O Departamento de Comércio dos
Estados Unidos acusou uma empresa local de fugir a taxas alfandegárias impostas
a molas para colchões vindos da China. A Macao Commercial condena a decisão
como “proteccionista”, numa altura de guerra comercial entre Pequim e
Washington.
O Departamento de Comércio dos
Estados Unidos chegou a uma conclusão preliminar de que as molas para colchões
fabricadas em Macau com material vindo da China continental são uma forma de
fugir às medidas ‘anti-dumping’ aplicadas a molas chinesas. A decisão, que pode
impôr uma taxa alfandegária de 234,51 por cento aos produtos da Macao
Commercial and Industrial Spring Mattress Manufacturer, foi publicada ontem no
Boletim Oficial do Governo Federal dos EUA. Nelson Wu, director de vendas da
empresa, disse ao PONTO FINAL que a decisão é “tendenciosa” e proteccionista.
O Presidente dos EUA, Donald
Trump, tem vindo a impôr taxas alfandegárias a inúmeros produtos vindos da
China, que acusa de fomentar competição desleal. O Governo Central já respondeu
impondo também pesadas taxas a produtos norte-americanos. Embora as medidas
‘anti-dumping’ tenham sido impostas às molas chinesas em 2009 e a investigação
à Macao Commercial tenha começado ainda durante a presidência de Barack Obama,
Nelson Wu admite que a decisão tomada agora foi influenciada “em 50 por cento”
pelo cenário de guerra comercial entre a China e os Estados Unidos. “Após Trump
tornar-se Presidente, o caso começou a favorecer” a rival norte-americana
Legget & Platt, que apresentou em 2014 uma queixa contra a Macao
Commercial, diz o empresário.
Causa perdida
Foi em 2009 que o Governo de
Washington impôs uma pesada taxa alfandegária a molas para colchões vindas da
China continental, de forma a combater o ‘dumping’. Ou seja, as autoridades
defenderam que as empresas chinesas estavam a vender estes produtos abaixo do
preço de custo apenas para obrigar a concorrência norte-americana a fechar
portas e garantir um domínio no mercado dos EUA. Nelson Wu reconheceu que a
empresa só foi criada em 2010, após a introdução das medidas ‘anti-dumping’,
“sobretudo a pensar no mercado dos Estados Unidos”. Desde 2014 que as
autoridades têm feito avaliações regulares da Macao Commercial, a cada dois
anos. O director de vendas sublinha que as autoridades dos EUA “não conseguiram
pôr em causa que os nossos produtos sejam feitos em Macau”. A página da empresa
na Internet inclui vídeos das máquinas para comprimir molas em funcionamento no
11º andar de um edifício industrial na Areia Preta.
No entanto, a decisão de ontem do
Departamento do Comércio inverte o ónus da prova e conclui que a Macao
Commercial “não conseguiu demonstrar que não tinha qualquer remessa de molas
feitas na China” continental. “Claro que não concordamos e não queremos aceitar
esta decisão”, diz Nelson Wu. As partes afectadas têm agora 60 dias para
responder, mas no actual cenário o director de vendas da Commercial admite não
estar confiante. “A luta desde o início que não tem sido justa”, lamenta o
responsável.
Empregos em risco
O porta-voz da Macao Commercial
defende que a decisão do Departamento de Comércio vai mesmo contra a lógica
comercial. “Toda a gente sabe que não se produz mais nada em Macau senão
casinos. Não há ninguém que pudesse fabricar a matéria-prima para nós em
Macau”, explicou Nelson Wu. Ou seja, a empresa não teve outra opção senão
importar arame de aço da China continental, que era “a maneira mais barata”,
acrescenta o director de vendas. “Não vamos pagar mais para comprar arame de
aço de outros países asiáticos só para que o Departamento de Comércio fique
contente, não é assim que se fazem negócios”, diz Nelson Wu. Ainda assim, ele
admite que no ano passado a empresa começou a importar também arame de aço de
Portugal.
A taxa alfandegária de 234,51 por
cento vai cobrir até todas as molas que a empresa vendeu para os Estados Unidos
a partir de Novembro de 2016, altura em que começou oficialmente a investigação
por alegada fuga às medidas ‘anti-dumping’. “A decisão vai afectar 100 por
cento das vendas da Macao Commercial”, diz Nelson Wu, que confessa mesmo temer
que os cerca de 20 trabalhadores da empresa tenham os empregos em risco.
A empresa pretende alterar o
modelo de negócio, apostando em outro tipo de produtos e em outros mercados
“para compensar o impacto”, diz o director de vendas. A Macao Commercial tem
estado aliás a tentar transferir da China continental para a RAEM o fabrico de
máquinas de compressão de molas, mas tem tido dificuldade em encontrar unidades
industriais adequadas. Tratando-se de máquinas grandes e pesadas, “obviamente
precisaríamos de um espaço no rés-do-chão”, explica Nelson Wu. Um “plano B” com
o qual a Macao Commercial quer “fazer tudo o que for possível para manter os
empregos”, promete o responsável.
Vítor Quintã | Ponto Final
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