portugal
mas tinha defensores no governo português. Mas, com a explosão da fragata, esse
plano tolo caiu completamente", realça.
Neste
livro de João Guedes "há também a história completamente escondida do
movimento anarquista chinês que tem em Macau o seu quartel-general no início do
século XX".
"E
depois tento esclarecer -- mas não esclareço -- a coincidência de datas na
proclamação das duas repúblicas (1910 em Portugal, 1911 na China). Penso que
não é apenas coincidência e dou algumas achegas nesse sentido, mas é preciso
ainda estudar mais sobre isso", continuou João Guedes.
Outro
episódio revelado no livro prende-se com a fundação do Partido Comunista do
Vietname, no Hotel Cantão, "um segredo que é guardado durante mais de 70
anos".
"O
Komintern, a Internacional Comunista desse tempo, está em pleno vigor e Macau é
um dos centros de controlo do Komintern -- clandestino, claro. E realiza-se
aqui o primeiro congresso do Partido Comunista do Vietname, com Ho Chi Minh,
que vivia em Macau", explica.
"São
estes episódios que eu diria confidenciais porque Macau era uma cidade
demasiado pequenina para ter segredos verdadeiros. Creio que muita gente
saberia do que se passava, mas o consenso era o de que era melhor não se falar
sobre isso", considera.
Também,
"nessa altura já da formação do Partido Comunista Salazar já estava no
poder, pelo que era melhor não tocar em assuntos incómodos".
"Macau
Confidencial" tem por uma base uma série de artigos escritos semanalmente
no Jornal Tribuna de Macau ao longo de mais de dois anos, de uma forma esparsa.
A
obra integra a coleção do Instituto Internacional de Macau (IIM) intitulada
"Suma Oriental", obra de Tomé Pires, o primeiro embaixador designado
por Portugal para ser presente ao Imperador da China, e dos primeiros autores
que escreveram sobre o Oriente. A coleção pretende dar "modesta
continuidade" à "Suma Oriental" iniciada no século XVI.
DM
// PJA
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