Díli,
17 fev (Lusa) - Uma ex-ministra timorense condenada em dezembro a sete anos de
prisão por participação económica em negócio pediu o afastamento do presidente
do Tribunal de Recurso do processo por este ter feito declarações do caso ainda
em fase de recurso.
O
pedido de suspeição contra Guilhermino da Silva, a que a Lusa teve acesso, foi
apresentado esta semana na sequência de declarações que o presidente da única
instância superior em Timor-Leste fez a um jornal timorense no passado dia 08
de fevereiro.
Nesse
texto a defesa nota que apesar de estarem ainda a decorrer recursos, o juiz
"não se coibiu de insinuar que a arguida é corrupta e que ele próprio
concorda com a decisão condenatória do Tribunal de primeira instância e,
concretamente, com a pesada pena que lhe foi aplicada.
Questiona
ainda o facto de o juiz ter tomado posição pública, "afirmando que não
existe fundamento para o pedido", sobre o recurso da decisão de
indeferimento do pedido de delegação do procedimento penal nas autoridades
portuguesas, que ainda está por apreciar.
Declarações,
refere a defesa, que indiciam que o juiz "violou diversos deveres a que
está vinculado, princípios básicos do Estado de direito democrático e um
conjunto vasto de direitos fundamentais da arguida e recorrente Emília
Pires", refere.
A
defesa considera que o juiz "violou de forma flagrante o princípio da
presunção de inocência" e que as suas declarações são "uma gravíssima
violação dos deveres (...) de exercer a sua função com honestidade, isenção,
imparcialidade e dignidade (...), de tratar com urbanidade e respeito os
intervenientes do processo e (...) de abster-se de manifestar, por qualquer
meio, opinião sobre processo pendente de julgamento ou decisão ou emitir juízo
sobre despachos, pareceres, votos ou sentenças de órgãos judiciais".
A
defesa pede que Guilhermino da Silva "seja impedido de integrar o coletivo
que apreciará os recursos" mas considera que o seu afastamento "não
será suficiente para assegurar um julgamento independente e imparcial
porquanto, os seus pré-juízos e convicções públicas, inevitavelmente,
influenciaram e influenciarão os restantes membros do Tribunal".
Daí
que a defesa "irá requerer ao Conselho Superior da Magistratura e demais
entidades com competências no setor da Justiça que tomem medidas adequadas a
garantir um julgamento justo e imparcial".
No
artigo do jornal Timor Post, Guilhermino da Silva faz vários comentários sobre
o caso referindo-se a questões como a ausência de Emília Pires de Timor-Leste,
o debate sobre a sua dupla nacional (timorense e portuguesa) e a decisão do
Tribunal Distrital de Díli, que condenou Emília Pires a sete anos de prisão e a
ex-vice-ministra da Saúde, Madalena Hanjam, a quatro anos de prisão.
"As
pessoas ameaçam, mas isso é normal, antes as pessoas eram contra o tribunal
porque defendia pessoas corruptas dentro do governo, mas a realidade demonstra
que sempre são condenadas na mesma, por isso é que no dia 20 de dezembro o
Tribunal de Díli já deu a sua decisão que Emília Pires tem de ser castigada por
sete anos e a Madalena Hanjam será castigada por quatro anos, isto já está
certo" disse Guilhermino, citado no jornal.
O
jornal cita ainda uma declaração do juiz que considera que o pedido de
transferência de Emília Pires do processo para Portugal (na fase de recurso)
"não tem base porque entre estes dois Estados não existe nenhum acordo que
fale sobre esse assunto".
"Por
isso o Presidente do Tribunal de Recurso acredita que, quer queira ou não, é
melhor a arguida vir cá responder porque não existe outro caminho",
conclui o artigo.
A
defesa de Emília Pires sustenta que o juiz "fez várias considerações que
revelam a sua posição relativamente a um conjunto de questões da máxima
relevância, que foram submetidas à apreciação do tribunal a que preside, mas
que ainda não foram julgadas".
As
considerações "denotam que o Meritíssimo Juiz Presidente do Tribunal de
Recurso antipatiza com a posição da arguida e recorrente Emília Pires e que não
tem qualquer pudor em anunciá-lo publicamente".
No
texto remetido ao tribunal a equipa de advogados de Emília Pires, do escritório
português Quatrecasas, considera particularmente grave o facto de o juiz fazer
declarações sobre o processo quando "ainda não tomou conhecimento dos
vários recursos e das respostas aos recursos interpostos pelos vários intervenientes
processuais.
Recorde-se
que o seu processo - em que também foi condenada a ex-vice-ministra da Saúde,
Madalena Hanjam - está pendente de três recursos, dois da defesa (que pedem a
absolvição) e um do Ministério Público que pede um agravamento de penas.
Estão
ainda pendentes "diversas decisões interlocutórias que afetaram
sobejamente os direitos da arguida, entre as quais a decisão de indeferimento
do pedido de delegação do procedimento penal nas autoridades portuguesas e a
decisão de substituição da medida de coação de proibição de se ausentar para o
estrangeiro sem autorização pela prisão preventiva".
O
caso de Emília Pires tem suscitado polémica tanto no setor judicial como no
político com a ex-ministra e o seu antigo chefe, Xanana Gusmão, a escreverem
cartas abertas em que apontam o dedo a várias irregularidades e problemas no
setor da justiça.
ASP//ISG
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