Pequim, 10 set 2020 (Lusa) - As
autoridades chinesas não formalizaram ainda qualquer acusação contra os
ativistas de Hong Kong, incluindo um com passaporte português, e estão a
pressionar os advogados escolhidos pelas famílias a afastarem-se do caso, disse
à Lusa um dos mandatários.
Entre os 12 ativistas detidos,
por travessia ilegal, quando alegadamente tentavam escapar por mar para Taiwan,
a partir de Hong Kong, está Tsz Lun Kok, um estudante da Universidade de Hong
Kong (HKU), de 19 anos e com dupla nacionalidade portuguesa e chinesa.
O grupo de 11 homens e uma
mulher, com idades entre os 16 e os 33 anos, pretendia chegar a Taiwan, tendo
iniciado a viagem em 23 de agosto, segundo as autoridades. Horas depois de
terem partido, a embarcação foi travada pela guarda costeira da província chinesa
de Guangdong, a 50 milhas
a sudeste da península de Sai Kung.
Segundo Lu Siwei, que representa
uma mulher de 33 anos que faz parte do grupo, nenhum dos detidos teve ainda
acesso ao respetivo advogado.
"Nenhum representante legal
conseguiu ainda estabelecer contacto com o respetivo cliente, desde as
prisões", em 23 de agosto, disse.
Lu Siwei tentou primeiro entrar
em contacto com a sua cliente, na sexta-feira passada, mas a polícia exigiu
documentos autenticados que confirmassem a identidade do irmão da suspeita.
Lu voltou a tentar visitar a
cliente, na quarta-feira, mas o acesso foi-lhe negado. As autoridades
disseram-lhe que já contrataram outros dois advogados para representar a
mulher.
O jornal de Hong Kong South China
Morning Post avançou hoje informações semelhantes, noticiando que pelo menos
dois outros representantes dos detidos foram pressionados a afastarem-se do
caso.
O advogado citado pelo jornal diz
ter sido informado pelas autoridades de que "as suspeitas que recaem sobre
estas pessoas são muito graves".
Questionado pela Lusa sobre a
possibilidade de o caso ser transferido para o ministério de Segurança do
Estado, que engloba os serviços de inteligência e a polícia secreta da China,
Lu Siwei disse que é "difícil de dizer, por enquanto".
O sistema judicial chinês, que é
controlado pelo Partido Comunista, partido único do poder na China, prevê o uso
de "vigilância residencial em local designado", que permite às
autoridades manter em local desconhecido acusados de "colocar em perigo a
segurança nacional", por um período até seis meses, sem acesso a advogado
ou contacto com familiares.
Esta forma de detenção é
frequentemente usada contra defensores dos direitos humanos, incluindo
advogados, ativistas ou dissidentes.
Tsz Lun Kok tinha sido detido em
18 de novembro, com outras centenas de estudantes, durante o cerco da polícia à
Universidade Politécnica de Hong Kong (PolyU), que se prolongou de 17 a 29 desse mês, tendo
terminado com a invasão dos agentes ao campus universitário, onde a polícia diz
ter encontrado milhares de bombas incendiárias e armas.
O jovem é acusado em Hong Kong de motim, por
ter participado alegadamente numa manobra para desviar as atenções da polícia
que cercou as instalações do campus, com o objetivo de permitir a fuga de estudantes
refugiados no seu interior.
A antiga colónia britânica
atravessou, no ano passado, a sua pior crise política desde a transferência da
soberania para as autoridades chinesas, em 1997, com protestos diários,
marcados por cenas de vandalismo e confrontos entre a polícia e os
manifestantes.
A chefe do executivo de Hong
Kong, Carrie Lam, disse na terça-feira que os 12 detidos têm de responder às
acusações no continente antes de o governo da região poder intervir.
Tanto o MNE como o Consulado de
Portugal em Macau e Hong Kong afirmaram que estão a acompanhar o caso,
apontando no entanto que "a China não reconhece a dupla nacionalidade a
cidadãos chineses", o que limitaria a intervenção das autoridades
portuguesas "ao domínio humanitário, procurando assegurar que o detido se
encontra bem, que lhe seja dispensado um tratamento digno e que possa ser
defendido por um advogado".
Na segunda-feira, uma porta-voz
do Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE) da União Europeia (UE) disse
igualmente à Lusa que o SEAE está a acompanhar o caso do estudante com
passaporte português, através do seu gabinete em Hong Kong e Macau e do
Consulado de Portugal, mas que não pode prestar "assistência consular
direta aos cidadãos" da União, um assunto que "continua a ser [...]
da competência das autoridades nacionais".
Uma petição a pedir à Casa Branca
a libertação do grupo já ultrapassou as cem mil assinaturas necessárias para receber
resposta de Washington.
JPI (PTA) // VM
Sem comentários:
Enviar um comentário