domingo, 12 de junho de 2016

BRASIL, PAIS TROPICAL E RACISTA NÃO É ABENÇOADO POR DEUS – vergonha da lusofonia


O Brasil é um país da lusofonia onde o racismo se expande e está em alta. Como alguns brasileiros dizem: “se não é branco é atirado para o escanteio.” Significa que é atirado para o canto. É desprezado, é maltratado, é vítima de racismo. Sejam índios, pardos (mulatos) negros, amarelos, o racismo está presente nas atitudes ostensivas e racistas de apartheid de inúmeros brasileiros brancos. A exclusão dos que são vítimas da pobreza é outra espécie de racismo que é preponderante no Brasil, país tropical que é impossível ser abençoado por Deus – como diz a canção – e que também devido ao racismo não é bonito por natureza.

Uma das demonstrações flagrantes do racismo no Brasil vem referida na comunicação social (entre tantas outras). O racismo brasileiro não olha a idades, nem mesmo se for criança. O que vem de mostra a seguir, retirado de Global Voices, é demonstrativo daquele sentimento e postura intolerante (racista) que prepondera na sociedade brasileira, sem vergonha, ostensivamente.

Felizmente que não são todos os brasileiros, mas são em demasia os que subjugam e exibem preconceito contra a maioria da população brasileira, composta exatamente por índios, pardos (mulatos), negros e pobres. Há os que comparam a situação racial no Brasil com a África do Sul de há décadas anteriores. Uma vergonha na lusofonia. (TA)

Vítima de racismo em escola, menina é obrigada a pedir desculpas aos agressores

Desde que Camila dos Santos Reis consegue lembrar, a filha Lorena, de 12 anos, sempre foi uma menina doce, que gosta de correr pelo Parque Ibirapuera, em São Paulo, e assistir desenhos da Disney. No entanto, desde a volta às aulas esse ano, Lorena estava diferente — mais quieta, retraída. Era uma noite de março quando Camila recebeu uma ligação da escola avisando que Lorena seria transferida de turma porque “os colegas não se adaptaram a ela”.

Foi difícil para Camila entender. As duas sempre foram muito próximas, era estranho que Lorena não tivesse contado nada. Quando a mãe a procurou, ela explicou: tinha vergonha. Desde o início do ano letivo, Lorena — que é negra — estava sofrendo bullying e racismo na escola.

No mesmo dia em que Camila recebeu a ligação, Lorena havia procurado a direção para reclamar dos ataques. Mas, segundo Camila, a escola só tomou medidas para identificar quem estava por trás dos atques duas semanas depois. Quando os outros alunos souberam que Lorena teve que nomear os agressores, acabou sendo confrontada, como conta o post da página Preta e Acadêmica:

"No espaço da escola, seus “colegas” começaram a questionar sobre o ocorrido, e como ela pode ter os dedurado, iniciando uma gritaria contra a criança, que correu para os braços da diretora do colégio. A diretora, que “já está de saco cheio dessa história” (palavras da própria), resolveu fazer uma acareação. O resultado? Lorena teve que pedir desculpas para seus agressores."

Por fim, a diretora perguntou se a menina gostaria de trocar de turma e Lorena, cansada, aceitou.

Quatro dias depois, as coisas pioraram. Como Camila contou em seu perfil do Facebook, compartilhado por mais de 74 mil pessoas, Lorena lhe enviou uma mensagem com a frase: “Olha como eu sofro”, seguida de uma série de áudios.

(…) coloquei meu fone no ouvido, e apertei o botão “REPRODUZIR”, que susto eu levei… logo a primeira frase gritada em alto e bom som foi “SUA PRETA, TESTA DE BATER BIFE DO CARA*****”, foram 53 segundos de ofensas horrorizantes, palavrões ofensivos, a nível físico, racial e por incrível que pareça sexual, vinda de um garoto de aproximadamente 13 anos morador do condomínio onde vivemos.

Um grupo formado por 20 crianças — alguns da escola de Lorena, outros, seus vizinhos em São Bernardo do Campo — usaram um grupo no Whatsapp para seguir com as agressões contra Lorena. Camila conta no mesmo post:

Pedi para ela me mandar todos os áudios que tinha recebido, uma sequência de mais de 20 áudios aproximadamente, então percebi que os áudios estavam sendo enviados de um grupo de amizade da qual ela faz parte. Todos os participantes do grupo são do condomínio, onde 2 meninos a ofendiam enquanto alguns outros incentivavam as ofensas.
As frases que mais marcaram e mais me assustaram foram:

“SUA PRETA, TESTA DE BATE BIFE DO CARA******!”

“EU SOU RACISTA MESMO, QUANDO EU QUERO SER RACISTA EU SOU RACISTA, ENTENDEU?”

“TODA VEZ QUE EU ENCONTRAR ELA NA MINHA FRENTE EU VOU ZUAR ATÉ ELA CHORAR”

“VOCÊ VAI FICAR NESTE GRUPO ATÉ VOCÊ CHORAR”

“CABELO DE MOVEDIÇA, CABELO DE MIOJO, CABELO DE MACARRÃO”

Muitos dos colegas ficaram quietos e preferiram não se manifestar, um deles até saiu do grupo quando as ofensas começaram, teve outro que se revoltou e disse que estavam passando dos limites e que aquilo já era desrespeito demais.

