sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Advogados de ativistas de Hong Kong detidos na China pressionados a afastarem-se


Pequim, 10 set 2020 (Lusa) - As autoridades chinesas não formalizaram ainda qualquer acusação contra os ativistas de Hong Kong, incluindo um com passaporte português, e estão a pressionar os advogados escolhidos pelas famílias a afastarem-se do caso, disse à Lusa um dos mandatários.

Entre os 12 ativistas detidos, por travessia ilegal, quando alegadamente tentavam escapar por mar para Taiwan, a partir de Hong Kong, está Tsz Lun Kok, um estudante da Universidade de Hong Kong (HKU), de 19 anos e com dupla nacionalidade portuguesa e chinesa.

O grupo de 11 homens e uma mulher, com idades entre os 16 e os 33 anos, pretendia chegar a Taiwan, tendo iniciado a viagem em 23 de agosto, segundo as autoridades. Horas depois de terem partido, a embarcação foi travada pela guarda costeira da província chinesa de Guangdong, a 50 milhas a sudeste da península de Sai Kung.


Segundo Lu Siwei, que representa uma mulher de 33 anos que faz parte do grupo, nenhum dos detidos teve ainda acesso ao respetivo advogado.

"Nenhum representante legal conseguiu ainda estabelecer contacto com o respetivo cliente, desde as prisões", em 23 de agosto, disse.

Lu Siwei tentou primeiro entrar em contacto com a sua cliente, na sexta-feira passada, mas a polícia exigiu documentos autenticados que confirmassem a identidade do irmão da suspeita.

Lu voltou a tentar visitar a cliente, na quarta-feira, mas o acesso foi-lhe negado. As autoridades disseram-lhe que já contrataram outros dois advogados para representar a mulher.

O jornal de Hong Kong South China Morning Post avançou hoje informações semelhantes, noticiando que pelo menos dois outros representantes dos detidos foram pressionados a afastarem-se do caso.

O advogado citado pelo jornal diz ter sido informado pelas autoridades de que "as suspeitas que recaem sobre estas pessoas são muito graves".

Questionado pela Lusa sobre a possibilidade de o caso ser transferido para o ministério de Segurança do Estado, que engloba os serviços de inteligência e a polícia secreta da China, Lu Siwei disse que é "difícil de dizer, por enquanto".

O sistema judicial chinês, que é controlado pelo Partido Comunista, partido único do poder na China, prevê o uso de "vigilância residencial em local designado", que permite às autoridades manter em local desconhecido acusados de "colocar em perigo a segurança nacional", por um período até seis meses, sem acesso a advogado ou contacto com familiares.

Esta forma de detenção é frequentemente usada contra defensores dos direitos humanos, incluindo advogados, ativistas ou dissidentes.

Tsz Lun Kok tinha sido detido em 18 de novembro, com outras centenas de estudantes, durante o cerco da polícia à Universidade Politécnica de Hong Kong (PolyU), que se prolongou de 17 a 29 desse mês, tendo terminado com a invasão dos agentes ao campus universitário, onde a polícia diz ter encontrado milhares de bombas incendiárias e armas.

O jovem é acusado em Hong Kong de motim, por ter participado alegadamente numa manobra para desviar as atenções da polícia que cercou as instalações do campus, com o objetivo de permitir a fuga de estudantes refugiados no seu interior.

A antiga colónia britânica atravessou, no ano passado, a sua pior crise política desde a transferência da soberania para as autoridades chinesas, em 1997, com protestos diários, marcados por cenas de vandalismo e confrontos entre a polícia e os manifestantes.

A chefe do executivo de Hong Kong, Carrie Lam, disse na terça-feira que os 12 detidos têm de responder às acusações no continente antes de o governo da região poder intervir.

Tanto o MNE como o Consulado de Portugal em Macau e Hong Kong afirmaram que estão a acompanhar o caso, apontando no entanto que "a China não reconhece a dupla nacionalidade a cidadãos chineses", o que limitaria a intervenção das autoridades portuguesas "ao domínio humanitário, procurando assegurar que o detido se encontra bem, que lhe seja dispensado um tratamento digno e que possa ser defendido por um advogado".

Na segunda-feira, uma porta-voz do Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE) da União Europeia (UE) disse igualmente à Lusa que o SEAE está a acompanhar o caso do estudante com passaporte português, através do seu gabinete em Hong Kong e Macau e do Consulado de Portugal, mas que não pode prestar "assistência consular direta aos cidadãos" da União, um assunto que "continua a ser [...] da competência das autoridades nacionais".

Uma petição a pedir à Casa Branca a libertação do grupo já ultrapassou as cem mil assinaturas necessárias para receber resposta de Washington.

JPI (PTA) // VM

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