Díli,
18 jun (Lusa) - O acórdão do Tribunal de Recurso timorense que alterou a medida
de coação aplicada ao cidadão português Tiago Guerra, pondo fim à sua prisão
preventiva, considera que foram cometidas irregularidades que prejudicaram a
defesa do arguido.
O
texto do acórdão obtido pela agência Lusa sublinha, em particular, que na
decisão sobre a renovação da prisão preventiva, aplicada em abril (cumpridos os
primeiro seis meses), foram ignoradas provas apresentadas pelo arguido.
O
coletivo de três juízes do Tribunal de Recurso - Guilhermino da Silva, Deolindo
dos Santos e Maria Natércia Gusmão - deliberou na segunda-feira alterar a
medida de coação aplicada a Tiago Guerra, que estava detido preventivamente
desde 18 de outubro por suspeita de branqueamento de capitais.
Apesar
de o acórdão do tribunal estar datado de segunda-feira, a decisão só foi
comunicada aos serviços prisionais na terça-feira, tendo Tiago Guerra sido
libertado às 16:15 desse dia.
Deolindo
dos Santos, juiz relator do processo, assina a ordem de libertação de Tiago
Guerra, e o acórdão com mandado de libertação é notificado ao diretor do
Estabelecimento Prisional de Becora, João Domingos.
Foi
assim dado parecer positivo aos argumentos da defesa, meses depois de terem
sido recusados argumentos idênticos quando a justiça timorense deliberou
alargar, por mais seis meses, a prisão preventiva.
Em
concreto, explica que no recurso, de 23 de março de 2015, a defesa apresentou
"meios de prova" para sustentar a substituição por uma medida de
coação "menos gravosa", que o tribunal tinha já ampliado.
O
coletivo de juízes considera ter sido cometida uma "irregularidade"
que afeta com "grande gravidade" os direitos de defesa do arguido.
Os
juízes justificam que o despacho que aplicava a prisão preventiva não ponderou
as questões de facto e de direito alegadas pelo arguido, omitindo assim
"por completo, o dever de fundamentação".
"Ficou
privado de conhecer o raciocínio feito pelo tribunal recorrido, como ignorou
por completo o pedido de substituição da prisão preventiva formulado pelo
artigo, nessa medida afetando o valor do ato praticado", refere o texto.
Daí,
explicam os juízes, que cabe ao Tribunal de Recurso "repor a legalidade
processual" pronunciando-se "face aos novos factos que foram alegados
pelo recorrente e sobre os quais o despacho recorrido simplesmente não se
pronunciou".
O
Tribunal considera que "existem indícios suficientes de prática pelo
arguido do crime de branqueamento de capitais" e que não se pode exigir,
neste caso, "uma comprovação categórica" de todos os pressupostos do
crime indiciado, dada a "complexidade de obtenção de provas" e o
facto de o Ministério Público ainda estar à espera de "material probatório
relevante", de Portugal e Macau.
"Se
existem dificuldades em obter provas que sustentem o inquérito, deveria o
Ministério Púbico, para um completo esclarecimento dos factos, cruzar os factos
indiciados até agora apurados com os novos elementos de prova juntos pelo
arguido", refere o texto.
"Nenhuma
das provas apresentadas pelo arguido foi tida em consideração ou analisada pelo
juiz", nota, pelo que tem que ser o Recurso "para suprir
oficiosamente a irregularidade verificada", pronunciar-se sobre a
pretendida renovação da prisão preventiva e a sua substituição por outra medida
de coação.
Os
juízes do Recurso analisam ainda o argumento sobre o perigo de fuga,
considerando que "não pode ser aferido meramente em termos hipotéticos,
nem inferida só da mera gravidade do crime".
Também
neste caso os "novos elementos", que o tribunal ignorou quando
ampliou a prisão preventiva, indicam que "não há fundado receio de
fuga".
"A
prisão preventiva não pode servir como uma espécie de pena antecipada ou ser
decretada em função da gravidade e continuação da atividade criminosa dos
arguidos, sob pena de violação do princípio de presunção de inocência",
lê-se no acórdão.
"O
perigo de fuga é um requisito que deixou de fazer qualquer sentido, devendo,
por isso, a medida de prisão preventiva ser substituída por outra medida de
coação que continue a acautelar de forma adequada e proporcional as exigências
cautelares do caso concreto", conclui.
ASP
// JPS
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