Díli, 30 jan (Lusa) -- O
líder da Fretilin disse hoje "não ter qualquer dúvida" de que é
necessária uma maioria de dois terços dos deputados do parlamento de
Timor-Leste para ultrapassar o veto presidencial ao Orçamento Geral do Estado
(OGE) de 2019.
"Não tenho dúvidas nenhumas
que é necessário uma maioria de dois terços", disse à Lusa Mari Alkatiri,
secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente
(Fretilin), atualmente na oposição e partido que controlava uma ampla maioria
na assembleia constituinte que aprovou a constituição timorense.
Em declarações à Lusa, Alkatiri
criticou um parecer feito, a pedido do Governo, pelo constitucionalista
português Pedro Bacelar de Vasconcelos e pelo jurista Ricardo Cunha, no qual se
sustenta que o veto presidencial pode ser ultrapassado com maioria simples.
"Foi um parecer encomendado
à medida. Ele dá opiniões à medida do encomendado. E se forem por esse caminho
[de tentar aprovar o OGE com maioria simples] a aprovação não tem
legitimidade", considerou.
Alkatiri diz que depende do
Presidente decidir o que fazer caso as bancadas da maioria do Governo decidirem
reconfirmar o texto orçamental, sem alterações, apenas com uma maioria simples.
"Não sei o que acontece.
Depende do Presidente. Tentam sempre dizer que eu é que comando o Presidente,
mas isso é absolutamente falso. Há alguém neste país que está sempre a querer
comandar todos e é a mesma pessoa: Xanana Gusmão", afirmou, referindo-se
ao líder da coligação do Governo.
Em declarações à Lusa na
terça-feira, Pedro Bacelar de Vasconcelos defendeu que a proposta de Orçamento
vetada pelo Presidente da República timorense requer apenas maioria simples dos
deputados para ser novamente confirmada pelo parlamento e, necessariamente,
promulgada pelo Presidente.
"Não é sequer ambíguo que a
confirmação carece apenas de maioria simples dos deputados em efetividade de
funções", disse.
"O OGE não é bem uma
lei como a generalidade das leis, universal e abstrata. É uma autorização para
o Governo adquirir os meios indispensáveis para executar o programa do Governo,
as suas políticas para governar", considerou Bacelar de Vasconcelos.
Daí que "não faria sentido
que através de veto que requeresse maioria qualificada o Presidente passasse-se
a ter o voto de qualidade na aprovação dos recursos indispensáveis para o
Governo concretizar o seu programa", afirmou.
Bacelar de Vasconcelos recordou
que a constituição timorense foi aprovada pela Fretilin -- partido do atual
Presidente da República e que está na oposição no parlamento --
"precisamente para evitar que [o então Presidente e agora líder da
coligação do Governo] Xanana Gusmão quisesse depois vir mexer na definição das
políticas do Governo".
"O PR de Timor-Leste não
governa nem tem competências para governar. A aprovação do OGE é uma
autorização do parlamento ao Governo para governar", disse.
Questionado sobre as suas
divergências com Bacelar de Vasconcelos na interpretação da constituição,
Alkatiri afirmou que o constitucionalista não escreveu um único artigo do
texto.
"Somos amigos, mas a nível
da interpretação da constituição, disse-lhe várias vezes que não vale a pena
discutirmos. E ele não escreveu nem sequer um artigo para esta constituição.
Foi afastado de Timor-Leste pela UNTAET [a administração transitória da ONU],
antes disso", afirmou.
Alkatiri rejeita o que diz serem
"especulações" de Bacelar de Vasconcelos sobre as motivações da
feitura da constituição, afirmando que os membros da assembleia fizeram uma lei
base "para criar um país sustentável e não para travar ninguém".
O líder da Fretilin considera que
o OGE aprovado pelo parlamento e depois vetado pelo Presidente e devolvido ao
parlamento -- que vai ser reapreciado na quinta-feira -- "já não reflete a
política do Governo.
"Se olharmos para o programa
e para a proposta final do OGE, vemos que já não é a política do Governo. O que
determinou este desvio é a vontade de uma única pessoa prevalecer, Xanana
Gusmão", disse.
Alkatiri insiste que é importante
"respeitar a opinião de todos", garante que o país "já não
suporta a nível económico, político e social" um cenário de novas eleições
antecipadas, e renova a defesa de um diálogo, extraparlamentar, para resolver o
impasse político.
"Sou a favor do
diálogo, tendo andado a insistir nisso e se há alguém que diz que não quer
dialogar não sou eu. Todos nós temos responsabilidade [na situação atual]
porque este país funciona também porque além dos órgãos de soberania ainda há
um magistério de influência de algumas pessoas", afirmou.
"Não vejo outro caminho, se
realmente há vontade em servir este povo, se há vontade de se avançar de forma
sustentável no desenvolvimento do país", disse.
Alkatiri considera que "a
sustentabilidade significa inclusão e não exclusão" e que "inclusão
não significa ter que estar no Governo ou no parlamento", mas sim
"que todos têm que ser ouvidos, as suas opiniões respeitadas, mesmo que
não aceites".
"Sem insultos e sem
menosprezar. Toda a exclusão cria problemas políticos, económicos e sociais.
Vêm da exclusão. Até dentro da família", sustentou.
ASP // JMC
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