sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Fretilin insiste na exigência de dois terços para ultrapassar veto presidencial timorense


Díli, 30 jan (Lusa) -- O líder da Fretilin disse hoje "não ter qualquer dúvida" de que é necessária uma maioria de dois terços dos deputados do parlamento de Timor-Leste para ultrapassar o veto presidencial ao Orçamento Geral do Estado (OGE) de 2019.

"Não tenho dúvidas nenhumas que é necessário uma maioria de dois terços", disse à Lusa Mari Alkatiri, secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), atualmente na oposição e partido que controlava uma ampla maioria na assembleia constituinte que aprovou a constituição timorense.

Em declarações à Lusa, Alkatiri criticou um parecer feito, a pedido do Governo, pelo constitucionalista português Pedro Bacelar de Vasconcelos e pelo jurista Ricardo Cunha, no qual se sustenta que o veto presidencial pode ser ultrapassado com maioria simples.

"Foi um parecer encomendado à medida. Ele dá opiniões à medida do encomendado. E se forem por esse caminho [de tentar aprovar o OGE com maioria simples] a aprovação não tem legitimidade", considerou.

Alkatiri diz que depende do Presidente decidir o que fazer caso as bancadas da maioria do Governo decidirem reconfirmar o texto orçamental, sem alterações, apenas com uma maioria simples.

"Não sei o que acontece. Depende do Presidente. Tentam sempre dizer que eu é que comando o Presidente, mas isso é absolutamente falso. Há alguém neste país que está sempre a querer comandar todos e é a mesma pessoa: Xanana Gusmão", afirmou, referindo-se ao líder da coligação do Governo.

Em declarações à Lusa na terça-feira, Pedro Bacelar de Vasconcelos defendeu que a proposta de Orçamento vetada pelo Presidente da República timorense requer apenas maioria simples dos deputados para ser novamente confirmada pelo parlamento e, necessariamente, promulgada pelo Presidente.

"Não é sequer ambíguo que a confirmação carece apenas de maioria simples dos deputados em efetividade de funções", disse.

 "O OGE não é bem uma lei como a generalidade das leis, universal e abstrata. É uma autorização para o Governo adquirir os meios indispensáveis para executar o programa do Governo, as suas políticas para governar", considerou Bacelar de Vasconcelos.

Daí que "não faria sentido que através de veto que requeresse maioria qualificada o Presidente passasse-se a ter o voto de qualidade na aprovação dos recursos indispensáveis para o Governo concretizar o seu programa", afirmou.

Bacelar de Vasconcelos recordou que a constituição timorense foi aprovada pela Fretilin -- partido do atual Presidente da República e que está na oposição no parlamento -- "precisamente para evitar que [o então Presidente e agora líder da coligação do Governo] Xanana Gusmão quisesse depois vir mexer na definição das políticas do Governo".

"O PR de Timor-Leste não governa nem tem competências para governar. A aprovação do OGE é uma autorização do parlamento ao Governo para governar", disse.

Questionado sobre as suas divergências com Bacelar de Vasconcelos na interpretação da constituição, Alkatiri afirmou que o constitucionalista não escreveu um único artigo do texto.

"Somos amigos, mas a nível da interpretação da constituição, disse-lhe várias vezes que não vale a pena discutirmos. E ele não escreveu nem sequer um artigo para esta constituição. Foi afastado de Timor-Leste pela UNTAET [a administração transitória da ONU], antes disso", afirmou.

Alkatiri rejeita o que diz serem "especulações" de Bacelar de Vasconcelos sobre as motivações da feitura da constituição, afirmando que os membros da assembleia fizeram uma lei base "para criar um país sustentável e não para travar ninguém".

O líder da Fretilin considera que o OGE aprovado pelo parlamento e depois vetado pelo Presidente e devolvido ao parlamento -- que vai ser reapreciado na quinta-feira -- "já não reflete a política do Governo.

"Se olharmos para o programa e para a proposta final do OGE, vemos que já não é a política do Governo. O que determinou este desvio é a vontade de uma única pessoa prevalecer, Xanana Gusmão", disse.

Alkatiri insiste que é importante "respeitar a opinião de todos", garante que o país "já não suporta a nível económico, político e social" um cenário de novas eleições antecipadas, e renova a defesa de um diálogo, extraparlamentar, para resolver o impasse político.

 "Sou a favor do diálogo, tendo andado a insistir nisso e se há alguém que diz que não quer dialogar não sou eu. Todos nós temos responsabilidade [na situação atual] porque este país funciona também porque além dos órgãos de soberania ainda há um magistério de influência de algumas pessoas", afirmou.

"Não vejo outro caminho, se realmente há vontade em servir este povo, se há vontade de se avançar de forma sustentável no desenvolvimento do país", disse.

Alkatiri considera que "a sustentabilidade significa inclusão e não exclusão" e que "inclusão não significa ter que estar no Governo ou no parlamento", mas sim "que todos têm que ser ouvidos, as suas opiniões respeitadas, mesmo que não aceites".

"Sem insultos e sem menosprezar. Toda a exclusão cria problemas políticos, económicos e sociais. Vêm da exclusão. Até dentro da família", sustentou.

ASP // JMC

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