Díli, 12 set 2020 (Lusa) - O
líder timorense Xanana Gusmão acusou hoje o presidente da Fretilin, maior
partido do país, de "demagogia política" e "grandes
contradições" pela sua posição sobre o projeto de um gasoduto do Mar de
Timor para Timor-Leste.
"Estamos perante uma grande
demagogia, nas declarações do grande líder da Fretilin, quando diz que foi o
primeiro a defender o gasoduto para Timor-Leste, mas que a economia tem regras
e exige estudos de viabilidade, que diz que não foram feitos", afirmou hoje
Xanana Gusmão em Díli.
"Eu quando li isso senti-me
muito confuso. Diz que a Fretilin sempre defendeu, mas mesmo sem ter estudos
convincentes? Então isso não é contradizer-se? Diz que defende, mas chegou a
essa posição sem estudos", sustentou o presidente do Congresso Nacional da
Reconstrução Timorense (CNRT).
Xanana Gusmão reagiu assim a
declarações à Lusa de Mari Alkatiri, secretário-geral da Frente Revolucionária
do Timor-Leste Independente (Fretilin), na sequência de um debate iniciado por
várias entrevistas à Lusa de responsáveis do setor petrolífero no país.
"A Fretilin foi a primeira a
defender o gasoduto do Greater Sunrise para Timor. Mas a economia tem as suas
regras e para começar deve haver estudos de viabilidade. E eu ainda não vi
nada, não vi nenhum estudo que me convencesse", afirmou Alkatiri.
"Não mudámos de linha.
Queremos é poder provar que a linha para onde o país estava direcionado é a
mais viável e benéfica para o país. Ninguém exclui nenhuma opção. Muito menos a
opção de trazer o gasoduto para Timor-Leste, desde que seja viável",
considerou.
Os comentários de Alkatiri
surgiram na sequência de um debate iniciado com declarações à Lusa do novo
ministro do Petróleo e Minerais, Victor Soares, da Fretilin -- que entrou para
o Governo de onde saiu o CNRT de Xanana Gusmão.
Soares substituiu os principais
responsáveis do setor, explicando à Lusa que isso traduz uma nova visão
estratégica para o setor, com declarações que foram criticadas pelo
ex-presidente da petrolífera Timor Gap, Francisco Monteiro, o que, por seu
lado, suscitou fortes críticas da nova direção da petrolífera.
"Que visão estratégica é
essa? A cidadania tem o direito de exigir ao Governo que apresente ao povo essa
visão estratégica para o setor. E mesmo que os cidadãos não exijam, o Governo
tem o dever de apresentar essa nova visão estratégica, tem o dever de prestar
contas aos cidadãos", afirmou.
Xanana Gusmão juntou-se hoje ao
debate sobre o processo que ele próprio liderou -- incluindo o acordo
permanente de fronteiras marítimas com a Austrália e o futuro da partilha do
projeto dos poços do Greater Sunrise.
"Há aqui grande demagogia do
grande líder da Fretilin. Porque não há nenhuma base que regule o raciocínio.
E, já agora, onde estavam os estudos convincentes para o CMATS?", questionou,
referindo-se ao anterior acordo que governava o Mar de Timor, negociado por um
Governo liderado pela Fretilin.
Gusmão criticou igualmente as
declarações de Alkatiri -- que era primeiro-ministro quando em 2018 Timor-Leste
assinou o tratado atual -, recordando que o executivo teve acesso a toda a
documentação.
"O grande líder liderava o
Governo e teve acesso a toda a documentação, sobre as condições e termos do
tratado. Mas agora vem dizer que afinal não estava convencido. Se não estava
convencido por que é que aceitou no Conselho de Ministros assinar o
tratado?", questionou.
O líder timorense falava num
seminário organizado pelo Movimento Profissional de Apoio a Xanana Gusmão,
ligado ao partido que dirige, o Congresso Nacional da Reconstrução Timorense
(CNRT).
Ao novo ministro do setor, Xanana
Gusmão pediu "maturidade política" e que "reflita bem antes de
politizar o assunto, porque este é um assunto de interesse nacional" que
exige que se apresentem informações com "honestidade e transparência",
apelando ao Governo para que promova um debate sobre a questão.
Xanana Gusmão recordou o
"período crítico" de pandemia que o mundo vive, considerando que em
muitos países se pode tornar uma "ameaça para a democracia", com
"abusos e aproveitamentos políticos", defendendo que a situação
obriga a ainda maior "responsabilização da atuação e funcionamento dos
Estados".
Algo especialmente importante na
"democracia em transição" que é Timor-Leste, que depois da grave
crise política de 2006 deve procurar que haja sempre uma "consulta pública
alargada sobre temas de interesse nacional", defendeu.
Nesse sentido, disse, exige-se
que o Governo "atue com responsabilidade, honestidade e transparência
perante o povo", clarificando o que significa a "nova visão
estratégica" anunciada para o setor petrolífero.
Considerando a questão das
fronteiras marítimas e do gasoduto para Timor-Leste aspetos da soberania
nacional, Xanana Gusmão lembrou o combate travado pelos timorenses para
consolidar essa soberania, face à "imoralidade" australiana, durante
a ocupação indonésia do país, o que permitiu que agora "os recursos de
Timor-Leste pertençam a Timor-Leste".
ASP // PTA
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