Díli,
16 jul (Lusa) - Natércia Tilman estuda direito, mas é na escola da cozinha
aberta do Agora Food Studio, em Díli, um laboratório onde todos os dias se
fazem experiências com produtos timorenses, que testa outra vocação: fazer
sobremesas.
"Ainda
não inventei nada. Mas já aprendi muita coisa. A fazer quiche e bolo de
chocolate. Fazer coisas novas com produtos timorenses", disse à Lusa.
O
restaurante/escola funciona no segundo andar de um dos principais centros de
formação de línguas no país, o LELI, num espaço onde a cozinha é aberta e onde
os empregados recebem quem chega para almoçar com boas vindas em coro.
Toda
a parede do fundo é um quadro de lousa onde os funcionários e os clientes
registam de tudo um pouco e onde um dia pode haver desenhos do Asterix, no
outro uma casa tradicional timorense, um organigrama da cozinha ou um mapa
alimentar de Timor-Leste.
As
inspirações podem ser de fora - com fusão com cozinha japonesa, mediterrânica
ou outra - mas os produtos são todos locais, desde o 'bar' de café, onde se
podem degustar grãos de todo o país, ou o 'Budi Bar', onde se mostra a arte
timorense de fazer pickles.
Lúcia
Fernandes, 21 anos e chefe da cozinha, explica que o Agora lhe permite cozinhar
e ser criativa: "todas as semanas testamos coisas, pensamos em formas
diferentes de fazer". Depois provam e, se funciona, esse é o menu da
semana.
Talvez,
no futuro, abra um restaurante seu. "Mas será sempre com comida timorense.
Há produtos que se foram perdendo porque as pessoas deixaram de os saber
cozinhar. A avó sabia, mas morreu e a geração mais jovem já não sabe como se
faz", explica.
Hoje,
por exemplo, o menu Obendo permitia degustar-se 'tapas' japonesas feitas com
flor de bananeira, feijão vermelho, farinha de cassava, feijão verde e 'budu'
de papaia, um condimento feito com lima, pimenta, sal, cebola e óleo de coco.
No
prato vai também fos mean (o arroz vermelho de Maliana) com kalik, um fruto que
tem que ser cozinhado 12 vezes antes de poder ser consumido.
Aqui
tudo é local, desde os condimentos - pimenta, sal, curcuma ou gengibre - aos
outros ingredientes - farinha de cassava, flor de bananeira, tamarindo, tomate
ou a 'mostarda', uma hortaliça que se assemelha ao grelo.
Há
pão de banana e bebidas pouco usuais: sumo de tamarindo e menta, sumo de
curcuma, tomate e banana, sumo de graviola ou então um copo de lekirauk ikun,
literalmente 'Cauda de Macaco', um cato de flores vermelhas que cresce perto
das plantas do café.
Maioritariamente
frequentado por estrangeiros, o Agora trabalha com o que há no mercado,
incorporando a sazonalidade como exigência e principio.
"Era
bom que os timorenses viessem cá mais para ver que não temos que importar tanto
os produtos dos outros países", diz Natércia Tilman, de 19 anos.
O
projeto que arrancou há cerca de um ano é de um casal australiano, Mark Notaras
e Alva Lim, que viveu em Timor-Leste durante mais de quatro anos a trabalhar em
projetos de desenvolvimento associados ao setor agrícola e alimentar.
"Quisemos
apostar num projeto com produtos locais, que fosse sustentável. O nosso modelo
é diferente e por isso fechamos um dia por semana para formação. Aprendem a
fazer", explica Notaras.
Um
dos efeitos do rápido desenvolvimento em Timor-Leste, especialmente na capital,
tem sido a crescente importação, muitas vezes de produtos mais baratos, cujo
consumo representa quase uma questão de estatuto.
"Há
muitos que acham que comida local, sazonal, saudável e nutritiva é comida dos
pobres. E por isso trocam-na por comida internacional, que é promovida nos
media, de pior qualidade. Os produtos timorenses têm muito sabor",
sublinha.
"Criatividade
gera motivação. Não queremos um sistema muito estruturado que trave essa
criatividade. Queremos continuar a oferecer uma gama de sabores
interessante", diz.
E
apenas com os produtos da época que se vendem nos mercados tradicionais.
ASP
// VM
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