Díli,
03 jun (Lusa) - Um cidadão português retido há quase dois anos em Díli escreveu
uma carta aberta às principais autoridades timorenses em que considera estar a
ser tratado injustamente e pede para que o seu processo seja arquivado ou
julgado.
"Compreendemos
que Timor-Leste é um país jovem e que precisa ainda de muitas melhorias,
especialmente no sector da justiça. Mas não deveria dar exemplos que ofereçam
ao seu povo a segurança jurídica e a confiança que merecem?", escreve
Tiago Guerra, retido pelas autoridades por suspeita de branqueamento de
capitais.
"Exortamos
os organismos responsáveis para que juntos, num esforço de cooperação
horizontal, decidam fazer uma acusação ou o arquivamento do caso", refere
no texto a que a Lusa teve acesso.
A
carta está endereçada ao Presidente da República, Taur Matan Ruak, ao
presidente do Parlamento Nacional, Adérito Hugo da Costa, ao primeiro-ministro,
Rui Maria de Araújo e ao presidente do Tribunal de Recurso, Guilhermino da
Silva.
Está
ainda endereçada ao ministro da Justiça, Ivo Valente, ao procurador-geral, José
Ximenes, ao provedor dos Direitos Humanos e da Justiça, Silvério Pinto, ao
presidente da Comissão para a Reforma Legislativa do Setor da Justiça, José
Graça e à primeira-dama, Isabel Ferreira.
A
carta foi remetida às autoridades no mesmo dia em que o procurador-geral
timorense garantiu à Lusa que o Ministério Público está prestes a terminar a
investigação no processo e que entre "agosto e outubro" o caso é
arquivado ou segue para julgamento.
"Pedimos
informações a outros países, já recebemos respostas a cartas rogatórias de
Portugal e Macau mas estamos à espera de outras diligências para complementar o
caso", disse José Ximenes.
"Esperamos
completar a investigação no mês de junho e podemos acusar ou arquivar o
processo depois disso. No máximo entre agosto e outubro, dependendo das provas,
será acusado ou arquivado", afirmou o responsável do Ministério Público
timorense.
José
Ximenes rejeitou que já tenham sido ultrapassados todos os prazos legais no
processo, afirmando que o "arguido está fora da prisão" e tem como
medida de coação o TIR (termo de identidade e residência), escusando-se a tecer
mais comentários adicionais sobre o processo.
Tiago
Guerra foi detido há quase 20 meses em Timor-Leste e desde então não pode sair
do país e continua sem acusação formal, insistindo em que "todos os
prazos" foram ultrapassados.
"Eu,
Tiago Guerra, e minha mulher, Fong Fong Guerra, sentimos que temos sido
tratados injustamente pelo Estado de Timor Leste. Temos aguardado
pacientemente, à espera que o mal-entendido fosse resolvido, para que nos
pudéssemos finalmente reunir com os nossos filhos menores e com a nossa
família", escreve.
"No
entanto, tal não aconteceu. Já passaram quase dois anos desde que tudo começou,
sem que nos tenha sequer sido dada a oportunidade de sermos ouvidos e de nos
defendermos, antes pelo contrário, continuamos obrigados a estar separados dos
nossos filhos e família", sublinha.
Na
carta aberta Tiago Guerra faz uso do seu direito de petição aos principais
dirigentes do país e manifesta preocupação pelo estado de saúde da mulher.
"Durante
todo este período, tudo o que assistimos e por que passámos tem sido resultado
da presunção de culpa e negligência por parte das entidades responsáveis.
Gostaríamos de chamar a atenção de Suas Excelências para a nossa situação e
solicitar que a vejam como uma violação dos direitos humanos onde a saúde, em
particular o estado dos pulmões da minha mulher e as questões de família que
necessitam de solução urgente", escreve.
Tiago
Guerra - ele próprio hospitalizado duas vezes de emergência durante a sua
permanência em prisão preventiva na cadeia de Becora - confirmou à Lusa que nas
últimas semanas o estado de saúde da sua mulher se tem vindo a deteriorar.
"Está
num estado de saúde muito débil, com hemorragias pulmonares constantes que a
obrigaram já por várias vezes a recorrer ao Hospital Guido Valares, onde foi
internada de urgência", disse, explicando que Fong Fong sofre de
bronquiectasia, a dilatação irreversível dos brônquios devido à destruição dos
componentes elásticos e musculares de sua parede.
O
casal está preocupado com o facto de terem recebido opiniões de especialistas
no estrangeiro que lhes recomendam várias alternativas existentes para mitigar
os efeitos da doença, mas que não estão disponíveis em Timor-Leste.
Por
isso Tiago Guerra apela às autoridades timorenses para que tenham essa
informação em conta.
Explica
que o casal está com documentos pessoais confiscados, património em Timor-Leste
e no estrangeiro congelado, separado dos filhos e resto da família e obrigado
"a depender da caridade dos nossos amigos e familiares".
"Este
é um grave problema de violação dos direitos humanos, no entanto as autoridades
parecem não o ver dessa forma. Recusam-se a ver que nenhuma empresa irá nos
empregar sem documentos legais, visto de trabalho ou contas bancárias",
escreve.
"Parecem
não reconhecer que as nossas vidas e as da nossa família estão paradas, que a
nossa reputação foi destruída sem o direito legal a uma hipótese de defendê-la
e limpar o nosso nome", considera ainda.
ASP
// APN
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