Díli, 04 set (Lusa) - O
parlamento timorense revogou dois decretos aprovados pelo anterior Governo no
início deste ano, que nem chegaram a entrar em vigor, e que alteravam dois
outros polémicos textos legislativos sobre o uso de línguas maternas aplicados desde
2015.
A decisão tomada em agosto,
publicada no Jornal da República, resultou de um debate em que as bancadas da
coligação do Governo (CNRT, PLP e KHUNTO) acabaram por votar a sós. A oposição
(Fretilin e PD) protestou e recusou-se mesmo a votar.
Durante o debate, a ministra da
Educação, Dulce de Jesus Soares, defendeu a revogação dos decretos-leis por
considerar que, no âmbito dos anteriores, tinha decorrido um projeto-piloto nos
municípios de Lospalos, Manatuto e RAEOA (Região Administrativa Especial de
Oecússi Ambeno), sobre a implementação das línguas maternas no processo de
aprendizagem, que disse revelar uma mudança significativa e que ajudou muitas
das crianças a aprender mais.
Posição contestada pela oposição
que disse que na implementação das línguas maternas no processo de aprendizagem
não há eficiência e que o Governo deve traçar uma política de educação mais
clara, especialmente no que diz respeito ao currículo, para que se ensine a
língua tétum e o português - línguas oficiais - no ensino básico.
A decisão parlamentar é o
episódio mais recente num assunto que há muito divide os responsáveis políticos
timorenses, especialmente no setor educativo: o uso de línguas maternas no
ensino pré-escolar e início do ensino básico, empurrando para mais tarde um
maior uso do português.
O assunto levou o Governo de
então a aprovar em 2015 dois decretos - o 3/2015 sobre o currículo nacional de
base da educação pré-escolar e o 4/2015 sobre o currículo do 1.º e 2.º ciclo do
ensino básico.
Numa das suas últimas decisões
antes da dissolução do anterior parlamento, o VII Governo - apoiado pela
coligação minoritária da Fretilin e do PD - tinha aprovado em janeiro
alterações a esses decretos, argumentando que se tratava de refletir os
resultados do 3.º Congresso Nacional da Educação, que decorreu em 2017 em Díli.
Centrados em "quatro grandes
alterações" esses decretos - que deveriam entrar em vigor no inicio de
2019 - abrangiam questões como "a definição das línguas oficiais com
línguas de ensino, dando prioridade ao português como língua de ensino e ao
tétum como língua de suporte".
As línguas nacionais eram
definidas como "património cultural e histórico, para terem o devido
tratamento nessa área".
O Governo deliberou ainda
duplicar a carga horária mínima do ensino pré-escolar, de duas para quatro
horas por dia, sendo ainda reajustada a carga horária "para o ensino da
capacidade linguística em tétum e português".
Na defesa da sua proposta no
Conselho de Ministros, o Ministério da Educação destacava "a necessidade
de estabilidade e coerência em termos de aplicação de políticas educativas em
Timor-Leste" e ainda "a necessidade de clarificar posições referentes
às línguas a utilizar no sistema educativo".
Essa decisão de janeiro acabou
por causar polémica com várias organizações nacionais e 70 cidadãos timorenses
a escreverem ao Presidente da República a expressar preocupação sobre as
alterações aos currículos do pré-escolar e primeiro ciclo que consideraram
terem sido feitas sem avaliação científica adequada.
A carta refere que as alterações
foram aprovadas de forma "súbita" e vão contra vários estudos que
apoiavam o currículo em vigor.
ASP // JMC
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