Entrei em choque, diante de tantas agressões psicológicas, tamanha inconsequência dessa juventude que ainda nos dias de hoje se comporta de maneira tão cruel, não posso encarar essa situação como “coisa de criança”, racismo nunca foi coisa de criança.

Por envolver menores de idade, o caso foi encaminhado ao Conselho Tutelar. Dentro da escola, não houve nenhuma punição aos agressores ou mesmo uma tentativa de abordar a agressão com os envolvidos.

Em entrevista ao Global Voices, Camila revelou que isso foi o que a deixou mais indignada.

“É o errado vencendo o certo, trocou de turma, mas os alunos não foram conscientizados do erro que estavam cometendo, e nos corredores da escola quando se encontrassem, como seria? Eles iam continuar ofendendo ela? Recebi uma ligação da escola no período da noite me informando que ela seria trocada de turma porque não houve uma adaptação. Como assim? E na sociedade aonde eu coloco ela?”.

“Não é bullying, e sim racismo”

O que aconteceu com Lorena parece denominador comum na infância de alunos negros. É a experiência de vida de milhares de meninas negras que passam pelos anos de escola tendo que ouvir piadas sobre seus cabelos e a cor da pele. Todas vítimas de racismo, não bullying.

Para diferenciar as duas formas de preconceito, em 2013, um grupo de 21 mulheres negras resolveu reunir suas histórias de escola no livro “Negras (in)confidências: Bullying, não. Isto é racismo”, onde explicam:

As organizadoras fazem questão de afirmar que o que ocorre com as crianças negras não é bullying e sim racismo, pois, no primeiro caso, a maior parte das agressões acontece sem a presença dos adultos e os que sofrem a agressão tendem a cometer atos de agressão por terem sofrido agressões, mas não falam sobre o assunto. O racismo, no entanto, é uma ideologia que afirma uma raça superior a outra; a ideologia é tão difundida que as agressões ocorrem tanto na presença de adultos, como os mesmos as promovem, assim, mesmo que as crianças procurem ajuda na escola, não a obterão, o que aumenta a sensação de injustiça e solidão. Acreditam que o bullying inferioriza e o racismo, para além de inferiorizar, desumaniza o ser humano.

Uma pesquisa realizada pela Fundação Institucional de Pesquisas Econômicas (Fipe), em 2009, mostrou que o preconceito étnico-racial é o segundo mais forte nas escolas brasileiras, atrás apenas de preconceito por questões físicas, como obesidade. O estudo ouviu professores, funcionários e alunos de 500 escolas em todo o país. Apenas 5% dos entrevistados eram negros.

Em 2003, a assinatura da lei 10.639, tornando o ensino da “História e Cultura Afro-Brasileira” temática obrigatória nas escolas, parecia anunciar uma mudança no sistema. Mas não foi bem assim. Dez anos depois, num artigo na Revista Fórum, o professor Dennis Oliveira, membro do Núcleo de Pesquisas e Estudos Interdisciplinares sobre o Negro Brasileiro (Neinb), apontou entre os problemas na implementação da lei a resistência de cursos superiores de pedagogia em incluir a matéria no currículo e, consequentemente, a falta de professores com formação nela.

Viviane de Paula, em artigo publicado no site Blogueiras Negras, afirma que “o ambiente escolar é ainda agente opressor para muitas identidades”, algo que tanto o Estado quanto as comunidades escolares ainda não conseguem reconhecer:

A escola, sem dúvidas, é um espaço sócio-cultural que deve aceitar e, sobretudo, discutir amplamente a pluraridade cultural, até mesmo como uma maneira de desconstruir preconceitos. O que muitas vezes presencia-se nas escolas são atitudes de descaso e silenciamento por parte da gestão escolar. Observa-se que os gestores de instituições públicas e privadas não se posicionam: é mais fácil esconder, do que problematizar.

#SomosTodasLorena

Depois de tudo o que aconteceu na escola, Lorena só queria ver o pai, a mãe e a melhor amiga. “Isso gerou uma insegurança muito grande nela, além da resistência em ir para a escola, ela está tendo muita dificuldade de dormir, acorda de madrugada e não consegue mais pegar no sono, e o apetite dela diminuiu muito”, contou Camila em entrevista ao GV.

Ainda assim, o apoio que Camila encontrou nas redes sociais desde que contou a história da filha revela que a internet se abriu como espaço de afirmação a tudo aquilo que é ignorado fora da rede. “Diante da proporção que este caso tomou e da quantidade de mensagens de apoio, ajuda e carinho que recebemos, acredite, existem muito mais pessoas do bem do que do mal”, comentou em entrevista ao GV.

Logo após a publicação do relato no Facebook, um sociólogo escreveu para Camila se oferecendo para realizar um treinamento com o corpo docente da escola sobre medidas socioeducativas a serem tomadas nesse tipo de situação. A escola aceitou, mas depois voltou atrás.

Segundo Camila, ainda há muito para acontecer até a conclusão do caso. A hashtag #SomosTodasLorena começou a circular mostrando mães e comunidades dedicadas a exaltar os cabelos crespos, como o grupo As Vantagens de se Enrolar.

Desde que sua história apareceu na internet, Lolô (como Lorena é carinhosamente chamada) adotou um black power. Um começo para ela descobrir como ela é linda e tem poder.

Foto: Lorena, de 12 anos, e a mãe Camila. (Foto: Facebook/Imagem utilizada com permissão)

Fernanda Canofre – Global Voices (título e introdução de Timor Agora)

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