Díli,
29 set (Lusa) - Um parecer jurídico pedido pelo Governo timorense considera que
"vicissitudes processuais" na fase de instrução do processo contra a
ex-ministra das Finanças que começa a ser julgada na próxima semana podem ter
um "reflexo negativo" na sua defesa.
O
parecer, a que a agência Lusa teve hoje acesso, foi solicitado pelo Executivo
timorense depois de Emília Pires ter exercido, em março, o seu direito de
petição, denunciando o Governo de Timor-Leste e outras entidades pelo que
considera "diversos erros e ilegalidades relativos ao processo-crime"
em que é arguida.
Referindo
várias irregularidades, o parecer concorda com a posição de Emília Pires,
levantando dúvidas sobre alguns aspetos processuais e até sobre a forma como as
medidas de coação foram aplicadas.
"Relativamente
à arguida Emília Pires afigura-se difícil o preenchimento de qualquer um dos
tipos legais de crime que lhe são imputados, sobretudo porque (...) não existem
evidências (nos autos) de que tenha praticado atos relevantes no âmbito dos
procedimentos em questão", lê-se no texto.
Emília
Pires começa a ser julgada na próxima segunda-feira, em Díli, acusada da
prática de crimes de participação económica em negócio e administração danosa
quando ainda era ministra.
Pires
e a ex-vice-ministra da Saúde Madalena Hanjam são arguidas por alegadas
irregularidades na compra de centenas de camas hospitalares em contratos
adjudicados à empresa do marido da ex-ministra das Finanças, com um suposto
conluio entre os três para o negócio, no valor de 800 mil dólares.
O
julgamento foi adiado a 23 de março depois da apresentação pela defesa de
Emília Pires de vários recursos por alegadas irregularidades, entretanto
indeferidos.
No
texto em que exerceu o direito de petição, Emília Pires considera a acusação de
que é alvo "totalmente infundada", afirmando que desde o início do
processo têm ocorrido "violações sistemáticas e graves" dos seus
direitos enquanto arguida e "decisões arbitrárias e incompreensíveis"
da justiça.
"Trata-se
de um exemplo de tudo o que não pode nem deve acontecer num Estado de
Direito", sublinha, detalhando o que diz serem os erros processuais e
outros centrais à sua acusação pela procuradoria timorense.
O
Governo solicitou, em resposta, um parecer independente a uma sociedade de
advogados de Timor-Leste (a Da Silva, Teixeira & Associados), a quem pediu
uma análise de todo o processo.
Nesse
documento, de 121 páginas, os advogados consideram que, no que toca à compra
das camas, Emília Pires se limitou "a receber a justificação de fonte
única de fornecedor proveniente do PM e, por outro lado, a remetê-la, por ser o
competente para o efeito, ao Ministério da Saúde, sem que (...) essa
intervenção possa ser entendida como aprovação da referida justificação".
Nos
dois contratos, sublinha o parecer, o recurso à Reserva de Contingência
Orçamental "foi sempre aprovado pelo primeiro-ministro" pelo que
"as decisões finais não foram tomadas pelas arguidas, mas sim por uma
terceira pessoa: o PM".
"Dos
elementos que constam dos autos, do nosso ponto de vista, e contrariamente à
tese sustentada pelo Ministério Público, não parece existir, no caso,
impedimento nem qualquer conflito de interesses. E não parece existir, desde
logo, porque não vislumbramos na lei nenhum impedimento de participação em
processos desta natureza", refere ainda.
Mas
mesmo que esses impedimentos existissem, prossegue o texto, a acusação não
teria qualquer validade porque a intervenção da arguida "resumiu-se
(apenas) ao procedimento relativo ao recurso à Reserva de Contingência, não
tendo qualquer intervenção a jusante, mormente, na escolha do procedimento
pré-contratual ou até mesmo na escolha do fornecedor".
Motivo
que leva os advogados a concluir que "perante a ausência de factos aptos a
preencher o elemento volitivo do dolo relativamente ao crime de participação
económica em negócio pela arguida Emília Pires" os tribunais deveriam ter
declarado a "nulidade parcial" da acusação.
ASP
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